sexta-feira, 11 de maio de 2012

Simón Bolívar, o grande mito latino americano - Gustavo Henrique Lopes Machado

Publicado originalmente em: http://www.diarioliberdade.org/opiniom/opiniom-propia/26591-sim%C3%B3n-bol%C3%ADvar,-o-grande-mito-latino-americano.html

"A força criadora de mitos, característica da fantasia popular, em todas as épocas tem provado sua eficácia inventando 'grandes homens'. O exemplo mais notável deste tipo é sem dúvida Simón Bolívar". Karl Marx


Em fins de 1960, referenciando as críticas de Marx a Simón Bolívar, Che Guevara escreveu: “Podem-se apontar em Marx, pensador e investigador das doutrinas sociais e do sistema capitalista que lhe coube viver, certas incorreções. Nós, os latinos americanos, podemos, por exemplo, não concordar com sua interpretação de Bolívar... Mas os grandes homens, descobridores de verdades luminosas, vivem, apesar de suas pequenas faltas, e estas servem apenas para demonstrar-nos que são humanos". Em todo período que se seguiu, as palavras do revolucionário argentino foram largamente repetidas, sobretudo, entre nós, latino americanos. A duras palavras de Marx ao “Libertador”, encerradas em um artigo denominado Bolívar y Ponte e em algumas outras rápidas menções no curso de sua obra, apareciam, para muitos, como um de seus grandes equívocos. Neste sentido, muitas foram as críticas ou tentativas de justificar as palavras de Marx direcionadas a Bolívar. Para uns produto de sua incompreensão da especificidade da realidade latino-americana, ou ainda, de um certo eurocentrismo presente em seu pensamento, outros justificaram que tal artigo foi elaborado com extrema rapidez e com finalidades unicamente financeiras. A própria edição russa de 1959 das obras completas de Marx e Engels inclui uma nota crítica concernente ao artigo sobre Bolívar, sustentando que os erros existentes eram provenientes das fontes insuficientes e parciais que teve acesso. Como se vê, a caracterização de Guevara foi um lugar comum entre os marxistas. Muitos não se limitaram a rechaçar a análise “unilateral” de Marx sobre o mais afamado nome da independência latino americana e o transfiguraram em um herói e simbolo do socialismo. Especialmente agora, com o chamado “socialismo do século XXI”, a figura de Bolívar parece ter alcançado destaque especial. Suas imagens inundam as salas do Palácio de Miraflores, a sede do governo venezuelano, que diz impulsionar uma revolução bolivariana na Venezuela, através de missões e círculos bolivarianos, visando à integração do continente. Até o nome do país foi alterado para República Bolivariana da Venezuela.
O referido artigo foi escrito por Marx em um contexto em que Bolívar era cultuado na própria “esquerda” europeia como libertador e herói da América Hispânica e um símbolo na luta contra o imperialismo. Desde então Bolívar é considerado por muitos o homem que indicou o caminho da liberdade através da destruição dos grilhões que uniam a América à metrópole espanhola. Esta fama valeu-lhe na literatura que se seguiu vários epítetos, como: “o libertador”, “gênio perfeito”, “caudilho incomparável”, “único de sua raça”, “São Simón Bolívar”, “Herói”, “Deus” etc... Todavia, Marx descreverá um Bolívar nada heroico. No curso do pequeno esboço biográfico que escreveu sobre o “Libertador”, este será acusado de oportunista, covarde, traidor, canalha, ditador, ambicioso etc... Teria Marx se equivocado? Apesar do seu rigor e inúmero conjunto de fontes que sempre consultou antes de emitir qualquer posição, teria neste caso se apressado? No período que se seguiu a publicação deste artigo Marx recebera cartas contestando sua interpretação e questionando suas fontes e respondera, ao seu modo, de maneira irônica. Analisemos melhor alguns aspectos do papel histórico desempenhado por Bolívar no curso e no contexto das independências latino americanas.

Como se sabe, as colônias espanholas na América eram marcadas por uma aguda exploração do trabalho, sobretudo indígena, realizada através de diversos tipos de trabalho compulsório e escravo, tanto nas minas como na agricultura. São bastante conhecidas, desde o inicio da colonização, as situações desumanas em que a população indígena e negra foi submetida no Novo Mundo, em particular na exploração das minas de prata em Potosí e de mercúrio em Huancavelica. Entretanto, este não era o único antagonismo que balizava a América espanhola. Os crioulos, isto é, pessoas de origem espanhola, ou de outros países da Europa, nascidas no continente americano, não tinham igualdade de direitos frente aos espanhóis. Ocupavam poucos cargos na hierarquia estatal e religiosa, e estavam juridicamente impossibilitados de atingir os níveis mais altos da burocracia administrativa. Em contrapartida, tornavam-se cada vez mais numerosos, colocando um problema político peculiar. E é neste clima de tensão permanente entre os dois setores dominantes nas colônias, espanhóis e crioulos, e a profunda crise da metrópole após a invasão napoleônica, que Simón Bolívar entra em cena.

Conforme menciona Marx em seu artigo, como filho da rica nobreza crioula na Venezuela, Bolívar foi enviado a europa para estudar ainda com 14 anos. Vivendo no velho mundo no período que se segue ao turbilhão da revolução francesa teve contato com ampla literatura iluminista e presenciou a coroação de Napoleão como imperador. Neste sentido, não é estranho que os princípios os quais animavam a grande revolução na França marcassem presença nos textos e discursos de Bolívar desde aquela época. Em sua vasta obra, entre discursos e cartas, estão recheadas de menções a libertação da América do domínio espanhol e referências aos princípios liberais, como neste trecho da Carta ao Governador de Curaçao: “Por três séculos gemeu a América sob esta tirania, a mais dura que afligiu a espécie humana; por três séculos chorou as funestas riquezas que tanto atrativo tinham para seus opressores”. Vários de seus escritos consistem em verdadeiras odes à liberdade remetendo a um futuro grandioso para o Novo Mundo. Entretanto, até que ponto esta retórica ilustrada coincidiu com existência prática do próprio Bolívar? Voltemo-nos então para o seu papel nas independências latino americanas, isto é, o cruzamento entre a teoria por ele difundida e sua existência efetiva.

Antes de querer conduzir as classes exploradas à participação política, o movimento de independência iniciado por Bolívar na Venezuela foi pautado, pelo contrário, no temor das mobilizações destas mesmas classes. Este temor da elite crioula se intensificou desde a conquista da Espanha em 1808 pelo exército de Napoleão Bonaparte quando perderam o respaldo militar da metrópole. Não por acaso o próprio Bolívar teria dito que uma revolta negra seria “mil vezes pior do que uma invasão espanhola”(1). Não se pode esquecer que os crioulos que estavam a frente do movimento de independência eram aristocratas rurais e escravocratas.

Neste sentido é importante notar que após a independência, a Espanha conseguiu restaurar seu domínio sobre a Venezuela, no curto período de 1814-16, graças ao apoio dos escravos. Talvez, por influência deste episódio, assim como dos compromissos firmados com o presidente do Haiti, que ofereceu ajuda militar no momento da reconquista espanhola, Bolívar obteve a libertação dos filhos dos escravos em 1921(2). Ainda assim, em carta direcionada a seu principal general, o “Libertador” explicita o aspecto tático da libertação dos escravos: utilizá-los nas batalhas pouparia os homens livres (crioulos) e possibilitaria a redução do seu “perigoso número”. (3)

Apesar dos aspectos acima ressaltados com relação a escravidão, não teria Bolívar cumprido um papel “progressista” ao propiciar a libertação nacional de tantos países da América Espanhola? Como podemos ver, naquele mesmo artigo de Marx, Bolívar “ recusou-se a aderir à revolução que estourou em Caracas em 19 de abril de 1810”, mas em seguida “aceitou a missão de ir à Londres para comprar armas e negociar a proteção do governo britânico”. No que diz respeito a vitória, diz Marx: “De deserção em deserção, tudo parecia caminhar para um desastre total (...) Nesse ínterim, chegou da Inglaterra uma forte ajuda em homens, navios e munições, e oficiais ingleses, franceses, alemães e poloneses afluíram de todas as partes para Angostura... Rapidamente pôs-se de pé um exército de 14 mil homens, com os quais Bolívar pôde passar novamente à ofensiva... as tropas estrangeiras, compostas fundamentalmente por ingleses, decidiram o destino de Nova Granada, graças às sucessivas vitórias... No dia 12 de agosto [de 1819] Bolívar entrou triunfalmente em Bogotá...”. Como se vê, para Marx,  o caráter anti-imperialista aparece como mais um mito do “Libertador” Bolívar, uma vez que teria livrado a América Latina do jugo espanhol, em troca do britânico.(4)

Bolívar também aparece em múltiplos textos de propaganda como expressão da democracia e da participação popular. Esta visão, como os aspectos anteriormente mencionados, não está em consonância com os acontecimentos. Apesar da retórica liberal e as constantes referências a opressão espanhola que perpassam seus escritos, para Bolívar a democracia era ideal, apenas para os outros, não para à América. Pouco após a independência da Venezuela em 1813 relata em carta ao Governador de Barinas: “Jamais a divisão do poder estabeleceu e perpetuou governos; somente a sua concentração conseguiu infundir respeito numa nação e eu não libertei a Venezuela senão para implementar exatamente este sistema”. Nesta mesma direção em sua famosa carta de Jamaica de 1815, anuncia ser a Venezuela o exemplo mais transparente “da ineficácia do modelo democrático e federal”. Em 1819 em discurso realizado em San Tomé de Angostura conclui que um sistema de governo como o dos Estados Unidos não é apropriado para “nossos países”, deixando claro que esta postura estava longe de expressar um contexto conjuntural. Em 1825, durante a constituinte da Bolívia propõe a ele próprio como presidente vitalício e o poder para escolher o vice-presidente o qual deveria sucedê-lo e justifica-se: “com esta providência se evita as eleições, que produzem grandes revezes nas repúblicas, a anarquia que é o luxo da tirania e o perigo mais imediato e terrível dos governos populares”.(5) Para Bolívar, a América Latina não estava preparada para a democracia, sendo ele o único capaz de manter a “República”. Quando esteve a frente do governo peruano escreveu: “no dia em que eu deixar o Peru ele volta a se perder: porque não há homens capazes de sustentar o Estado”, curiosamente, este mesmo Bolívar teria dito anos antes que “se apenas um homem fosse necessário para sustentar o Estado, esse Estado não deveria existir; e ao fim não existiria”. Logo, como se vê, Marx parece ter razão ao anunciar que a “intenção real de Bolívar era unificar toda a América do Sul em uma república federal, cujo ditador seria ele mesmo”. Entra em crise, aqui, o “herói da unidade latino americana”. Se para Bolívar esta unidade era um pretexto para uma ditadura mais ampla, ao que nos parece, tal unidade, tantas vezes invocada em nossos dias pelos governantes ditos de esquerda, visa apenas arrefecer as lutas efetivas entre as classes, procura-se esvaziar a sociedade de seu conteúdo real apagando as contradições em nome de um critério de natureza cultural e abstrata.

Por fim, provavelmente, a única convicção que permaneceu inabalável em Bolívar desde os primeiros anos dos processos de independência até a sua morte foi a da incapacidade do povo latino-americano de levar a cabo a sua própria libertação. Num primeiro momento, Bolívar acredita ser ele o único capaz de levar adiante tal empreitada, já nos últimos momentos de sua vida, quando seu fracasso já estava consumado, escrevera ao antigo aliado, o general Juan Flores, dizendo que “aquele que serve a revolução ara no mar”, que a América era ingovernável e que certamente nem os espanhóis desejariam mais reconquistá-la.

Posto todos estes elementos, como poderia Bolívar, no curso de nossa história, ter se transmutado em libertador, anti-imperialista, republicano, liberal e no bastião da democracia? Esta resposta se encontra nas múltiplas imagens dele construídas desde alguns anos após sua morte. Esta construção foi inicialmente desenvolvida pelas classes dominantes na Venezuela e depois reverberada sobre diversas correntes políticas do continente e em múltiplos sentidos. Passemos rapidamente por este itinerário.

Derrotado nas disputas pelo poder que se seguiram as independências, Bolívar morreu desprezado e caluniado pelos seus antigos aliados, considerado um traidor nacional. O governo de Paez, um inimigo de Bolívar, sucumbiu frente as inúmeras disputas e turbulências locais que perduraram. Neste quadro de total instabilidade e caos social, a figura de Bolívar renasce sob o governo de Fermin Toro, em que Bolívar é apresentado como unificador e harmonizador de conflitos sociais. Transformou-se em um símbolo que representava a Nação venezuelana em conformação. Desde então, sua imagem foi apropriada pela classe dominante venezuelana, através de sucessivos governos, os quais acentuaram apenas alguns aspectos dos escritos de Bolívar. Neste momento desenvolveu-se de forma cada vez mais ampliada, um verdadeiro culto à sua pessoa, que transcendeu as fronteiras venezuelanas, colocando-o no altar de toda a América Latina. Foi comparado aos heróis da mitologia greco-romana e do cristianismo. Bolívar era Zeus ou Júpiter no “Olimpo crioulo”, era como Jesus Cristo. No centenário de seu nascimento, Gusmán Blanco o caracterizara como o “predestinado”, “a serviço dos desígnios da Providência”, “Libertador do continente, criador das repúblicas americanas, o pai dos cidadãos livres” e ainda “Deus oferecera a ele todos os talentos (…) incomparáveis em toda a superfície da terra, tanto no passado, no presente e no futuro”. (6) (7) Como se vê, os heróis nacionais latino americanos, como Bolívar, não germinaram espontaneamente no curso da própria luta de libertação, mas foram escolhidos posteriormente segundo os critérios e conveniências dos governos instituídos. O que resultava na construção meramente simbólica e a posteriori, tanto de heróis como de anti-heróis.

Neste caminho, a figura mítica de Bolívar foi usada não apenas nos sucessivos governos autoritários da Venezuela mas reverberou por todo continente e para além dele. Existem registros de que tanto o regime de Mussolini como o nazismo procuraram interpretar Bolívar em seu favor, em um livro escrito pelo nazista Wolfram Dietrich, este anuncia que a principal lição extraída de Bolívar é “ que ‘um povo só pode prosperar sob o comando enérgico de um FUEHRER” (8) Em diversos outros momentos o nosso “Libertador” foi utilizado para justificação de governos autoritários e sobretudo nacionalistas.

O uso do Bolívar mitológico no interior dos movimentos de esquerda se desenvolveu, com particular intensidade, após a “teoria da dependência” que, em suas múltiplas matizes, assenta-se sobre a tese de que a pobreza latino-americana decorre dos quase cinco séculos de saques que o continente passou, ora pelos espanhóis e portugueses, ora pelos norte-americanos. Assim, a luta dos crioulos teriam um caráter progressivo frente à burguesia estrangeira, isto é, ao imperialismo. Tal tese, que aparece como um misto obscuro entre nacionalismo e marxismo, nunca conseguiu explicar de maneira consistente como uma revolução meramente nacional se converte,  compõe, ou auxilia uma revolução socialista. Questão normalmente defendida com a mera evocação dos termos dialética ou mediação esvaziados de qualquer conteúdo. Para muitos dos seguidores da crença na “teoria da dependência” a libertação nacional e revolução socialista fazem parte de um mesmo processo dialético ou constitui uma mediação de um para o outro. Em que consiste esta mediação ou esta dialética continua uma grande incógnita. Tampouco explicita as vantagens para classe trabalhadora de possuir exploradores predominantemente da mesma nacionalidade. Neste cenário, não é mera coincidência que o governo bolivariano de Hugo Chávez propagandeie aos quatro ventos o livro: “Veias abertas da América Latina” de Eduardo Galeado, assentado sobre a débil tese da teoria da dependência. Seja como for, a figura de Bolívar caiu como uma luva para esta teoria, dois mitos que se auto complementam.

Atualmente, podemos constatar que a fabrica construtora de mitos continua ativa na América Latina, sobretudo, nos governos de viés nacionalista. Recentemente, o governo da presidente Cristina Kirchner na Argentina determinou por decreto uma revisão oficial da História de sua nação. Para tal, foi criado o Instituto Nacional do Revisionismo Histórico Argentino e Ibero-Americano Manuel Dorrego ligado a Secretaria Federal de Cultura. Este instituto tem por objetivo rever a história do país de maneira a contemplar o mito dos caudilhos e seus laços populares, assim como, denunciar os liberais pelo projeto de incorporar a Argentina no capitalismo global como um sócio inferior no mercado agroexportador. Por exemplo, o ditador Juan Manuel de Rosas (1835-52), que promoveu verdadeiros genocídios contra os indígenas do sul da Província de Buenos Aires, será transformado em herói, enquanto democratas, como Domingo Faustino Sarmiento, são transformados em agentes do imperialismo. Ao que parece, Cristina necessita de novos Bolívares.

É evidente que o Bolívar histórico não é aquele pintado por seus apologetas, tanto conservadores como “socialistas”. Nosso objetivo, neste modesto texto, não é atingir ou sequer apontar para a figura histórica de Simón Bolívar. Para tal é necessário desnudá-lo de todo o vestuário criado por aqueles que fizeram e fazem uso de seu nome, tendo em vista, apenas corroborar necessidades imperativas de grupos que estão no poder. Independente disto, fato é que Bolívar era integrante da classe dominante crioula, cujos interesses representava. Podemos perceber que, no interior de uma economia de mercado em permanente expansão, a liberação do jugo espanhol apenas resultou em uma nova escravidão. Neste sentido, seguindo as reflexões de Marx, imperialismo seria, tão somente, um fenômeno, uma manifestação inerente ao capital em suas idas e vindas em busca de valorização. Para além das manifestações aparentes e abstratas do dinheiro, do direito e da nação encontra-se a exploração de classes, e em particular, a exploração da classe trabalhadora, que produz toda riqueza, mas que só possui sua força de trabalho para vender. Neste sentido, independente de imprecisões históricas que possam existir no breve esboço biográfico de Marx sobre Bolívar, esse se apresenta como coerente, tendo em vista o pensamento e a elaboração teórica do autor de O Capital. Em contra partida, do ponto de vista histórico, parece incontestável a menção que Marx faria alguns anos mais tarde no seu escrito contra Herr Vogt: “A força criadora de mitos, característica da fantasia popular, em todas as épocas tem provado sua eficácia inventando ‘grandes homens’. O exemplo mais notável deste tipo é sem dúvida Simón Bolívar”.

Todavia não podemos desconsiderar ainda a possibilidade de Marx estar equivocado, não apenas com relação a Bolívar, mas sim, ao conjunto de sua obra, em que a nação, embora real, é sempre abstrata e as classes sociais e seu caráter internacional, concreto. Talvez a nação seja, de alguma forma ainda não demonstrada, uma determinação substancial do capital. Talvez as relações econômicas entre os países tenham o mesmo estatuto da relação entre as classes. Talvez o imperialismo seja o substituto da burguesia na sociedade contemporânea, o que colocaria as nações dominadas como o sujeito de uma transformação social profunda. Talvez este aspecto justifique o desejo não realizado de Lukacs de escrever “O Capital” de nossos dias. Se for este o caso, resta-nos constatar que as nações sempre necessitaram da criação de mitos e heróis. Assim, para nós, brasileiros, antes de exportarmos o herói venezuelano, devemos criar nossos próprios mitos, nossos próprios heróis e colocar em seu devido lugar o nosso Zeus, nosso Jesus Cristo, o “único de sua raça”, o “predestinado”, “a serviço dos desígnios da Providência”, o “Libertador” do Brasil, Dom Pedro I.


(1) Lynch, The Spanish-American revolutions, p.224
(2) Masur, Bolívar, pp 206-207
(3) Jair Antunes, Marx e a América para além da história do capitalismo, pp  147-148
(4) Jair Antunes, Marx e a América para além da história do capitalismo, pp  149
(5) Maria Lígia Coelho Prado, “Bolívar, Bolívares”, Folhetim, Folha de São Paulo, 24 jul. 83
(6) Maria Lígia Coelho Prado, “Bolívar, Bolívares”, Folhetim, Folha de São Paulo, 24 jul. 83
(7) German Carrera Damas, "El culto a Bolívar"
(8) Moacir Werneck de Castro, “O Libertador – A Vida de Simón Bolívar”

terça-feira, 17 de abril de 2012

A Curva do Desenvolvimento Capitalista - Leon Trotsky

Hoje selecionamos um artigo clássico do marxismo econômico A Curva do Desenvolvimento Capitalista, de Léon Tróstki. Esse artigo apareceu pela primeira vez na revista Vestnik Sotsialisticheskoi Akademii (Revista da Academia Socialista) em seu número 4, de 1923. Traduzido por Almir Cezar Baptista Filho, a partir da versão em espanhol, “La Curva del desarrollo capitalista” (ver pág. 69 de León Trotsky. Naturaleza y dinámica del capitalismo y la economía de transición. Buenos Aires: Centro de Estudios, Investigaciones y Publicaciones León Trotsky, 1999).
 

 Em sua introdução ao livro de Marx, A luta de classes na França, Engels escreveu: “Quando se apreciam sucessos e séries de sucessos da história diária, jamais podemos remontarmos até as últimas causas econômicas. Nem se quer hoje, quando a imprensa especializada apresenta materiais tão abundantes, se poderia, nem ainda na Inglaterra, seguir dia a dia a marcha da indústria e do comércio no mercado mundial e as mudanças operadas nos métodos de produção, até o ponto de poder, em qualquer momento, fazer o balanço geral destes fatores, multiplamente complexos e constantemente cambiantes; máxime quando os mais importantes deles atuam, na maioria dos casos, escondidos durante longo tempo antes de sair repentinamente e de um modo violento à superfície. Uma visão clara de conjunto sobre a história econômica de um período dado não pode conseguir-se nunca no momento mesmo, senão só com posterioridade, depois de ter reunido e tamisado os materiais. A estatística é um meio auxiliar necessário para isto, e a estatística vai sempre ao pé, acompanhando. Por isso, quando se trata da história contemporânea, corrente, se verá forçado com farta frequência a considerar este fator, o mais decisivo, como um fator constante, a considerar como dada para todo o período e como invariável a situação econômica com que nos encontramos ao começar o período em questão, ou a não ter em conta mais que aquelas mudanças operadas nesta situação que por derivar de acontecimentos patentes sejam também patentes e claros.

Por esta razão, aqui o método materialista tenderá que limitar-se com farta frequência, a reduzir os conflitos políticos às lutas de interesses das classes sociais e frações de classes existentes, determinadas pelo desenvolvimento econômico, e a por manifesto que os partidos políticos são a expressão política mais ou menos adequada destas mesmas classes e frações de classe. “Greve diz que esta desestimação inevitável dos mudanças que se operam do mesmo tempo na situação econômica - verdadeira base de todos os acontecimentos que se investigam - tem que ser necessariamente uma fonte de erros”[iii].

Estas ideias que Engels expressou pouco antes de sua morte não foram desenvolvidas por ninguém depois dele. Segundo me recordo, elas são raramente citadas - muito mais raramente do que deveriam sê-lo. Ainda mais, seu significado parece haver escapado a muitos marxistas. A explicação para este fato deve encontrar-se nas causas indicadas por Engels, que militava contra qualquer tipo de interpretação econômica determinada de nossa história corrente.

É uma tarefa muito difícil, impossível de resolver em seu pleno desenvolvimento, o determinar daqueles impulsos subterrâneos que a economia transmite à política de hoje; e sem dúvida a explicação dos fenômenos políticos não podem ser pospostos a causa de quer a luta não permite esperar. Daqui surge a necessidade de recorrer na atividade política cotidiana a explicações tão gerais que através de um grande uso aparecem transformadas em verdades. Entretanto a política segue fluindo dentro de uma mesma forma, através do mesmo dique, e a um ritmo semelhante, por exemplo, a acumulação de quantidades econômicas não se tem convertido em uma mudança de qualidade política, esta classe de abstrações clarificantes (“os interesses da burguesia”, “o imperialismo”, “o fascismo”) ainda serve mais ou menos sua tarefa: interpreta um fato político em toda sua profundidade, mas o reduz a um tipo familiar que é, seguramente, de inestimável importância.

Mas quando ocorre uma mudança séria na situação, ou ao auge um giro agudo, tais explicações gerais revelam sua total insuficiência, e surgem totalmente transformadas em uma verdade vazia. Em tais cursos resulta invariavelmente necessário estudar em forma muito mais profunda e analítica para determinar o aspecto qualitativo, e se é possível também medir quantitativamente os impulsos da economia sobre a política. Estes "impulsos” representam a forma dialética das “tarefas” que se originam a fundação dinâmica e são transmitidas para buscar solução a esfera da superestrutura.
 
Já as oscilações da conjuntura económica (auge-depressão-crise) as conformam causas e efeitos de impulsos periódicos que dão surgimento a mudanças, ora quantitativos, ora qualitativos, e a novas formações no campo político. Os rendimentos todas classes possuidoras, o pressuposto do estado, os salários, o desemprego, a magnitude do comércio exterior, etc., estão íntimamente ligados com a conjuntura económica, e a seu turno, exercem a mais direta influência sobre a política. Este só é suficiente para entender quanto importante e frutífero é seguir passo a passo a história dos partidos políticos, as instituciones estatais, etc., em relação com os ciclos do desenvolvimento capitalista. Mas nós não podemos dizer que estes ciclos explicam tudo: ele esta excluido pela simples razão que os ciclos mesmos não são fenómenos económicos fundamentais, senão derivados. Ele se desdobra sobre a base do desenvolvimento das forças produtivas através do mecanismo das relações de mercado. Mas os ciclos explicam uma boa parte, formando como o fazem através das pulsações automáticas, uma indispensável mola dialética na mecánica da sociedade capitalista. Os pontos de ruptura da conjuntura comercial e industrial nos levam a um contato muito mais íntimo com os nós críticos na trama do desenvolvimento das tendências políticas, a legislação, e todas as formas da ideologia.

Mas o capitalismo não se caracteriza só pela periódica recorrência dos ciclos, de outra maneira a história seria uma repetição completa e não um desenvolvimento dinámico. Os ciclos comerciais e industriais são de diferente caráter em diferentes períodos. A principal diferença entre eles que está determinada pelas inter-relações quantitativas entre o período de crise e o de auge de cada ciclo considerado. Se o auge restaura con um excedente a destrução ou a austeridade do período precedente, então o desevolvimento capitalista está em ascenso. Se a crise, que significa destrução, ou em todo caso contração das forças productivas, sobrepassa em intensidade o auge correspondente, então obtemos como resultado uma contração da economia. Finalmente, se a crise e o auge se aproximam entre si em magnitude, obtemos um equilíbrio temporário – um estancamento – da economia. Este é o esquema no fundamental. Observamos na história que os ciclos homogéneos estão agrupados em séries. Épocas inteiras de desenvolvimento capitalista existem quando um certo número de ciclos estão caracterizados por auges agudamente delineados e crisis débeis e de curta vida. Como resultado, obtemos um agudo movimento ascendente da curva básica do desenvolvimento capitalista. Obtemos épocas de estancamento quando esta curva, ainda que passando através de parciais oscilações cíclicas, permanece aproximadamente no mesmo nível durante décadas. E finalmente, durante certos períodos históricos, a curva básica, ainda que passando como sempre através de oscilações cíclicas, se inclina para baixo em seu conjunto, assinalando a declinação das forças produtivas.

É agora postular a priori que as épocas de enérgico desenvolvimento capitalista devem possuir formas – em política, em leis, em filosofia, em poesia – agudamente diferentes daqueles que correspondem à época de estancamento ou de declinação económica. Ainda mais, uma transição de uma época desta classe a outra diferente deve produzir necessariamente as maiores convulsões nas relações entre classes e entre estados. No Terceiro Congresso Mundial da Komintern[iv] nós temos insistido sobre este ponto na luta contra a concepção puramente mecanicista da atual desintegração capitalista. Se o re-situação periódico de auges “normais” por crises “normais” encontra sua projeção em todas as esferas da vida social, então uma transição de toda uma época inteira de ascenso a outra de declinação, ou vice-versa, engendra os maiores distúrbios históricos, e não é difícil demostrar que em muitos casos as revoluções e guerras se espandem entre a linha de demarcaçã de duas épocas diferentes de desenvolvimeto económico, por exemplo a união de dois segmentos diferentes da curva capitalista. Analizar toda a história moderna desde este ponto de vista é realmente uma das tarefas mais gratificantes do materialismo dialético. Continuando com o Terceiro Congresso Mundial, o professor Kondratiev[v] se aproximou a este problema – como é usual, evadindo dolorosamente a formulação da questão como fora adotada pelo Congresso mesmo – tentando agregar ao “ciclo menor”, cobrindo um período de dez anos, o conceito de um “ciclo maior”, abraçando aproximadamente cinquenta anos. De acordo a esta construção simétricamente estilizada, um ciclo económico maior consiste de uns cinco ciclos menores, e además, a metade deles tem o caráter de ascendentes, enquanto a outra metade são de crises, com todas as etapas necessárias de transição. A determinação estatística dos ciclos maiores compilada por Kondratiev deverá ser sujeita a uma cuidadosa e nada crédula verificação, tanto respeito aos países individualmente como ao mercado mundial como um todo. É agora impossivel refutar pelo avançado o intenção do professor Kondratiev a investigar as épocas rotuladas como ciclos maiores com o mesmo “ritmo rígidamente legítimo” que é observável nos ciclos menores; isto é obviamente uma falsa generalização de uma analogia formal. A recorrência periódica de ciclos menores está condicionada pela dinámica interna das forças capitalistas, e se manifesta por si mesma sempre e em todas partes uma vez que o mercado tem surgido à existência.

Pelo que se refere as fases longas (de cinquenta anos) da tendência da evolução capitalista, para as quais o professor Kondratiev[vi] sugere, infundadamente, o uso do termo “ciclos”, devemos destacar que o caráter e duração estão determinados, não pela dinámica interna da economia capitalista, senão pelas condições externas que constituem a estrutura da evolução capitalista. A aquisição para o capitalismo de novos países e continentes, o descobrimiento de novos recursos naturais e, no despertar destes, fatos maiores de ordem “superestrutural” tais como guerras e revoluções, determinam o caráter e a resituação das épocas ascendentes estancadas ou declinantes do desenvolvimento capitalista. Ao lado de que rumos deveria proceder a investigação?

Nosso principal objetivo há de ser estabelecer a curva da evolução capitalista incorporando seus elementos não periódicos (tendências básicas) e periódicos (recorrentes). Temos que fazer isto para os países que nos interessam e para o conjunto da economia mundial.

Uma vez que temos fixado a curva (o método de fixá-la é sem dúvida uma questão especial por si mesma, e de nenhuma maneira simples, que pertence ao campo da técnica da estatística económica) podemos dividi-la em períodos, dependentes do ângulo de ascenso ou descenso com respeito ao eixo de abscissas. Por este meio obtemos um quadro do desenvolvimento económico, ou seja, a caracterização de “a verdadeira base de todos os acontecimentos que se investigam” (Engels).

De acordo ao concreto ou detalhado de nossa investigação, podemos necessitar uma quantidade de tais esquemas; um relativo à agricultura, outro à industria pesada, etc. Com este esquema como ponto de partida, devemos sincronizar-nos logo com os sucessos políticos (no mais amplo sentido do termo), e então podemos buscar não só sua correspondência, ou para dizer-lo mais cautelosamente, a inter-relação entre as épocas definitivamente delineadas da vida social e os segmentos agudamente expressados da curva do desenvolvimento capitalista, senão também por aqueles impulsos subterráneos diretos que unem os sucessos. Ao longo deste caminho, naturalmente, não é difícil cair na mais vulgar esquematização; e, sobretudo, ignorar a tenacidade, dos acondicionamentos internos e a sucessão dos processos ideológicos, e levar a esquecer que a economia só é decisiva em última análise. Não tem faltado conclusões caricaturescas esboçado a partir do método marxista! Mas renunciar por esta causa à formulação da questão como se indicara antes (“seu aroma de economismo”) é demonstrar uma completa incapacidade para entender a essência do marxismo que busca as causas das mudanças da superestrutura social nas mudanças da fundação económica, e em nenhum outro lado.
 
O paralelismo dos sucessos políticos e as mudanças económicas é sem duvida muito relativa. Como regra geral, a “superestrutura” registra e reflete novas formações na esfera económica só depois de considerável atraso. Mas esta lei deve apoiar-se em uma concreta investigação daquelas complexas inter-relações.
 
Em nosso informe ao Terceiro Congresso Mundial[vii] ilustramos esta idéia com certos exemplos históricos extraídos da época da revolução de 1848, a época da primeira revolução russa (1905) e o período através do qual estamos passando (1920-1921). Referimos ao leitor a estes exemplos (veja O novo curso[viii]). Eles não proporcionam nada finalizado, mas caracterizam em forma suficientemente adequada a extraordinária importância da visão avançada por nossos – sobretudo, para entender os saltos mais críticos na história: as guerras e revoluções. Mas nenhum intenção desta classe pode assemelhar-se a um incauta anticipação daqueles resultados que fluem de uma completa e dolorosa investigação que ainda não se tem realizado.
 
Na atualidade resulta ainda impossível prever até que grau e que seções do campo da história serão iluminadas, nem quanta luz será lançada por uma investigação materialista que procedera a um estudo mais concreto da curva capitalista e da inter-relação entre a última e todos os aspectos da vida social. As conquistas que podem obter-se por este caminho serão determinadas pelo resultado da investigação mesma, a qual deve ser mais sistemática, mais ordenada, que aquelas excursões histórico-materialistas empreendidas até agora. Em qualquer aproximação à história moderna enriquecer a teoria do materialismo histórico com conquistas muito mais preciosas que extremadamente duvidosos malabarismos especulativos, com os conceitos e termos do método materialista que, baixa da pena de alguns de nossos marxistas, transplantaram o método formalista ao domínio do materialismo dialético; que tem levado a reduzir a tarefa a confecção de classificações e definições precisas e a dividir várias abstrações em quatro partes igualmente vazias; em resumo, tem adulterado o marxismo com as maneiras elegantemente indecentes dos epígonos de Kant. Verdadeiramente é uma loucura afiar e re-afiar sem fim um instrumento, furar a calçada marxista, quando a tarefa é aplicar o instrumento para trabalhar sobre a matéria-prima. Em nossa opinião, este tema pode prover o material para os mais frutíferos trabalhos de nossos seminários marxistas sobre materialismo histórico. As investigações indepentes empreendidas nesta esfera atirariam indubivelmente nova luz, ou a menos mais luz, sobre sucessos históricos isolados e ainda sobre épocas inteiras. Finalmente, o mero hábito de pensar em termos das categorias propostas facilitaria enormemente a orientação política na presente época, que hoje revela mais abertamente que nunca a conexão entre a economia capitalista, que tem chegado ao cume de sua saturação, com a política capitalista, que se tem transformado até ser completamente desenfreiada.
 
Notas[iii] Cf. Marx-Engels, Obras Escogidas, Ediciones en Lenguas Extranjeras, Moscú, s.d., tomo I, pp. 113-114. (nota da edição em espanhol)[iv] Ver “Tese sobre a situação mundial e a tarefa da Internacional Comunista” – Terceiro Congresso da Internacional Comunista, junho de 1921.[v] Economista russo N. D. Kondratiev que foi um dos primeiros teóricos que tentou provar estatisticamente o fenômeno das “ondas longas”, movimentos cíclicos de aproximadamente 50 anos de duração, conhecidos posteriormente na Economia, como “ciclos de Kondratiev”. A primeira referência de Kondratiev aos ciclos prolongados ocorreu em seu livro de 1922 “A economia mundial e sua conjuntura durante e depois da guerra”. Em sua maior parte, o livro tratava de uma análise empírica dos eventos desde 1914, mais que questões explicitamente teóricas.O conceito de ciclos prolongados foi introduzido nos últimos capítulos, e só na forma de uma generalização histórica mais bem tentada. Para ele a natureza particularmente aguda da crise do pós-guerra se explica assim mediante ao fato de que marcava um ponto de viragem no ciclo prolongado e o começo de sua fase descendente. Para saber mais leia “La teoría del ciclo prolongado de Kondratiev, Trotsky y Mandel”, de Richard B. Day, revista Critique no. 4 (originalmente publicado em inglês na New Left Review, no. 99).[vi] Três anos depois do presente artigo, Trótski proferiu um discurso em 18 de janeiro de 1926 no Clube de Negócios sobre os informes organizados pelo Conselho Econômico Industrial do Ministério da Planificação da URSS, sobre as tendências no desenvolvimento da economia mundial para 1919-1925, feitos pelos professores Bukshpan, Kondratiev, Spektator e Falkner. O texto foi em seguida publicado como “Sobre a questão das tendências no desenvolvimento da economia mundial” em Planoovoe Khozyaistvo (versão em espanhol também consta na coletânea Naturaleza y dinámica del capitalismo y la economía de transición).[vii]Informe político proferido no III Congresso da Internacional Comunista, em 23 de junho de 1921 como proposta de resolução à IC (“Informe sobre a crise econômica mundial e as novas tarefas da Internacional Comunista”). Antes do pronunciamento ao Congresso, Trótski apresentou uma versão preliminar desta (“A Situação Mundial”) na reunião do Comitê Central do Partido Comunista Russo. A versão corregida por Trotsky sobre a base taquigráfica foi publicado em Piat Let Kominterna. Este texto consta em versão em espanhol (“La Situación Mundial”) consta na coletânea de textos econômicos de Trotsky (León Trotsky. Naturaleza y dinámica del capitalismo y la economía de transición. Buenos Aires: Centro de Estudios, Investigaciones y Publicaciones León Trotsky, 1999).Será nesse informe que Trótski elaborará a teoria da “curva do desenvolvimento capitalista” que aprofundara no presente artigo.[viii] Documento político aprovado pela direção do Partido Comunista Russo em 1923, como compromisso político após a morte de Lênin, entre os vários grupos de dirigentes, cuja redação coube a Trótski, sobre a situação mundial e interna e sobre a necessidade de mudança dos rumos da atuação do partido para evitar a burocratização do Estado soviético.

terça-feira, 27 de março de 2012

Os Trotskistas na União Soviética (1929-1938) - Pierre Broué

Texto extraído do site: www.marxismo.org.br


Introdução

“Os organismos da ditadura proletária não podem admitir que exista no país da ditadura do proletariado uma organização ilegal antisoviética que, embora numericamente insignificante, possui, contudo, suas próprias gráficas, seus comitês, tenta organizar greves antisoviéticas e prepara seus partidários para uma guerra civil contra a ditadura proletária (...).

“Parece que nem todos os membros do partido se dão conta claramente de que entre a antiga oposição trotskista no seio do PCUS e a organização trotskista ilegal atual, que se encontra à margem das fileiras do PC da URSS, existe um abismo profundo. Não obstante, é tempo de assimilar essa manifesta verdade. É, portanto, absolutamente inadmissível aceitar esta atitude ‘liberal’ face às organizações trotskistas ilegais ativas, tal como se manifesta às vezes entre alguns membros do partido. Todos os membros do partido devem tomar nota deste assunto.” (Editorial de Pravda, 24 de janeiro de 1929).

O caráter reservado dos “cadernos do exílio” contribuiu para desfocar a perspectiva de muitos dos trabalhos históricos sobre a URSS. Devido à ausência desses documentos, que atualmente estão acessíveis, se reduziu a Oposição de Esquerda, e mais tarde a IV Internacional que dela surgiu, a um simples reflexo dos brilhantes escritos de Trotsky. Na realidade, a organização e, mais tarde, a corrente bolchevique-leninista no Partido Comunista da União Soviética, constituíram o núcleo da Oposição de Esquerda Internacional – no seio da Internacional Comunista – e por fim da IV Internacional. Existe, através dos militantes soviéticos, uma verdadeira ligação, um laço histórico concreto entre o bolchevismo e o trotskismo, enquanto que a versão tradicional não vê entre eles mais que uma similaridade de pontos de vista, ou mesmo uma simples repetição.

O trabalho de anotação das Obras de Trotsky (1) colocou-nos na pista de seus camaradas de luta na própria União Soviética. Através de nosso trabalho de documentação descobrimos primeiro o importante papel que desempenharam os membros russos da Oposição – “exilados” na diplomacia ou em missões econômicas, como foi o caso, em Paris, de Christian G. Rakovsky ou de Preobrajensky (2) – nas fileiras dos militantes do PC no estrangeiro.

Em missão governamental oficial, estes militantes dedicavam, na realidade, uma parte de sua atividade política ao trabalho “fracional”; em outras palavras, foi por seu intermédio que a Oposição russa chegou ao estrangeiro. Sabe-se, por exemplo, que foi Piatakov, representante da Oposição unificada em Paris, quem financiou a criação de Contra a Corrente e se esforçou em vão por unificar os grupos franceses de oposição em 1926 (3). Sabe-se, da mesma forma, que as primeiras iniciativas para a constituição, na Checoslováquia, de uma oposição unificada foram alentadas e apoiadas materialmente pelo diplomata soviético Kanatchikov (4). As memórias da alemã Ruth Fischer (5) abundam em múltiplos detalhes deste tipo: A. V. Hertzsberg (6), agregado da missão comercial de Berlim; G. I. Safarov (7), membro da delegação de Istambul, onde não residia; N. N. Perevertsev (8), membro de uma comissão internacional sobre as estradas de ferro em Gênova, todos eles trabalhavam na Europa por conta da Oposição de Esquerda russa que contava, por outro lado, com três empregados permanentes da delegação em Berlim: Issaiev, Turov e Kaplinsky (9). A mesma autora menciona o papel oculto de conselheiro e impulsionador da esquerda alemã do trotskista russo E. B. Solntsev (10). Precisa que duas dezenas de funcionários soviéticos com postos no estrangeiro assistiam, por outro lado, em dezembro de 1927, à conferência internacional da Oposição, que se realizou ao mesmo tempo em que o XV Congresso do PCUS, sob a presidência do russo Safarov e na presença precisamente de Solntsev (11).

Em 1928, uma das ligações da Oposição de Esquerda com os franceses simpatizantes era um membro da delegação comercial, chefe do escritório de informação, o professor vermelho Solomon Kharin, conhecido comumente por Joseph (12).

Deve-se acrescentar que numerosos militantes comunistas que se uniram à Oposição de Esquerda o fizeram a partir de seu posicionamento sobre a “questão russa”. Estes homens haviam estado na URSS, onde freqüentemente haviam trabalhado, e ali haviam sido ganhados pela Oposição. O mais conhecido é evidentemente o catalão Andrés Nin, secretário em Moscou da Internacional Sindical Vermelha e membro do sovíete da capital, membro da Oposição desde 1923 e impulsionador de sua comissão internacional. Foi em Moscou que Nin ganhou, por exemplo, ao operário de padaria negro Sandalio Junco, que iria implantar o “trotskismo” em Cuba (13). Do mesmo modo, o primeiro grupo de Oposição de Esquerda no Brasil foi fundado pelo antigo representante do PC em Moscou, Rodolfo Coutinho (14). A maioria dos quadros da Oposição de Esquerda na China, começando por Liu Renjing (15), aderiu à Oposição enquanto eram estudantes na Universidade dos Povos do Oriente em Moscou entre 1925 e 1927. Um dos primeiros trotskistas checos foi um militante de Brno, Vladislav Burian, que havia sido um dos primeiros dirigentes do PC checo refugiado em Moscou em 1925, ganhado pela Oposição simultaneamente com o presidente das Juventudes Comunistas da Checoslováquia, Karel Fischer, chamado de Michalec, “zinovievista”, junto a seu amigo sérvio Boja Vuyovic, enquanto que o jovem delegado de Praga a uma conferência de organização das JC em Moscou, Wolfgang Salus (16) se encontrava ali com os oposicionistas russos que o convenceram da justeza da plataforma da Oposição. Finalmente, não nos omitiremos de dizer que a Oposição de Esquerda na América do Norte foi constituída por iniciativa de dois delegados ao VI Congresso da Internacional Comunista, o americano James P. Cannon e o canadense Maurice Spector (17), os quais haviam encontrado entre seus documentos do Congresso – que havia sido ali colocada por mãos anônimas – a Crítica ao projeto de programa da Internacional Comunista, que Trotsky acabara de redatar em Alma-Ata (18).

Mas existe hoje uma razão suplementar para se estudar de perto a história da Oposição de Esquerda na União Soviética depois de sua expulsão do partido em dezembro de 1927: porque a luta contra o “trotskismo” constituiu uma etapa decisiva no desenvolvimento e na instauração do totalitarismo estalinista, e foi contra os “bolcheviques-leninistas” que se colocou pontualmente e se aperfeiçoou o sistema contemporâneo do aparato policial, da GPU ao Gulag, recentemente descoberto por tantos falsos ingênuos ou autênticos cretinos. A partir deste ponto de vista, a história da Oposição de Esquerda russa não nos parece um simples episódio, mas uma página capital da história da própria União Soviética.

Interessamo-nos aqui por apresentar melhor os documentos inéditos encontrados nos cadernos do exílio de Trotsky (19), na organização clandestina dos “trotskistas” na União Soviética, desde sua entrada na ilegalidade, em dezembro de 1927, no curso do XV Congresso, até o desaparecimento de seus últimos sobreviventes. Recordemos simplesmente que a tendência excluída no XV Congresso, a “Oposição Unificada”, tinha nesse momento 18 meses de existência e que havia nascido em 1926 da fusão entre duas das mais antigas “frações” do partido, a Oposição de Esquerda, chamada de “oposição de 1923”, organizada em torno de Trotsky, e a “nova oposição”, constituída em 1925, em Leningrado, por Zinoviev e Kamenev (20).

Depois de haver privado a oposição unificada de seus meios de expressão acusando-a de atividades “fracionais”, depois de haver detido muitos de seus responsáveis em uma provocação organizada pela GPU – o caso da gráfica e do “oficial de Wrangel” (21) –, Stalin, com o apoio de Bukharin, deu no XV Congresso um passo decisivo decretando a incompatibilidade entre pertencer ao Partido e aderir às idéias da Oposição. Esta última explodiu, então, no próprio curso do congresso. Kamenev e Zinoviev, acompanhados pelo núcleo da antiga oposição de Leningrado, declararam rapidamente que renunciavam à defesa das idéias que haviam sustentado até o momento. Pelo contrário, em uma declaração apoiada por Smilga, Muralov e Radek, Christian Rakovsky afirmou a determinação dos bolcheviques-leninistas de continuar o combate pela defesa da plataforma e dos princípios da Oposição e reivindicou o reingresso dos excluídos ao partido, sobre a base de seus direitos (22).

Apesar das aparências, o rompimento da Oposição unificada não se fez sobre a linha de divisão de suas duas principais partes constituintes: os “zinovievistas” e os “trotskistas”. De um lado, porque um dos principais dirigentes da antiga “nova oposição” – I. T. Smilga (23) – que havia combatido a Oposição de Esquerda de 1923 a 1925 – rompeu com Zinoviev-Kamenev e, assinando o texto de Rakovsky, uniu-se a Trotsky. De outro, uma importante fração da antiga oposição de Leningrado, jovens essencialmente, acompanharam Safarov e se recusaram a seguir seus dirigentes históricos na via da capitulação. Os trotskistas lograram ganhar o entorno imediato dos dirigentes zinovievistas recrutando, debaixo de seus próprios narizes, o próprio secretário de Kamenev, Filip Schwalbe (24).

Havia ali um fato mais importante que nem a capitulação rigorosa, em 27 de janeiro de 1928, de Zinoviev e Kamenev, que declararam renunciar às próprias idéias, nem aquela dos “trotskistas” desmoralizados, como Iuri Piatakov, alguns meses mais tarde, conseguiu mudar: o grosso das tropas da Oposição de Esquerda expulsa do Partido, os batalhões de milhares de irredutíveis, colocavam-se em massa sob a bandeira de Trotsky.
 

A oposição em 1928

O objetivo das primeiras prisões, em 1927, e, mais tarde, do início das deportações em massa era o de quebrar a Oposição como organização privando-a de todos os seus dirigentes e quadros. Nas semanas e meses que se seguiram, as ondas de detenções, as penas de prisão e de exílio que afetavam cada vez mais a muitas centenas de militantes, perseguiam o mesmo objetivo, com o cuidado suplementar de extirpar, ali onde se manifestavam ainda, os focos da Oposição. Discursos e imprensa oficial o reconheceram não obstante isso no início de 1929: esses esforços foram vãos e a Oposição sobreviveu e progrediu em todo o transcurso do ano 1928.

A oposição se tornou, de qualquer forma, em 1928, muito diferente do que havia sido em 1927 como “fração” no seio do partido oficial. Daí que estivesse, ademais, dividida, por força das circunstâncias – e das decisões repressivas da GPU – em dois setores. Por um lado, seu setor ilegal, clandestino, formado por militantes ainda não alcançados pela repressão, demasiado ou não suficientemente conhecidos. Por outro, o setor praticamente “legal” – aberto, se ousarmos afirmá-lo –, que funcionava praticamente à luz do dia nas zonas de deportação, os quais podiam reunir-se mais ou menos livremente, discutir, escrever e, sobretudo, manter correspondência.

Do primeiro setor, sabemos pouco além do que se reflete nos informes que aparecem nos arquivos cuidadosamente produzidos tendo em consideração as necessidades do sigilo da clandestinidade. Sabemos, não obstante, que, depois da detenção e do envio ao exílio de Trotsky e de seus companheiros, funcionou em Moscou um “centro” clandestino dirigido pelo velho bolchevique dos Urais, Boris M. Eltsine (25), cujo emissário se dirigia por trem a Frunze para colocar o correio em mãos de um militante de confiança, o metalúrgico de Moscou Mikhail Bodrov, que, conduzindo uma troika [carro típico russo, Nota do Tradutor], e sob uma grande barba e uma blusa típica de mujique, assegurava então o transporte de valiosos documentos que enviava a Alma-Ata e punha nas mãos de Leon Sedov (26). Sabemos, também, que existiam núcleos da Oposição em quase todas as grandes cidades da União Soviética: Victor Serge lembra-nos do de Leningrado, no qual se encontrava Alexandra Lvovna Sokolovskaya, primeira mulher de Trotsky e mãe de suas filhas. Sabemos, igualmente, que, entre os aproximadamente 150 militantes detidos em Moscou em janeiro de 1929, encontravam-se alguns dos responsáveis da imprensa clandestina da Oposição desde 1928, em particular um “veterano” do episódio da imprensa clandestina de 1927, o grande mutilado e ex-chequista Khanaan M. Pevzner (27). Um dos dirigentes de Moscou era Ianuchevsky.

Alguns dos impulsionadores da Oposição que militavam fora das prisões e das colônias de exilados não eram cidadãos livres exercendo uma atividade clandestina. Estavam na ilegalidade e eram homens e mulheres conhecidos da GPU, mas que haviam escapado dela e que viviam nesse meio do partido onde geralmente eram estimados, beneficiando-se do “liberalismo” de que se queixava a Pravda. O fato de que “agüentassem” demonstra, na verdade, que se moviam em um meio que, longe de ser-lhes hostil, proporcionava-lhes hospitalidade, ajuda e proteção. Dois exemplos: em Bogorodask, os operários da fábrica Glukhov esconderam durante vários dias a um deles, o oposicionista Stukolkin, e conseguiram tirá-lo da cidade diante das barbas da GPU (28). Por outro lado, em suas memórias recentemente publicadas, a comunista alemã – Rosa Levine-Meyer – fala de seus encontros, em Moscou, nessa época, com G. Ia. Iakovin, um dos dirigentes do “centro” e marido de sua amiga, a historiadora Pankratova. Iakovin havia deixado Leningrado onde era muito conhecido e vivia em Moscou, alojado por camaradas: procurou-se inclusive um passe que lhe permitisse entrar no hotel Lux e ali discutir com os comunistas estrangeiros. Inclusive chegou a voltar clandestinamente a Leningrado para assegurar ali os contactos (29).

Os informes que iam da União Soviética ao estrangeiro – para Trotsky e seu filho Liova – mencionavam as atividades deste setor da oposição: publicação de volantes, e também de folhetos, difusões clandestinas, subscrições para os prisioneiros, mas também intervenções nas reuniões do partido ou nas assembléias operárias, dos desempregados especialmente, candidaturas abertas nos comitês de fábricas ou nos sovíetes, e sublinhavam também seus inegáveis êxitos. O setor clandestino “livre” da Oposição manteve verdadeiramente uma real existência e atividade, apesar dos obstáculos que se acumulavam, da repressão, do início dos apelos à delação e da generalização da provocação que parece haver afetado nessa época a quase todos os grupos locais.

O segundo setor da Oposição, provavelmente o mais numeroso, visto que não deixou de crescer em detrimento do primeiro, era aquele das colônias de deportados – 107 recenseados em 1928, segundo os documentos de Harvard – e, também de crescimento rápido, aquele das prisões abertas especialmente para os bolcheviques-leninistas recalcitrantes, os “cárceres de isolamento”. Conhecemos melhor a estas que as primeiras. Durante os três primeiros trimestres de 1928, na realidade, o grosso da correspondência dos deportados foi geralmente distribuída apesar de que as cartas fossem abertas à saída e à chegada. Uma discussão apaixonante começou entre os exilados: esses homens que pertenciam a todos os “setores” do partido e do Estado soviético e que, alguns meses antes, exerciam ainda altas responsabilidades, passaram a dispor, então, de um pouco de tempo para meditar sobre a experiência dos anos anteriores, a retomar trabalhos teóricos, a revisar os documentos do partido e da Internacional, a desenvolver entre eles um tipo de discussão entrelaçada. Uma parte dos documentos apaixonantes, que são o fruto desta situação, foi publicada nessa época pelo Biulleten e, às vezes, em outros idiomas. Citemos a Crítica ao projeto de programa da IC, elaborado por Trotsky em Alma-Ata, a carta de Rakovsky a Valentinov, conhecida sob o título de Perigos profissionais do poder. Pode-se encontrar em Harvard outra Crítica ao projeto de programa da IC, de Dimitri Lapin, muito apreciada por Trotsky. Mas não dispomos nem de A política agrária do centrismo, de L. S. Sosnovsky, nem dos trabalhos de Smilga e de Preobrajensky (As conquistas da ditadura do proletariado no ano XI da revolução), nem, mais uma vez, do de Rakovsky (As leis da ditadura socialista), do de Solntsev (A lei do desenvolvimento desigual em Marx) etc. Dificilmente encontramos na história do marxismo um período mais fecundo e mais criativo e de resultados menos conhecidos ou diretamente desconhecidos: estes títulos não refletem mais que uma ínfima parte da produção teórica dos deportados.

Contudo, não se trata de trabalho acadêmico. A Crítica ao projeto de programa propunha-se a chegar a todas as seções da IC. Esforçavam-se por discutir em todos os lugares os textos que deviam expressar uma posição coletiva e em seguida os textos circulavam. Para esta crítica, ainda que escasseasse o tempo, havia, não obstante, um tipo de procedimento referendário através das colônias; com relação aos dois textos que se opunham o de Radek não conseguiu mais que meia dezena de assinaturas contra muitas centenas para o de Trotsky.

Mas os problemas políticos que se colocavam não eram nem gratuitos nem abstratos. Por isoladas que fossem as primeiras capitulações – as dos ex-zinovievistas Safarov, Ilya Vardin (30) – também as dos ex-trotskistas Piatakov, Serebriakov, Antonov-Ovseenko, Krestinsky (31) não eram menos inquietantes indicadores da fragilidade dos homens que se acreditavam “duros” e que cederam logo que se iniciou a repressão. Esta “segunda onda” – a primeira foi a de Zinoviev-Kamenev – não foi, contudo, levada a sério em seu conjunto e não enfraqueceu nem as forças vivas da oposição nem, menos ainda, seu moral. A grande maioria dos oposicionistas no exílio reconhecia-se na interpelação feroz de Sosnovsky ao capitulador Vardin: “Nunca esqueças que estás morto!” (32).

A evolução de Radek parecia mais perigosa, tal como se traduzia através das interrogações e das dúvidas que se expressaram primeiro em suas cartas. Este homem, cheio de inteligência, jornalista de grande talento, era conhecido também por sua versatilidade política e por seu caráter impulsivo. Em 1927, mostrou-se muito reservado frente à “plataforma da Oposição”. Ele colocava, entre outras coisas, que o “Termidor”, que a Oposição anunciava como risco, já poderia ser um fato. Negou-se a descartar, como o fazia a plataforma, a perspectiva de se criar um “segundo partido”. Esta idéia se fortaleceu finalmente entre os elementos mais esquerdistas, próximos aos decistas. Apesar disso, em princípios de 1928, mudou rapidamente de posição: a mudança empreendida pelo aparato estalinista depois da crise do trigo e da greve dos provedores de cereais, no início de 1928, baseada na decisão de aplicar aos kulaks (33) medidas de coerção, parecia demonstrar-lhe a existência de uma verdadeira “virada à esquerda” – que julgou positiva – por parte da direção estalinista.

Em março de 1928, enquanto se encontrava deportado em Tobolsk, a benevolência interessada da GPU outorgou-lhe a autorização de se encontrar em Tomsk com Smilga e seus amigos próximos, Beloborodov e Preobrajensky, este último autorizado a vir de Kazan. Radek escreveu muito e tentou convencer seus camaradas de exílio. As reações não se fizeram esperar. Não fizeram mais que acelerar seu passo. Levado por seus próprios impulsos, vivamente molestado pelos “ataques de baioneta” que surgiam de todos os lados contra ele – as palavras são de Trotsky – declara-se em guerra contra a revolução permanente, em seguida contra a política da Oposição de Esquerda quanto à revolução chinesa. Trotsky não podia deixar de lhe responder. Fê-lo em uma carta datada de 17 de julho de 1928, contendo uma severa crítica às posições de Radek, que não rompia, contudo, a solidariedade de tendência com ele, porque ainda via a necessidade de “dizer isto no interesse da clareza, sem temer os esforços de um adversário ‘monolítico’ para explorar as divergências entre nós”.

Com efeito, no momento em que se iniciou, nessa altura, a crise do que Trotsky chamou de “o bloco de centro-direita”, e onde já se anunciava a ruptura entre Stalin e Bukharin, a manutenção das posições da Oposição e seus progressos tornavam inevitável a escalada das medidas de repressão. Desde o final de setembro cessaram brutalmente os serviços do correio normal que tinham servido até então aos deportados. A GPU tomou medidas que permitiram classificar o correio e de não deixar chegar mais que a correspondência que se havia decidido deixar chegar, dispondo dos meios necessários para interromper totalmente toda correspondência em caso de necessidade. Ao comprovar que estas medidas não eram suficientes, em 16 de setembro, o representante da direção colegiada da GPU, Volynsky, se apresentou em Alma-Ata e declarou a Leon Trotsky:

“No decorrer destes últimos tempos a atividade no país de seus correligionários adquiriu um caráter claramente contrarrevolucionário; as condições sob as quais você se encontra em Alma-Ata permitem-lhe dirigir perfeitamente esta tarefa. Este é o motivo pelo qual a direção colegiada da GPU decidiu exigir-lhe a promessa categórica de cessar sua atividade, se não, ver-se-á na obrigação de mudar as condições de seu confinamento isolando-o completamente da vida política: isto colocará, ao mesmo tempo, a questão da mudança de vosso lugar de residência” (34).

A recusa categórica de Trotsky colocou o Bureau Político contra a parede. Depois de três dias de dilatadas e acesas discussões, o Bureau finalmente se pronunciou a favor da solução preconizada por Stalin frente à posição mais cuidadosa de Bukharin. Trotsky foi expulso do territória soviético. Alguns dias antes a GPU tinha detido de uma vez aproximadamente 150 pessoas por difundirem uma carta de Trotsky, entre eles, velhos bolcheviques, como os georgianos Budu Mdivani e Kavtaradzé, o crítico literário Voronsky, heróis do Exército Vermelho e da guerra civil, Drobnis, Gaievski, Grunstein, Pevzner (35). O jornal Pravda não dissimulou que se tinham beneficiado de muitas simpatias e de um “excesso de tolerância” antes de serem submetidos a “um isolamento severo enquanto elementos hostis à ditadura proletária”, e, em 24 de janeiro, esse mesmo jornal ameaçava a quem tentasse manifestar-lhes a menor indulgência.

Com efeito, começava uma nova etapa na história da Oposição de Esquerda, bem como na história da própria União Soviética.

 
A crise da oposição em 1929

O ano de 1929 começou em Moscou com a detenção de uma centena de oposicionistas, a decisão de expulsar Trotsky e um golpe extraordinário realizado pelos oposicionistas de Moscou: a publicação do resumo, redigido por Kamenev, de suas discussões com Bukharin algumas semanas antes; o destinatário era Zinoviev, mas Schwalbe distribuiu cópias do mesmo aos trotskistas.

Rapidamente o governo recorreu a novas medidas de urgência para quebrar os kulaks que resistiam às requisições e essa mudança foi acompanhada de uma ofensiva de Stalin dirigida abertamente contra as posições da “direita”. Em 27 de fevereiro, Molotov, na Pravda, rechaçou a teoria da integração pacífica do kulak no socialismo e retomou a afirmação da Oposição de Esquerda, segundo a qual o kulak constituía a vanguarda da restauração burguesa. Em junho, os três, Bukharin, Rykov e Tomsky, foram afastados de suas responsabilidades. Em novembro, fizeram uma autocrítica pública. Foi em 27 de dezembro finalmente que Stalin, em um artigo da Pravda, intitulado Ao diabo com a NEP, tornou oficial o novo curso, de fato já empreendido depois da primavera: daí em diante, a nova política seria a industrialização rápida e a coletivização integral, e, como corolário, a “liquidação do kulak como classe”.

Trotsky acompanhou com atenção os acontecimentos na URSS, informado como estava até dos detalhes do que se havia passado e do que se passava inclusive no Bureau Político. Parecia não ter a menor dúvida. A nova política que havia substituído a NEP – mas, por quanto tempo? – não era e não podia ser uma “virada à esquerda”, isto é, à recondução da linha do partido sob a pressão de seu “núcleo proletário” precisamente no próprio momento em que o aparato redobrava suas perseguições contra a Oposição de Esquerda. O binômio coletivização-industrialização, o apelo à autocrítica e a denúncia do “perigo da direita” e da ameaça kulak – a que Trotsky chamou de “guinada brusca à esquerda” – constituíam, por sua vez, uma reação empírica de fuga para frente, para sair do impasse da política pró-kulak que havia fracassado, e uma manobra burocrática para liquidar as posições dos bukharinistas, a quem Stalin pensava que, dali em diante, havia que se abater.

Contudo, Trotsky não subestimava a gravidade da crise em que o bloco de centro-direita havia precipitado o país com sua política dos anos precedentes. Estava consciente de que uma política de direita neo-NEP, com concessões ao capitalismo, poderia dar, de imediato, resultados positivos, mas que seria também a porta aberta à contraofensiva para a restauração do capitalismo. Estava igualmente convencido de que o aparato nas mãos de Stalin poderia perfeitamente lançar-se a tal política, depois de haver eliminado os porta-vozes “direitistas”. Mas não excluía, tampouco, que a virada brusca à esquerda se desenvolvesse em uma “aventura burocrática”, que impulsionasse os camponeses pobres e médios a uma aliança com os kulaks, mesmo que, no final das contas, não fosse mais que para voltar rapidamente, ante a derrota, a uma política mais direitista ainda que a dos direitistas. A Oposição avançava, então, sobre um terreno minado com uma estreita margem de manobra. Para Trotsky, a Oposição devia converter-se na impulsionadora de uma verdadeira “virada à esquerda”, inconcebível sem o fim das perseguições, a reintegração dos oposicionistas excluídos, a restituição da iniciativa às massas, a reinstalação de sindicatos autênticos, a multiplicação das uniões de camponeses pobres, um programa definitivamente inaceitável para Stalin e a fração “centrista”, mas que Trotsky propôs ao partido em seu conjunto como um objetivo para alcançar a frente única e afrontar os perigos do momento. Desde a Turquia, onde se havia estabelecido depois de sua expulsão, desenvolveu, através de artigos, cartas, mensagens, circulares e, em seguida, nos artigos do Biulleten Oppositsii, que começou sendo publicado em Paris, a política cujas grandes linhas já havia exposto em sua declaração de 12 de julho de 1928 no VI Congresso da Internacional (36).

O conjunto dos deportados da União Soviética, em condições diferentes e sofrendo fortes pressões, não tinha a mesma visão geral. Logo, uma importante fração dentre eles – e, o que é mais grave, uma parte do velho núcleo da Oposição de 1923 – começa a desenvolver uma posição favorável à direção do partido sobre a base da existência do que chamava de uma “virada à esquerda”.

Múltiplos fatores políticos, sociais e psicológicos fizeram parte do mecanismo que conduziu à crise a Oposição de Esquerda. Seus quadros pertenciam, em sua maioria, ao mesmo meio daqueles das tendências dominantes no aparato; haviam surgido da mesma geração, dos mesmos combates e, finalmente, da história do mesmo partido. Estavam mais ou menos profundamente marcados, eles também, pela degeneração do partido, em sua mentalidade e em sua forma de vida. Reagiam à deportação e ao exílio como uma morte política e começaram a compreender o ponto de vista de Zinoviev, disposto a “tragar” e a “se arrastar”, desde que o fosse no seio do partido, já que fora dele não havia nada. Entre eles, por outro lado, eram, sem dúvida, numerosos os que se haviam comprometido no combate da Oposição Unificada simplesmente porque acreditavam em sua vitória no curto prazo e em sua volta rápida aos cargos políticos e às honras. Alguns estavam muito debilitados, inclusive desmoralizados, para enfrentar uma repressão de longa duração, demasiado céticos para se sacrificarem por uma causa em que quase não acreditavam.

Outros obedeciam a motivos mais diretamente políticos. Desde 1923, os oposicionistas haviam enfrentado, sobretudo, à ala do partido que consideravam como o inimigo número um, a direita, vanguarda do “Termidor” e da restauração capitalista, onde os “centristas” não eram, no julgamento de muitos deles, mais que cúmplices enganados por sua miopia. Sinceramente ou não, muitos foram os oposicionistas que viram na virada brusca à esquerda a forma de uma verdadeira virada que não somente lhes dava historicamente a razão e justificava a luta passada da Oposição, como também lhes oferecia a odiosa cabeça de seus adversários direitistas. Por acaso não eram a industrialização e a coletivização as reivindicações essenciais da plataforma de 1927? A nova política anti-kulak não respondia aos seus gritos de alarme durante anos e não confirmava suas perspectivas sobre o “perigo da direita”? O quadro comportava ainda muitas sombras certamente, mas se os centristas iam verdadeiramente para a esquerda, não estariam obrigados, mais cedo ou mais tarde, a se apoiarem sobre o movimento de massas, sobre a fração proletária do partido, seu “núcleo operário”, e em seguida sobre as massas? Não ficavam garantidas, com a nova política, imensas tarefas? Para grande número destes militantes que se impacientavam por agir, a questão era saber se o lugar daqueles que haviam combatido pela plataforma estava na Sibéria e na Ásia Central, no isolamento e na impotência do exílio, enquanto a batalha decisiva contra a direita estava sendo dada em Moscou. Como políticos que eram, sonhavam com a volta à capital onde se tomavam as decisões, porque estimavam que seu dever fosse apoiar o “centro” para eliminar a direita e, assim, tornar irreversível a virada à esquerda.

Era o que pensava Radek – do qual o Bureau Político, informado pela GPU, conhecia a correspondência e os pontos de vista que defendia – que foi logo objeto de pressões diretas, enquanto a GPU se ocupava em difundir os documentos que dele emanavam e a reter cartas e resoluções que o condenavam. Era também o que pensava Preobrajensky, e havia aqui um fato infinitamente mais grave, porque não se tratava de um franco-atirador como Radek, e sim de um dos “chefes históricos” da Oposição que havia sido seu porta-voz em 1923 e em 1925-26 no curso do “debate econômico” contra Bukharin. Pois bem, Preobrajensky modelou como economista a parte econômica do programa da Oposição; então, por ter sido o primeiro em preconizar “a acumulação socialista primitiva”, não podia espantar-se com as conseqüências político-sociais de uma coletivização e de uma industrialização que eram, em sua opinião, não somente as peças chaves do programa da Oposição – em que definitivamente pensava que era “reconhecido” pelos dirigentes e deste modo justificado a posteriori – como também as condições e as premissas para a regeneração do partido.

No final de março, os três – Radek, Preobrajensky e Smilga – colocaram novos documentos em circulação. Eram as “teses” de Omsk. Radek havia dado mais um passo, porque, criticando a violência verbal de que dava provas Iaroslavsky em suas diatribes contra a Oposição, condenava o que chamava de “colaboração de Trotsky com a imprensa burguesa”. Foi este retrocesso a causa das vacilações de Preobrajensky? No dia seguinte de um encontro, autorizado pela GPU, com Ichtchenko, que acompanhava os passos de Radek, tornou público que, com efeito, ele não daria mais um só passo com Radek e Smilga até que as autoridades não houvessem restituído aos deportados a liberdade total de reunião e de correspondência a que tinham direito. Em uma carta que colocou em circulação em abril, dirigida a todos os oposicionistas deportados, Preobrajensky se apresentava como o unificador de todos aqueles que se diziam “conciliadores”, a quem o aparato buscava converter em “capituladores”. Muito lúcido, previu que os militantes que quisessem ser reintegrados a qualquer preço no partido deveriam se submeter a “métodos que não podem aprovar” e que os fariam tornar uma “pesada cruz” seu novo carnê do partido (37).

O que Preobrajensky queria era negociar. Reclamava às autoridades o final da repressão, o abandono da aplicação do artigo 38 aos oposicionistas, a volta de Trotsky do exílio. As autoridades estalinistas jogariam com suas aspirações. No final de abril, foi autorizado a voltar a Moscou por um tempo e ali começou imediatamente discussões com Iaroslavsky e Ordjonikidzé, as quais Stalin parece ter acompanhado muito de perto. Ignoramos tudo o que se refere ao desenvolvimento concreto, às pressões que foram exercidas sobre ele e seus retrocessos sucessivos. Sabemos somente que, em julho, chegou o turno de Smilga e de Radek para a obtenção da autorização de deixar o exílio em troca de uma estadia em Moscou. Interrogado na estação de Ichim por deportados membros da Oposição, Radek revelou seu verdadeiro estado de ânimo e sua orientação real: convocou-os a “unirem-se ao partido em perigo” e afirmou “nada mais ter em comum com Trotsky” (38).

Stalin não podia sob nenhuma hipótese aceitar nenhuma das reivindicações inicialmente apresentadas por Preobrajensky. Para ele, os antigos oposicionistas não podiam em caso algum ser autorizados a dizer que haviam tido razão e que o partido se havia equivocado ao golpeá-los. Jogou, não obstante, a fundo a carta das pretendidas negociações, porque esta alimentava as ilusões dos oposicionistas mais débeis, permitia isolar Trotsky desterrado e fazer explodir a tempo a Oposição de Esquerda. A semi-liberdade concedida a Radek, Preobrajensky e Smilga, e a difusão sistemática de suas cartas e documentos nos locais de deportação iam acompanhadas de medidas que reforçavam o isolamento material e psíquico daqueles militantes irredutíveis e dispostos a denunciar os capituladores.

Mal informado, o exílio fervia de rumores alarmistas. Com destino aos mais sinceros ou aos mais cândidos dos vacilantes, as autoridades jogavam com o medo coletivo, com as convulsões que ameaçavam o campo, com o renascido perigo “branco”, com o reaparecimento de uma situação geral parecida àquela que havia prevalecido na véspera da insurreição de Cronstadt: todo tipo de argumentos a favor de uma união sagrada que não se podia obter dos dirigentes mais que ao preço de concessões apresentadas como menores. Para outros, colocavam-se como relevantes as “grandiosas” perspectivas abertas pela nova política de transformação da economia e da sociedade, o “outubro camponês” (a “terceira revolução”, como escreveria mais tarde Isaac Deutscher). Para os mais débeis, finalmente, jogava-se com o interesse material fazendo ver as possibilidades de reintegração nos postos oficiais para aqueles que retomassem a tempo o caminho correto.

A campanha foi bem orquestrada e deu seus frutos. Em junho de 1929, em uma carta dirigida a Rakovsky e interceptada pela GPU, Solntsev descrevia o “pânico” nas fileiras da Oposição na deportação e, inclusive, a “decomposição” em suas fileiras ante o que chamava de “inaudita traição” da “comissão dos três”. Outros veteranos se comprometeram, por sua vez, na perigosa via das negociações sem se darem conta, aparentemente, que estas somente conduziam à capitulação. Foi este o caso de Ivan Smirnov, acompanhado de Beloborodov, S. V. Mratchkovsky e outros, que proclamaram a necessidade de “salvar a unidade da oposição” e se alistaram assim dentro da corrente dominante, o que a decompunha mais um pouco (39).

Foi finalmente em 13 de julho que Pravda publicou a declaração dos três, referendada por 400 exilados. Tratava-se, na realidade, de uma capitulação sem subterfúgios que condenava não somente as posições e a atividade do momento da Oposição, como também suas antigas posições, inclusive a renúncia às assinaturas de 1927 ao pé da plataforma. Este texto constituiu para Stalin uma vitória esmagadora: Radek, Preobrajensky e Smilga haviam sido dos dirigentes mais ouvidos da Oposição de Esquerda e abandonaram finalmente todas suas “reivindicações” para tornarem-se simples aduladores, não somente do curso “esquerdista” oficial, como também da direção em geral.

Apenas um texto nos chegou informando sobre um debate nas fileiras dos “bolcheviques-leninistas” em liberdade: o de Lev Z. Kopelev, que tinha então 17 anos e pertencia há algumas semanas à organização de Kharkov. Os oposicionistas fizeram uma reunião clandestina em um bosque fora da cidade e escutaram o informe do “camarada Alexandre, de Moscou” sobre a “situação atual e os problemas da Oposição leninista”. Este último explicou que o Comitê Central havia adotado o programa da industrialização da Oposição, que havia terminado o perigo kulak, que o próprio Stalin havia destruído as bases de seu poder usurpado. Assim evocava Kopelev os argumentos daqueles que, como ele, lutavam pelo abandono da atividade fracional:

“O essencial era construir fábricas e centrais elétricas, reforçar o Exército Vermelho. Que Trotsky, no exílio, se ocupe da revolução mundial; nós, em casa, devemos trabalhar com o partido e a classe operária em vez de agravar a cisão e de minar a autoridade do comitê central e do governo soviético” (40).

Nas fileiras dos deportados, as conseqüências da capitulação dos três foram imensas. Muitos acreditaram que seus dirigentes haviam ido negociar em Moscou em nome de todos e descobriram lendo Pravda o alcance do desastre. Outros se precipitaram em imitá-los antes que a porta se fechasse definitivamente. Mas a grande maioria estava, sobretudo, profundamente desmoralizada – e foram homens céticos que, um depois do outro, se alistaram para ser libertados.

Não obstante, a capitulação dos três foi demasiado grosseira para não provocar algumas reações de rejeição. Desta forma, I. N. Smirnov e os seus condenaram o que consideravam como uma claudicação e retomaram as negociações com as reivindicações exigidas antes por Preobrajensky. Sobretudo, não faltaram no exílio homens dispostos a pedir sua reintegração ao partido sobre a base da nova política de “virada à esquerda” e a renunciar publicamente a toda atividade fracional, mas que estavam longe de renegar publicamente suas idéias passadas e presentes e, ainda menos, de fazer um gesto que significaria de sua parte a aprovação da repressão contra a Oposição e, particularmente, a sanção do exílio de Trotsky. Christian Rakovsky apostaria por esta abordagem, buscando, antes de tudo, retê-los na pendente pela qual corriam o risco de deslizarem com I. N. Smirnov, em prejuízo de todas as suas boas intenções. Rakovsky enviou finalmente em 22 de agosto desde Saratov, onde havia discutido o texto com seus camaradas de deportação, uma “declaração” dirigida ao Comitê Central e à Comissão Central de Controle, referendada ademais por V. V. Kossior e Mikhail N. Okudjava (41). Em tom muito moderado, sob uma forma finamente calculada, a declaração afirmava a determinação da Oposição de tomar todas as suas responsabilidades em vista da constituição de uma frente única no partido contra o perigo de direita. Mantinha-se muito firme na reivindicação da liberação imediata e reintegração nas fileiras do partido dos oposicionistas presos ou deportados.

Censurar-se-ia à declaração o fato de que não condenasse claramente a teoria do “socialismo em um só país”, de ambigüidade nas questões fundamentais da revolução internacional. Os que a criticavam dizendo que havia se voltado a favor dos homens que estavam empreendendo a retirada, mediam a gravidade da crise que sacudia a Oposição? A questão foi rapidamente resolvida pelos fatos. Primeiro, nas colônias, onde circulava ao preço de grandes esforços a declaração, reuniu em algumas semanas um número importante de deportados cheios de indignação pela “traição” dos três: quinhentas assinaturas em três semanas, entre as quais figuravam as de militantes prestigiosos como N. I. Muralov, V. S. Kasparova, K. E. Grunstein, L. S. Sosnovsky. A declaração cortou a grama sob os pés dos conciliadores que se encaminhavam em direção à capitulação, como I. N. Smirnov, que manifestaram sua “boa vontade” e “espírito unitário” frente à má fé dos assinantes. Finalmente, a capitulação de Smirnov, Boguslavsky, Mratchkovsky, Beloborodov e outros, em outubro, não teve o caráter infame da de Radek e seus partidários (42). Por outro lado, uma nova declaração aparecida em quatro de outubro marcou o realinhamento da Oposição de Esquerda sob a direção de Rakovsky.

A brutal falta de receptividade que mostrou o aparato frente à declaração de agosto, os violentos ataques assinados por Iaroslavsky em Pravda, as represálias ferozes exercidas contra Rakovsky, expulso de Saratov e deportado em condições desumanas a Barnaul, contra Sosnovsky, enviado ao “cárcere de isolamento” de Cheliabinsk, e finalmente a Tomsk – uma verdadeira tumba – tudo isto terminou por convencer aos verdadeiros indecisos, aos conciliadores sinceros, aos ingênuos verdadeiros: como escrevera Rakovsky em suas teses de agosto, esta atitude se opunha à Oposição de Esquerda e à defesa que esta fazia da natureza do partido, a sua democracia interna, à democracia operária, tudo o que constituía a pedra angular para que se desse uma verdadeira “virada à esquerda” e o que permitiria descartar então uma verdadeira rcomposição do partido.

Quando Trotsky finalmente colocou em 25 de setembro sua própia assinatura sob a declaração de Rakovsky que acabava de receber, pôde escrever, por sua vez, que estava de acordo com seu conteúdo político, mas que já pertencia a um passado caduco. Comentando os acontecimentos daqueles últimos meses sobre a base da correspondênci da URSS, Isaac Deutscher estimava que o golpe dado à Oposição fôra violento: de oito mil membros – isto é, duas vezes mais que na época de sua semi-legalidade no partido em 1927 – com que contava na deportação no início de 1929, a Oposição havia caído, no final do mesmo ano, para contar com pouco mais de mil partidários (43). Trotsky escrevia a seus camaradas que, embora não ficassem mais que três, o essencial era que subsistissem a bandeira, o programa, o futuro.

A crise política da Oposição terminou embora continuassem os debates e se acrescentassem algumas capitulações isoladas à longa lista de 1929. Depois de que Radek e seus camaradas traçassem entre a Oposição e a fração estalinista no poder uma linha abjeta, Stalin traçaria uma linha de sangue.

 
Primeiros pelotões de execução

Um jornal parisiense da emigração branca foi o primeiro a ecoar os rumores concernentes à execução em Moscou, em dezembro, de Iakov G. Blumkin.

O homem era um personagem bolchevique legendário. Aos 18 anos, jovem militante socialista-revolucionário de esquerda, entrou para a Checa em Moscou. Em 1918, quando seu partido decidiu provocar por todos os meios o reinício da guerra com a Alemanha, fôra a este jovem chequista intrépido a quem foi confiada a missão chave da operação Blumkin; acompanhado por um de seus camaradas, apresentou-se, uniformizado e em nome da Checa, na embaixada da Alemanha e solicitou ser recebido pelo embaixador Von Mirbach. Sacando o revólver, matou-o à queima-roupa. Conseguiu escapar. Em seguida, capturado por seus camaradas da Checa, assumiu orgulhosamente a responsabilidade de seu ato terrorista. Foi, então, colocado frente a Trotsky que começou com ele uma discussão política ao final da qual o jovem homem se convenceu e solicitou que fossem admitidos os seus serviços para se redimir. Sua demanda foi atendida. A Blumkin, condenado à morte oficialmente – sua execução será, inclusive, anunciada às autoridades alemãs – foi outorgada a graça e colocado a serviço do Exército Vermelho e de seu nascente serviço de reeducação. Alvo de seus antigos camaradas, que tentaram mais de uma vez abatê-lo, converteu-se em herói legendário. Depois de várias missões perigosas, efetuadas durante a guerra civil na retaguarda do Exército Branco, realizou no estrangeiro, especialmente no Oriente Médio, muitas difíceis missões, organizou o exército da Mongólia, enviou artigos sobre a questão militar à imprensa soviética. A qualidade de seus serviços valeu-lhe ser admitido dentro das fileiras do partido bolchevique e pôde se destacar, na Intelligentsia moscovita, como herói simbólico por seu passado, pelas condições de sua entrada no bolchevismo, por suas atividades misteriosas e pela auréola que lhe outorgavam as histórias que se contavam dele em voz baixa.

Depois da guerra civil converteu-se em especialista de contraespionagem do Exército Vermelho, ligado por algum tempo ao estado-maior de Trotsky, a quem rendia um verdadeiro culto; trabalhou, inclusive, algum tempo em sua secretaria pessoal, ajudando-o na edição do primeiro volume dos “escritos militares”: “Como se armou a Revolução”. Estava, do mesmo modo, muito ligado a Radek. Desde 1923, foi partidário da Oposição de Esquerda, continuando sua atividade de contraespionagem na GPU. Em seguida ao XV Congresso e à exclusão da Oposição, teve um problema de consciência que apresentou aos seus superiores, Menjinsky e Trilisser (44), aos quais declarou que compartilhava inteiramente as idéias de Trotsky e de outros excluídos e queria fazer sabê-lo com total lealdade. Para eles, não era questão de se separarem de um agente desse calibre e, visto que ele não podia de modo algum, por suas responsabilidades profissionais, trabalhar com a Oposição, era evidente que devia conservar suas responsabilidades na GPU, na medida em que seus superiores depositavam nele, no plano profissional e pessoal, confiança total.

No verão de 1929, em seu regresso da Índia, Blumkin, de passagem por Constantinopla, encontrou-se com Sedov na rua. Procurou este encontro? Ignoramos. Em todo caso, solicitou ser recebido pelo exilado, o qual, depois de uma rejeição inicial, deixou-se convencer.

Não sabemos desta entrevista mais do que disse dela Trotsky: troca de informação, discussão sobre a situação da Oposição na URSS, as “capitulações” e, em particular, a posição de Radek. Parece que Blumkin quis colocar também para Trotsky a questão que já havia colocado para Menjinsky e Trilisser: sua concordância com a Oposição era compatível com sua atividade na GPU? A resposta de Trotsky está desprovida de ambigüidade. A GPU era o instrumento de defesa do Estado proletário e um oposicionista tinha nela um lugar de pleno direito: não havia nenhuma incompatibilidade. Ante a insistência de Blumkin, Trotsky aceitou enviar uma mensagem política geral destinada a seus camaradas da URSS que incluía um alerta contra Kharin e a instrução de não utilizarem na Alemanha a intermediação de Urbahns e do Leninbund, com os quais os desacordos cresciam.

Que aconteceu em Moscou depois do regresso de Blumkin em 15 de dezembro? Segundo o primeiro informe recebido por Trotsky, datado de 25 de dezembro de 1929, sob a assinatura de um responsável da Oposição de Esquerda (“N”, de acordo com o Biulleten) (45), Blumkin, ao chegar, foi ao encontro de Radek, ao que considerava ainda como um oposicionista, a fim de tomar conhecimento de sua posição. É fácil imaginar sua decepção durante o transcorrer da entrevista. Aconselhou-o Radek a voltar imediatamente à GPU para confessar tudo? Ou, como afirmaram versões posteriores à de “N”, telefonou imediatamente, sob conselho de Radek, a Ordjonikidzé, único personagem do regime capaz de respaldá-lo nessa circunstância, mas foi detido ao sair da casa de Radek, cujo telefone estava grampeado por espiões? Ou foi denunciado por uma mulher, como sugere uma versão recente sobre o assunto, sem que Radek haja desempenhado qualquer papel? Temos que esperar a abertura dos arquivos da GPU para conhecer a verdade sobre este ponto.

O que é seguramente verdade é que Blumkin – ao contrário dos rumores segundo os quais havia se arrependido e reivindicado pessoalmente sua execução – nem capitulou, nem “cantou”. Não existe nenhuma “declaração” de Blumkin, e não houve – a carta de “N” o confirma – prisões entre os militantes aos que Blumkin devia comunicar a mensagem de Trotsky, entre eles, o próprio “N”. Segundo Victor Serge, Blumkin havia solicitado e obtido a permissão para escrever suas memórias antes de ser executado e teria terminado seu manuscrito em 25 de dezembro (46).

Blumkin, em dezembro de 1929, não foi o primeiro militante da Oposição morto em mãos da GPU. Em setembro de 1928, um dos mais próximos colaboradores de Trotsky, o antigo secretário do comitê de guerra revolucionário, G. V. Butov, morreu na prisão de Butyrki, de Moscou, depois de uma greve de fome de 50 dias, para protestar contra as acusações de “espionagem”, das quais era objeto com o evidente objetivo de comprometer Trotsky. Em novembro, um operário da Oposição de Leningrado, trabalhador da fábrica Triângulo Vermelho, Albert Heinrichsohn, morrera na prisão de Leningrado depois de ser surrado (47). Estes fatos foram graves, conhecidos e denunciados, mas podem ser no máximo considerados como “excessos”, certamente trágicos, mas involuntários. A morte de Blumkin, no entanto, foi friamente planejada.

Nos meses seguintes produziram-se outros casos concernentes à execução de membros da GPU mais ou menos ligados à Oposição ou comprometidos com ela. Foi o que aconteceu com o chamado caso Rabinovitch-Silov, que foram executados no início de 1930 sob uma pretensa acusação de “sabotagem nas estradas de ferro”. Rabinovitch era um jovem oficial da GPU; Silov, um jornalista sem partido, que havia informado à Oposição sobre a prisão e execução de Blumkin. Falava-se, também, na mesma época, da execução de um dos carcereiros de L. S. Sosnovsky, acusado de ter servido de intermediário a este prisioneiro do Estado. Stalin havia condenado Sosnovsky a um isolamento rigoroso. A qualidade de polemista que o caracterizava, sua sólida reputação de combatente antiburocrático e antikulak, o nível de seus ataques contra os capituladores, exigiam que fosse reduzido ao silêncio. Apesar disto, suas cartas saíam e ele recebia comunicações políticas, incorporou-se, inclusive, como “redator-chefe” de um periódico de prisão que publicava informações que provinham de Moscou. Tal atividade não era possível sem uma rede clandestina que agisse com a cumplicidade de membros no próprio seio da GPU.

Tentou-se explicar o assassinato de Blumkin pelo desejo de Stalin de golpear pessoalmente a Trotsky. Os fatos mencionados acima fazem duvidar dessa explicação. Parece mais provável que Stalin tenha querido dar um golpe definitivo às simpatias ativas que a Oposição encontrava então no seio da GPU – e das quais dá prova uma carta de Moscou dirigida a Trotsky – porque, afinal, ali havia grande número de militantes bolcheviques abnegados e entusiastas. A execução de agentes da GPU, adeptos da Oposição de Esquerda, traçou entre o regime e a Oposição uma linha de sangue, demonstrando claramente a intenção de Stalin de submeter a GPU a sua vontade política e de fazer dela o instrumento cego do qual tinha absoluta necessidade para quebrar a Oposição por meio da provocação e da violência repressiva simultaneamente.

Provocação policial generalizada

A GPU devia ser um instrumento de uma docilidade total porque era com ela que Stalin contava para quebrar e destruir definitivamente a Oposição. Um dos principais meios utilizados, a partir desta época, foi a provocação, a utilização de agentes da GPU infiltrados nas fileiras da Oposição, inclusive “devolvidos” depois de uma interpelação ou de uma prisão.

Nada temos evidentementemente além de alguns poucos documentos concernentes a este tipo de assunto cuja prova definitiva não se encontrará nunca, a não ser nos arquivos da polícia hoje a serviço do poder. Mas temos, não obstante, certo número de indicações que constituem outras tantas presunções. E, em primeiro lugar, porque neste período, Stalin, que esperava resultados mais rápidos e superestimava sem dúvida, também, seus próprios procedimentos, trabalhava no curto prazo e queimava agentes e homens que teria podido aproveitar como agentes no longo prazo, com a vã esperança de assestar um golpe definitivo na Oposição – como o faria por outro lado na Internacional, pelo menos até 1933. Tanto é assim que, em 1929, lançou muitas cartas. Em Moscou, se acreditarmos em Victor Serge, um dos principais colaboradores de Boris Eltsin no “centro” era um tal de Mikhail Tverskoy, cujos panfletos incendiários e denúncias permitiram deter centenas de quadros e de militantes (48). Parece que, sempre de acordo com Serge, ele levou a frente um jogo idêntico em Leningrado em 1930 (49). Em 1929, em Paris, Salomon Kharin (“Joseph”), ganhado pelos argumentos de Radek em favor da capitulação, aceitou desempenhar o papel de informante da GPU, à qual enviava endereços e documentos, em especial o manuscrito integral do primeiro número do “Biulleten Oppositsii”. Sua traição não impediu o aparecimento do boletim, mas serviu para desmascarar um homem que Stalin gostaria de conservar no entorno de Trotsky para se informar.

Os correspondentes do Biulleten insistiam em suas cartas sobre o fato de que a condução de deportados ao exílio estava cada vez mais repleta de agentes, deliberadamente enviados, ou de deportados autênticos que haviam aceitado no transcorrer dos interrogatórios desempenharem o papel de provocadores ou de informantes para “se redimirem”. Os mais perigosos eram evidentemente os velhos bolcheviques, dos quais ninguém se atrevia suspeitar. Muitas testemunhas mencionam o papel desempenhado em Verkhneuralsk por um deles, Surnov, antigo Comissário do Povo da Saúde na República da Criméia, que compartilhou durante algum tempo a cela de Solntsev que conseguiu desmascará-lo (50). Ciliga contava igualmente que, pouco antes de sua libertação, foi objeto de demandas por parte de outro agente provocador, também antigo bolchevique, Artuk Solovian, que insistia para que mandasse uma mensagem destinada a Sedov e, sobretudo, para que este último lhe enviasse “diretrizes” (51).

 
A situação da Oposição em 1930

Foi uma Oposição de Esquerda quase renovada a que emergiu em 1930 de sua crise de 1929, em condições de repressão infinitamente agravadas. A maioria dos “antigos bolcheviques”, incluídos aqueles da Oposição de 1923, entre os quais alguns de seus mais prestigiados defensores, havia-a abandonado, convertendo-se, como Radek e Piatakov, em seus inimigos decididos, ou, como Ivan N. Smirnov ou Mratchkovsky, em homens desgastados que não se sentiam com forças suficientes para continuar uma luta pela qual mostravam, contudo, simpatia.

Não obstante, seria um erro acreditar que todos os velhos desapareceram. Permaneciam na Oposição pelo menos três figuras históricas de primeira ordem: Rakovsky, Sosnovsky e Muralov.

Rakovsky tinha, então, 57 anos. Nascido na Romênia havia percorrido a Europa, conhecido todos os dirigentes da II Internacional, combatido durante a guerra no núcleo internacionalista. Depois de 1917, quando se uniu aos bolcheviques, foi presidente do Conselho de Comissários do Povo da Ucrânia durante a guerra civil, em seguida “exilado” como embaixador, depois de haver sido, desde 1923, um dos líderes da Oposição de Esquerda. Deixou na Ucrânia numerosos seguidores e a lembrança de sua luta contra a russificação. Foi o porta-voz da Oposição no XV Congresso – para os oposicionistas era o porta-voz de Trotsky, a quem se ligava por uma velha amizade. Depois da declaração de agosto de 1929, foi transferido para Barnaul, onde suportou um frio mortal para seu organismo de cardíaco. Pensava-se que nada poderia fazê-lo retroceder e que Stalin buscava fazer com que morresse sem ter que matá-lo.

L. S. Sosnovsky tinha 44 anos. Era um velho bolchevique de 1903 que também havia conhecido a prisão, a deportação e a emigração. Era um grande jornalista, muito popular, campeão, desde a época de Lênin, da luta contra a burocracia e os kulaks na Pravda e em Bednota, especializado na denúncia das práticas dos burocratas do partido. Foi membro do núcleo da Oposição desde 1923 e se distinguiu em 1928 e 1929 pela violência de seus ataques contra os capituladores. Stalin queria calá-lo, silenciar sua pena irredutível. E o conseguiu: nenhuma notícia de Sosnovsky se filtrou desde o momento em que fugiu vivo da cela de Tomsk, destinada a servir-lhe de túmulo.

N. I. Muralov era também, aos 53 anos, um herói legendário. Este filho de camponeses, agrônomo, era também um bolchevique de 1903. Este gigante foi um dos dirigentes da insurreição de 1905, quando foi perseguido pelo assassinato de um militante progomista das “centúrias negras”. Em 1917, foi ele quem comandou em Moscou os Guardas Vermelhos que tomaram o Kremlin de assalto. Membro do Estado Maior de Trotsky durante a guerra civil foi comandante militar da região de Moscou, em seguida inspetor-geral do Exército Vermelho. Também foi membro do núcleo da Oposição de Esquerda desde 1923, um dos mais próximos a Trotsky.

Estes três velhos bolcheviques eram muito conhecidos. Mas havia também em 1930, nas fileiras da Oposição outros militantes de sua geração que simplesmente eram menos conhecidos no estrangeiro. Em primeiro lugar, o núcleo dos comunistas georgianos comprometidos desde 1922 na luta contra Stalin. Koté M. Tsintsadzé tinha 43 anos. Não tinha mais de 20 anos quando teve que viver durante meses em Tíflis no sótão onde os bolcheviques haviam instalado sua gráfica clandestina. Conheceu prisões e presídios. Foi dirigente da Checa, logo convertida em GPU, na Geórgia reconquistada. Estava tuberculoso e sua saúde não deixava de se agravar. Helena Tsulukidzé, “Lola”, estava, também ela, tuberculosa. Lado Dumbadzé, outro bolchevique georgiano da época heróica, antigo presidente do sovíete de Tíflis, gravemente ferido durante a guerra civil, encarcerado em isolamento total durante quase dois anos, estava em vias de perder o uso de seus dois braços. Entre os velhos comunistas georgianos – depois da capitulação de Okudjava e Mdivani – estavam na prisão Vasso Donadzé, antigo membro do Comitê Central, Zivzitadzé, antigo adjunto de Tsintsadzé, os dois irmãos deste último e dezenas de outros que não são para nós mais que nomes. Lado Enukidzé era, em 1927, aluno da academia militar, um dos melhores quadros do Exército Vermelho: este alto oficial, que voluntariamente custodiou a Trotsky em seu apartamento, recebeu durante a deportação pacotes de seu tio Avelii, secretário do executivo dos Sovíetes (52). Otto Khristianovitch Aussem, filho de um professor, membro do partido em 1899, responsável durante muito tempo da organização militar clandestina, cônsul em Paris em 1924, e seu irmão Vladimir, antigo soldado na Ucrânia, eram velhos amigos de Rakovsky. Fala-se muito pouco deles.

Pelo contrário, dois nomes aparecem logo sob a pluma de Trotsky no início dos anos 1930, os de Grunstein e Kasparova, que conhecemos menos, mas que parecem ter uma auréola de “velhos bolcheviques”. Karl E. Grunstein pertencia à velha geração; foi militante do partido social-democrata letão, onde era um firme aliado dos bolcheviques, em seguida bolchevique, passando anos na prisão e na deportação. Durante a guerra civil, comandou uma divisão e gozou da estima de Trotsky, a quem esteve pessoalmente ligado desde a época da batalha de Kazan, onde esteve ao seu lado. Depois da guerra, dirigiu a escola de aviação militar e assegurou o secretariado da sociedade dos antigos presidiários. Coberto de condecorações foi com Muralov um dos poucos militantes políticos que se converteram em militares reconhecidos por seus pares “profissionais”. Esteve com a Oposição de Esquerda desde 1923, referendou, em 1929, a declaração de Rakovsky. Foi deportado a Cherdyn com sua mulher Revecca e um filho. Verônica S. Kasparova tem igualmente um longo passado como militante. Bolchevique desde 1904, depois figura na seção “mulheres” da Internacional. Foi deportada com seu filho, igualmente membro da Oposição desde 1923. Assinou também a declaração de abril de 1930, depois de haver apoiado a de agosto de 1929.

Boris M. Eltsin não tinha mais que 55 anos, mas era considerado por todos como um “velho”. Bolchevique em 1903 foi dirigente do partido e dos sovíetes no Ural em 1917, membro do executivo dos sovíetes em outubro. Em 1923 foi um dos assinantes da famosa “declaração dos quarenta e seis”, ponto de partida da Oposição, e, em seguida, um dos dirigentes da Oposição de Esquerda, um dos redatores da plataforma de 1927. Em 1928 e durante a primeira metade de 1929 dirigiu, em Moscou, o “centro” clandestino. Detido, foi enviado a Suzdal, a uma prisão insalubre – antigo monastério – em isolamento total, sofrendo uma grave enfermidade, tuberculose óssea ou meningite cérebro-espinhal. Quando Stalin lhe propôs “negociações”, respondeu que estava disposto com a condição de que Trotsky voltasse do exílio e que os bolcheviques-leninistas fossem autorizados a realizar uma conferência.

Vassili V. Kossior era um “velho” mais jovem, 39 anos, operário metalúrgico, bolchevique de 1907, antigo instrutor de metais, delegado aos IX, X e XI Congressos do partido, primeiro membro da tendência “decista”, logo unido novamente à Oposição de Esquerda com um grupo de militantes. Seu irmão Stanislav era nessa época um dos homens de confiança de Stalin (53).

Alguns homens pertenciam à geração intermediária. Fiodor N. Dingelstedt entrou no partido em 1910. Em fevereiro de 1917, foi membro do comitê bolchevique de Petrogrado e delegado pelo mesmo para organizar o partido entre os marinheiros da base de Cronstadt. Foi um dos primeiros diplomados do Instituto dos professores vermelhos, membro da Oposição de Esquerda desde sua constituição em 1923. Convertido em diretor do Instituto Florestal de Leningrado, obteve uma licença que lhe permitiu viajar a Londres e escrever ali um livro sobre A Questão Agrária na Índia, publicado em Moscou em 1927. Foi deportado, sucessivamente, a Kansk, em seguida a Rubtsovsk (54). Era um dos dirigentes mais conhecidos no exílio por sua firmeza. Victor Serge escreveu que “seu rosto, em sua fealdade inspirada e golpeada, expressava uma invencível obstinação” (55). Nada conhecemos da carreira militante de Andreii Konstantinov, militante bolchevique desde 1916, salvo seu admirável retrato traçado, anos depois de sua morte, por sua companheira de deportação, Maria M. Joffé (56).

O grosso da Oposição e de seus quadros de 1930 estava formado por homens e mulheres ainda jovens, a geração de 1917. Em sua maioria estas pessoas eram operários, estudantes secundaristas, quando aderiram ao partido nesse ano de 1917 e combateram nos anos da guerra civil como soldados ou como comissários políticos. Estes jovens – a flor e a nata do partido bolchevique – reencontraram-se depois de 1920 nas faculdades operárias, as rabfaki, e foram os quadros desta juventude estudantil-operária que nutriram o grosso da Oposição de 1923. Alguns deles estiveram entre os mais brilhantes e melhores alunos deste Instituto de Professores Vermelhos, cujo objetivo era o de reunir a elite dos jovens quadros bolcheviques, a fim de formá-los em todos os domínios da investigação política e social. Eram, no fundo, muito representativos desta camada social original nascida da revolução de Outubro, a “intelectualidade operária” muito conhecedora da técnica e da construção econômica, ao mesmo tempo em que apaixonadamente a serviço da revolução mundial.

Muitos destes jovens foram detidos e deportados ao mesmo tempo em que a maioria dos “velhos”: eram os que estiveram ligados a Trotsky, ao seu secretariado, ou foram dirigentes da Oposição de Esquerda. É o caso dos “secretários” Igor M. Poznansky, colaborador de Trotsky desde 1917, organizador da cavalaria vermelha; de N. Palatnikev, um “professor vermelho”; de Nikolai M. Sermuks e de Nikolai Netchaiev, ambos do estado-maior do famoso trem blindado. Victor E. Eltsin, que era filho de Boris Mikhailovitch, uniu-se ao partido em 1917, presidiu em 1918 o sovíete de Viatsk, em seguida foi comissário político de uma divisão do Exército Vermelho durante a guerra civil. Diplomado pelo Instituto dos professores vermelhos em 1926, como economista, colaborou na edição das Obras de Trotsky. Igualmente Grigori Stopalov, recrutado no colégio em 1917, organizador clandestino dos bolcheviques da Ucrânia – território sob a bota de Denikin; diplomado pelo Instituto dos Professores Vermelhos em 1922 e casado com uma educadora da escola do partido, Lembergskaia (57).

A biografia de Sokrat Guevorkian é quase idêntica: filho de um operário do petróleo de Baku, organizador de sindicatos durante a guerra, excluído, por sua atividade, da escola secundária, aderiu ao partido em 1917, participou na guerra civil, em seguida estudou em Moscou na rabfak, ensinou mais tarde teoria de economia política. “Velho” oposicionista, parece que foi detido em 1928 (58) e que havia acompanhado Smirnov durante algumas semanas no verão de 1929. Vassili F. Prankatov era um antigo marinheiro de Cronstadt, membro da delegação que chegou, no momento do putsch de Kornilov, para se encontrar com Trotsky em sua prisão e com Kerensky em seu palácio. Durante a guerra civil, serviu na Checa e logo veio a ser chefe-adjunto da GPU na Transcaucásia. Foi detido pouco depois em janeiro de 1930 (59). Kh. M. Pevzner era também um homem de Outubro, veterano da guerra civil, na qual foi oficial e onde perdeu o uso de um braço. Trabalhava no Comissariado do Povo das Finanças e esteve implicado em 1927 no caso da gráfica (60). Segundo um manuscrito samizdat, recentemente publicado no estrangeiro, teria sido o genro do chefe da GPU, Iagoda (61). De fato, parece que esteve casado com sua neta. Sua jovem mulher estava tuberculosa. Grigori Ia. Iakovin era, também ele, diplomado do Instituto dos Professores Vermelhos. Era historiador, especialista da história contemporânea da Alemanha, onde havia vivido e sobre a qual havia publicado um bom livro. Victor Serge o descreveu: “Trinta anos, desportista, inteligente, sempre desperto, bonito rapaz, ardente e voluntarioso”. Evoca seu período de “ilegalidade engenhosa, audaz e arriscada” (62) em Moscou. Seu papel no “centro” foi importante. Eleazar Solntsev, aos trinta anos, era considerado com um dos homens melhor dotados de sua geração. Economista, funcionário do comércio exterior na Alemanha, em seguida nos Estados Unidos, foi chamado em 1928 e detido no seu regresso (63). Citemos também os dois genros de Trotsky: Man Nevelson, o marido de Nina, era estudante secundarista em 1917 quando organizou as Juventudes Comunistas e em seguida os Guardas Vermelhos. Comissário político do Exército Vermelho, era em 1920 chefe do departamento político do V Exército e se reconverteu em economista (64). Seu primo Platón I. Volkov, marido de Zinaida, era professor: foi detido pouco depois.

O caráter disperso das mensagens e das lembranças não nos deixou mais que longas listas e, às vezes, indicações de ordem pessoal. As três irmãs Chumskaia eram militantes de 1917, como Mussia Magid, que organizou os soldados na retaguarda de Denikin, assim como o antigo dirigente das Juventudes Comunistas da Ucrânia, Iakov Byk, bem como os soldados siberianos Aaron, Samuel e Pavel Papermeister. Leonid Guirchek, antigo representante comercial na Pérsia; Vassili M. Tchernykh, antigo comissário do Exército Vermelho e antigo chefe da Checa do Ural; e Mikhail A. Polevoi não são para nós mais que nomes que ficaram na memória de Serge e conservados nos cadernos do exílio (65). Encontramos uma menção a estudantes-operários ainda mais jovens: Karlo Patskachvili (66), filho de camponeses pobres da Geórgia, estudante em Moscou; Karl Mesnais, dirigente das Juventudes Comunistas em 1926 e estudante de Matemática; Sacha Milechin, também de Moscou; Faina Upstein, de Odessa, recrutada em 1927, detida em 1932. Alguns dos correspondentes de Trotsky e Sedov, até de Rakovsky, são, sem lugar para dúvidas, quadros políticos dos quais não sabemos quase nada, começando por L. Trigubov, um antigo de Kiev, mas também os jovens A. Abramsky e N. I. Mekler, de Kharkov, G. M. Bagratov, Pavel I. Golubtchik, I. Ia. Kievlenko, V. Sidorov. Seria necessário, por outro lado, consagrar um estudo especial aos estrangeiros que, entre os prisioneiros, eram às vezes grupos inteiros de responsáveis, de refugiados, até de estudantes chineses, iugoslavos, búlgaros, austríacos, italianos.

Ciliga forneceu elementos estatísticos sobre a população do “cárcere de isolamento” de Verkhneuralsk (67): somente 15% de operários, como gosta de sublinhar, uma maioria de jovens intelectuais judeus, originários, sobretudo, da Ucrânia e da Bielorússia (47%), muitos georgianos e armênios (27%), entre os quais havia uma forte proporção de camponeses, 39% de russos, onde predominavam, diz ele, militares e chequistas. O número total de detidos no cárcere de isolamento parece-nos, não obstante, escasso para elaborar uma estatística e generalizar as conclusões. Os arquivos de Trotsky aportam alguns elementos suplementares: dos 378 deportados registrados em 1928 com nome e lugar de origem, 66% foram detidos em Moscou e 10% em Kharkov. Uma avaliação dá mais de 20% de judeus, de 7 a 8% de armênios e outro tanto de georgianos. Podemos notar igualmente que não se pode reduzir a intelectualidade operária à categoria curiosamente definida por Ciliga como a dos “intelectuais judeus”. Os dados oferecidos pelos correspondentes de Trotsky mencionam um número elevado de operários detidos por atividades oposicionistas. Os dados proporcionados em 1936 por Serge conduzem, por outro lado, ao questionamento sério das afirmações de Ciliga sobre a proporção dos operários entre os oposicionistas aprisionados. Mikhail Bodrov, o antigo correio da Oposição em Alma-Ata, era um operário metalúrgico de Moscou. Em Orenburg encontravam-se, ao mesmo tempo em que Serge, Alexis A. Santalov, antigo torneiro de Leningrado, combatente de 1905 e 1917, o armador de Leningrado Trukhanov, o alfaiate de Minsk Boris I. Lakhovitsky, o curtidor [de couros, Nota do Tradutor] ucraniano Iakov Byk e muitos outros (68). Sabemos por Maria M. Joffé que o “estudante” Patskachvili havia chegado descalço a Tiflis para tentar a aventura que o levaria em alguns anos à universidade sem haver freqüentado antes a escola secundária (69).

Tal é, resumidamente, a imagem dos membros desta Oposição de Esquerda, dos quais o grosso, a partir de 1930, se concentrava essencialmente nos “cárceres de isolamento”: estes homens e mulheres estavam condenados a sobreviver nas piores condições materiais e morais até o momento final, com a bala na nuca ou sob a rajada de metralhadora.

 
A vida política da Oposição

A Oposição unificada, bloco de tendências e de frações, havia conhecido desde o seu nascimento e antes de ser posta fora da lei, vivos debates internos. O mais importante havia oposto o núcleo de 1923 ao grupo chamado de “centralismo democrático”, os “decistas”, impulsionado por Vladimir M. Smirnov e Timofei V. Sapronov (70) que haviam logrado influenciar alguns bolcheviques como Radek ou Nin em torno da análise sobre a natureza social do Estado e do partido e a necessidade de se lutar por um “segundo partido”. O eco desta velha discussão se manifestava ainda nos novos problemas debatidos pela Oposição de Esquerda em 1930.

Sobre este assunto dispomos depois de várias décadas de um importante testemunho, o de Ante Ciliga. A abertura dos “cadernos do exílio” permite corrigi-lo no que tinha de parcial e, ao mesmo tempo, completá-lo vantajosamente graças aos informes dos bolcheviques-leninistas Iakovin e Ardachelia (71).

Estes dois textos essenciais – e alguns outros de menor importância – permitem fazer uma idéia precisa da vida política em uma das prisões reservadas aos “bolcheviques-leninistas”, o “cárcere de isolamento” de Verkhneuralsk onde estiveram encerrados, a partir de 1930, entre 200 e 250 detidos, dos quais 120 se reivindicavam da Oposição de Esquerda.

O quadro é indiscutível, apesar das condições materiais mais que medíocres, visto que os locais estavam superpovoados, o “cárcere de isolamento” era uma verdadeira “universidade de ciências sociais e políticas”: “a única universidade independente da URSS”, precisa Ciliga (72). Os detidos podiam se comunicar entre si, publicar diários manuscritos onde os artigos, assinados, não eram submetidos a nenhuma censura, onde debatiam suas divergências, abordavam as questões teóricas e de atualidade, “da maneira mais franca, pondo todos os pontos sobre os is”. Os diversos agrupamentos políticos desta prisão eram “verdadeiras organizações, com seus comitês, seus diários manuscritos, seus chefes reconhecidos”. Funcionavam mediante reuniões regulares no transcurso de passeios e até em aulas, com escritório, ordem do dia, processos verbais. Havia uma administração dos “correios” que estabelecia, por conta de todos, relações internas e externas não somente com a URSS, como também com o estrangeiro, especialmente através das transferências feitas a outras prisões. A biblioteca estava relativamente nutrida, os jornais que se publicavam na URSS estavam disponíveis se alguém se inscrevia, bem como as publicações dos Partidos Comunistas estrangeiros. Os laços políticos se mantinham de forma permanente. Ciliga dá conta da chegada às mãos dos prisioneiros de Verkhneuralsk de exemplares do Biulleten Oppositsii e de folhetos de Trotsky até 1934, porque os detidos, dizia ele, tiveram pelo menos a possibilidade de discutir a entrada dos trotskistas franceses na SFIO durante aquele ano (73).

O grande debate entre os trotskistas de Verkhneuralsk começou no final de 1929 e se desenvolveu durante todo o ano de 1930, quando a chegada de 50 detidos novos elevou a mais do dobro a quantidade dos efetivos bolcheviques-leninistas, e amontoou os homens de tal modo que tornou impossível impedir-lhes a comunicação. A discussão começou sob o signo do “ano negro” e das grandes ondas de capitulações. Depois das últimas capitulações, no caso de um grupo de estudantes moscovitas no início de 1930, os golpes que se seguiram àquela onda passaram, a partir de então, a primeiro plano.

Um pequeno grupo de militantes animado pelos “velhos” – o georgiano G. Kvachadzé, o armênio Amo Saakian, o veterano do Exército Vermelho Vl. I. Rechetnitchenko – tentava extirpar das fileiras da Oposição as raízes que haviam conduzido à capitulação tantos de seus partidários. Denunciavam, acima de tudo, o que chamavam de tendências “conciliadoras”, e, finalmente, o estado de ânimo que havia conduzido à redação da declaração de agosto de 1929. Durante os primeiros dias de janeiro estes homens publicaram o primeiro número do diário Bolchevique Militante, onde uma declaração de Amo Saakian se desvinculava de Rakovsky e de sua declaração. O diário desenvolvia sistematicamente a proposta, tomada de Trotsky, segundo a qual a Oposição de Esquerda devia dali em diante não se dirigir ao comitê central e ao partido, e sim à própria classe operária. Rapidamente a direção passou a uma equipe de jovens militantes: O. Puchas, M. Kamenestsky, Ia. G. Belinsky, N. Perevertsev, Emelianov; todos pareciam aproximar-se consideravelmente das posições dos “decistas”, aos quais o último da lista, enfim, se uniu. A idéia central dos “bolcheviques militantes” era, por um lado, que, nesse momento, não se podia reformar o partido e que nenhuma “virada à esquerda” era, por outro lado, possível por parte da burocracia. Trotsky era apresentado como ocupando uma posição de princípios firme, enquanto que Rakovsky manobrava e tentava a conciliação com o aparato. O Bolchevique Militante viu a prova disto quando, em maio, começou a se falar de uma nova declaração de Rakovsky no Congresso.

À maioria custou-lhe definir-se ante os ataques procedentes da “esquerda”. Sua primeira reação foi a de abrir por sua conta o próprio debate nas páginas de uma revista modestamente intitulada de Resumos sobre o período atual; apareceram três grossos números entre janeiro e outubro com artigos assinados que tratavam sobre as questões econômicas, políticas e táticas. Seu objetivo, escrevia Ardachelia, era o de “esclarecer os problemas da época”. O restabelecimento do contacto com o exterior facilitou a tarefa: o “conjunto bolchevique-leninista” logrou enviar cinco cartas à direção clandestina da fração na URSS e recebeu cinco respostas, bem como uma dezena de cartas e documentos escritos pelos “dois velhos”, Trotsky e Rakovsky (74).

Em junho de 1930, a discussão havia amadurecido o suficiente para que fosse possível se tentar fazer um balanço. Os dirigentes da maioria – a qual Ciliga denominava de “a direita” – decidiram elaborar teses. Estas seriam as “Três Teses”, redigidas por três dos jovens dirigentes da Oposição: Iakovin, Solntsev e Stopalov (75). Sua análise da situação na URSS era a mesma que a de Trotsky. Reconheciam a existência da “crise do bloco de centro-direita”, do conflito que estava no limite entre estalinistas e direitistas, mas sublinhavam que se tratava somente de “uma luta administrativa do aparato para o enfrentamento das conseqüências de sua própria política econômica”, “destinada ao fracasso” e que “impulsionava todos os camponeses para o lado dos kulaks”. Para eles, as “viradas bruscas à esq uerda”, episódicos e forçosamente limitados, pagavam-se, por outro lado, a um preço muito elevado: o esmagamento da vida política do partido, o estrangulamento da esquerda e o aniquilamento das aspirações operárias que ela encarnava. Sublinhavam o caráter “irracional” do plano qüinqüenal, burocrático, e afirmavam que era impossível construir o socialismo separando-se de sua base social, a classe operária, e que isto era o que reconhecia o plano qüinqüenal.

Algumas semanas mais tarde, sob a iniciativa de Man Nevelson e Aaron Papermeister, foram redigidas outras teses de uma corrente que Ciliga batizava de “centro”. A divergência descansava na política econômica. O texto dos “dois” se pronunciava pelo restabelecimento da NEP, ou seja, de relações puramente de mercado com o campesinato que os “três” não acreditavam possíveis. Poznansky, em seguida Dingelstedt, que chegou de Rubtsovsk, uniram-se às posições do “centro”.

No início de 1930 o grupo Bolchevique Militante elaborou suas próprias teses, das quais infelizmente não conhecemos até o momento mais que os extratos citados por Iakovin e Ardachelia. Para este, a URSS havia se convertido em um freio ao desenvolvimento do movimento revolucionário mundial, e não era possível, então, fazer-se uma frente única sequer com um setor da burocracia. As teses excluíam toda possibilidade de virada à esquerda e se pronunciavam pela “reforma do Estado através da ação direta das massas”. Os “bolcheviques militantes” constituíam, em suma, uma “oposição” à direção da Oposição, esta “direita bolchevique-leninista” da qual pensavam que estava comprometida em uma via que levava à capitulação. Pretendiam ser a encarnação do “bolchevismo militante ortodoxo”. Com efeito, como assinalava Ardachelia, situavam-se em algum plano entre os Bolcheviques-leninistas e os “decistas”.

A maioria havia avançado no curso desta discussão. Em maio, somente sessenta detidos haviam dado o seu consentimento para assinar a declaração de abril de Rakovsky, enquanto que quarenta e sete colocavam-se nas posições dos “Bolcheviques Militantes”. Mas as dificuldades na elaboração das teses destes últimos três meses, a chegada das cartas de Trotsky em contradição com as idéias que defendiam, provocaram uma primeira ruptura, aquela dos sete promotores da corrente. Quando se conheceu o texto da declaração de abril, vinte militantes dos quarenta e sete que a tinham rejeitado uniram-se à mesma. Em sua chegada de Rubtsovsk, Dingelstedt, Abramsky e Antonolsky uniram-se à maioria, mas sustentavam também a necessidade de fazer desaparecer os organismos competitivos surgidos das duas frações do “conjunto”. A partir desta posição, a maioria decidiu publicar A Pravda na Prisão – todos os meses ou a cada dois meses, sob a forma de artigos impressos em cadernos – enquanto que o Bolchevique Militante recusava-se a desaparecer. A existência de dois órgãos que se reivindicavam ambos do “conjunto bolchevique-leninista de Verkhneuralsk” conduziu fatalmente à cisão que se produziria finalmente em 1931.

Os documentos emanados dos partidários da maioria – Ardachelia e Iakovin – referem-se exclusivamente à primeira parte do ano de 1930. Para os anos seguintes, não dispomos de nada novo além do testemunho, muito unilateral, de Ciliga. Partidário da “esquerda” – um direito que, aparentemente, ninguém lhe questionou – fornecia uma imagem de seus adversários absolutamente caricata, falando do “espírito de submissão aos chefes”, dizendo que se tratava de “um apoio à política oficial com ‘crítica de seus métodos’, cujo único objetivo era ‘a reforma por cima’” – e insistia pesadamente e um pouco demagogicamente sobre o fato de que os líderes das outras tendências haviam surgido do Instituto dos Professores Vermelhos (76). É importante, então, tomar com prudência seus resumos dos fatos e seus juízos de valor, mas tendo em consideração a utilidade de algumas das indicações que fornecem.

Menciona, por exemplo, o grande interesse que a situação alemã despertou entre os detidos que acompanhavam cotidianamente seu desenvolvimento em Die Rote Fahne [Bandeira Vermelha, o órgão do Partido Comunista Alemão – Nota do Tradutor], sobre as longas discussões que sustentavam sobre o fascismo, a clara consciência que tinham do que estava em jogo na Alemanha e, este fato confirma, involuntariamente sem dúvida, a homogeneidade desta posição na prisão e sua concordância fundamental com as posições que Trotsky defendia no exílio (77). Torna-se difícil acreditar nele quando afirma que havia “pânico” entre os trotskistas de Verkhneuralsk ante o anúncio da chegada de Hitler no poder (78). Pode-se, não obstante, supor que esses militantes que tinham uma análise correta da dimensão dos acontecimentos compreendiam o significado que tinha para o proletariado mundial e, por conseqüência, para eles mesmos. Notemos somente que se aproveita de passagem para situar ao seu camarada de prisão, o genro de Trotsky, Man Nevelson, entre os “patriotas um pouco cansados de nosso Estado soviético” (79). Assegura que, em 1933, depois da vitória de Hitler, os “decistas” se pronunciaram pela IV Internacional e que foram acusados pelos “bolcheviques militantes” de lançar uma palavra de ordem “prematura” e “demagógica”, enquanto que a Pravda na Prisão mantinha, sem insistir demasiado, as posições tradicionais. O assunto foi, de toda forma, resolvido com a chegada à URSS e ao “cárcere de isolamento” do Biulleten Oppositsii que convenceu a todos os bolcheviques-leninistas que havia chegado o momento de abandonar o combate de “oposição” no caminho da “reforma”, e que agora havia que se construírem novos partidos e a IV Internacional. Rapidamente se estabeleceu a unidade entre os bolcheviques-leninistas (80).

Seria, contudo, um erro ater-se completamente ao quadro algo restrito e ligeiramente deformado de Ciliga e imaginar a vida política da Oposição, no início dos anos 1930, em todos os lugares com as mesmas características que em Verkhneuralsk. Nos outros locais, havia outras discussões que tinham o seu próprio ritmo.

Em primeiro lugar, alguns debates sobre fatos pontuais. Sabe-se que, em geral, os bolcheviques-leninistas se dividiram em torno ao “processo Chakhty”, do qual alguns aceitavam sua autenticidade e outros denunciavam a fabricação e maquinação montada, segundo eles, entre Stalin e o acusado principal, Ramzin (81). Os dias seguintes à declaração de 29 de agosto e as semanas que precederam abril de 1930 foram consagradas a uma correspondência entre as colônias que cobria todos os problemas políticos.

Discussões apaixonadas em torno à coletivização e à industrialização se desenvolveram depois de 1929. Ao lado dos céticos que não viam, no melhor dos casos, nesta política mais que uma “manobra em zig-zag”, que precedia a uma inevitável virada à direita, outras interpretações se puseram na ordem do dia. Rakovsky, correntemente considerado como cético em relação às conseqüências sócio-econômicas da industrialização e da coletivização, apresentou, não obstante, a hipótese de que estas constituíam para a burocracia um meio de aumentar seu poder e seus privilégios, visto que ampliavam suas bases econômicas e sociais.

Em 1930, como um ressurgir dos argumentos de alguns capituladores de 1929, reaparece a teoria segundo a qual a industrialização e a coletivização teriam como conseqüência – automática – reforçar o “núcleo proletário” do partido, comprometendo definitivamente, cedo ou tarde, a este último na via da reforma. Era o que dizia Okudjava, criticado por Tsintsadzé (82), e a quem Trotsky honrou com uma menção crítica de passagem. Se, aparentemente, esta idéia não encontrava quase nenhum eco nas fileiras da Oposição de Esquerda auto-depurada, parece que as teses de Rakovsky sobre uma necessária volta à NEP, como forma concreta da “retirada” preconizada por todos, dividiram profundamente suas fileiras.

Muito rapidamente, e como acontece em todo o mundo no seio e âmbito próximos a um movimento comunista em crise, apareceram teorias “revisionistas” que os bolcheviques-leninistas debateram com seriedade. A partir de 1930, alguns deles defenderam e desenvolveram a teoria, já exposta por alguns “decistas” e, sobretudo, pelos mencheviques, segundo a qual o Estado russo seria considerado não mais como um Estado operário, e sim como um “capitalismo de Estado”. Foi um economista de Kharkov, Vladimir Densov, antigo alto funcionário do Gosplan (83), quem defendeu esta tese em 1931 nas fileiras da Oposição. Outros rejeitaram esta interpretação que colocava, evidentemente, em questão as próprias bases do programa e da organização da Oposição. Viam, não obstante, a possibilidade de uma evolução deste tipo no futuro mais ou menos próximo.

Naturalmente, uma das discussões principais mais concretas e ao mesmo tempo mais difíceis no plano teórico, pelo fato de sua total novidade, foi a que se colocou em 1930 sobre a questão da natureza de classe do Estado soviético e, portanto, da natureza de classe da burocracia. Em sua declaração de abril de 1930, referendada por Kossior, Muralov e Kasparova, Chistian Rakovsky escreveu:

“Do estado proletário com deformações burocráticas – como Lênin definia a forma política de nosso Estado – avançamos para um Estado burocrático com sobrevivências proletárias comunistas” (84).

Algumas linhas adiante, ele definiria a burocracia como “uma grande classe de governantes”, uma “classe original”, cuja base está constituída pela “posse do poder do Estado”, “um tipo original de propriedade privada”.

Esta análise provocou críticas e protestos. A partir de cinco de julho de 1930, em nome dos deportados de Kolpachevo, G. Khotinsky e A. Cheinkman atacaram vivamente:

“Pensamos que a burocracia não é uma classe e que não se converterá nisso jamais (...). A burocracia é o germe de uma classe capitalista que domina o Estado e possui em forma coletiva os meios de produção” (85).

Sabemos por outros deportados que Rakovsky continuou trabalhando entre 1930 e 1932 essencialmente sobre a questão dos “perigos do poder”, já abordada em sua célebre carta a Valentinov de agosto de 1928. Mencionam-se, entre outros trabalhos seus, dois que jamais saíram da URSS: As leis da acumulação socialista durante o período “centrista” da ditadura do proletariado e As leis do desenvolvimento da ditadura socialista.

Debatendo o conjunto desta questão sob o pseudônimo de N. Markin, Leon Sedov, depois de haver lembrado as posições de Rakovsky e as dos deportados de Kolpachevo, mencionou as teses de “um camarada autorizado, encerrado em um ‘cárcere de isolamento’, que propôs contentar-se pelo momento com a fórmula de ‘blindagem burocrática da ditadura do proletariado’” (86).

Não sabemos mais nada sobre a discussão que, sem dúvida, durou até a morte dos dois últimos militantes da Oposição de Esquerda.


A ação política: as greves de fome

Os militantes da Oposição que ficaram em liberdade tinham teoricamente os mesmos meios de ação que os outros cidadãos soviéticos; como eles, participavam aqui ou ali nas greves ou em manifestações de descontentamento. E, durante este período, parece ter sido o único grupo que distribuiu ou difundiu clandestinamente panfletos ou textos políticos.

Mas o grosso das fileiras da Oposição, os deportados, cujos efetivos se elevaram a aproximadamente oito mil em 1933, tinha escassos meios de ação para realizar o que era o seu principal objetivo: melhorar as condições de detenção. Os deportados e os prisioneiros comemoraram sempre mediante manifestações as datas do dia do trabalho e do sete de novembro, cantando A Internacional, apesar da proibição e desfraldando panos vermelhos como bandeiras. Estas manifestações custavam-lhes geralmente caro: detenções de deportados, por exemplo, os de Rubtsovsk, em 1930, e sanções severas nos “cárceres de isolamento”: isolamento especial, calabouços, ampliação das condenações. Mas, quando o regime se tornou insustentável, restou somente o último recurso: a greve de fome. A primeira delas havia explodido a partir dos primeiros meses de 1928 na prisão de Tomsk. A segunda tivera por cenário a penitenciária de Tobolsk, onde o regime era feroz. Em 1930, no “cárcere de isolamento” abarrotado – mais de 450 prisioneiros nesse momento – de Verkhneuralsk, o diretor Biziukov tinha acorrentado desnudos os prisioneiros em greve de fome e os havia molhado com água fria em pleno inverno para dobrá-los.

Foi em Verkhneuralsk onde, a partir de 1930, desenvolveram-se as greves mais duras de todas as que se conhecem. A primeira estalou no final de abril de 1931, quando um detido, o “decista” Essaian, foi ferido com um tiro por uma sentinela. Formou-se um comitê de greve de três membros, com Dingelstedt, o “bolchevique militante” Kvachadzé e o “decista” Saiansky (87). Os cento e setenta e seis comunistas de todas as tendências em greve tinham o apoio dos anarquistas. Reivindicavam sanções contra os responsáveis, a mudança do diretor, garantias para o futuro, a liberação e a hospitalização do ferido, a adequação do regulamento e a melhoria das condições cotidianas de vida.

Ao sétimo dia da greve foi-lhes prometida uma audiência com uma comissão especial da GPU, presidida por Andreeva, para negociar, e, então, levantaram a greve. Em primeiro de maio de 1931, os prisioneiros encorajados em bloco por esta primeira vitória se mobilizaram no “cárcere de isolamento” com retratos de Trotsky e bandeiras com as palavras de ordem da Oposição. Mas a comissão não compareceu. A greve foi reiniciada no início de julho. Desta vez a comissão se apresentou e cedeu em muitas reivindicações importantes (88). Pouco mais tarde se saberia que certas promessas não foram cumpridas, em especial que Essaian não foi liberado, e apenas trasladado. Sob represálias dissimuladas, 35 detidos foram enviados a Suzdal sob um regime muito duro.

A segunda greve de fome iniciou-se em Verkhneuralsk em maio de 1933. Com efeito, desde vários meses, aos condenados cuja pena havia finalizado esta era “renovada” automaticamente por via administrativa e sem justificação pela direção colegiada da GPU. Os detidos decidiram então advertir à GPU que retomariam imediatamente a greve de fome se não obtivessem a liberação de todos os prisioneiros cujas penas expiravam. O comitê de greve eleito, ainda com Dingelstedt, o “bolchevique militante” Sacha Slitinsky e Iakov Byk, tomou todas as disposições para que a greve começasse no dia assinalado, mesmo no caso de traslado (89). Ao se iniciar o traslado dos detidos, a greve estalou simultaneamente em muitas prisões. Em Verkhneuralsk, foi quebrada no décimo-terceiro dia. Dingelstedt, Slitinsky e Byk foram trasladados à sinistra penitenciária de Solovki, nas ilhas Solovietsky, que Ciliga chama de “a Guaiana ártica”. Ali, os políticos – comunistas usbeques e da Kirguísia, como também georgianos e caucasianos – estavam misturados com os presos comuns e eram objeto dos piores vexames. Fortalecidos com a experiência adquirida, os homens de Verkhneuralsk reiniciaram seu paciente trabalho reagrupando-se e reorganizando-se. Alguns meses mais tarde, lutaram pelo reagrupamento dos presos políticos e pela obtenção de um regime especial. Obtiveram, escreve Ciliga, “alguns resultados” (90). O rastro de F. N. Dingelstedt, professor vermelho, intelectual judeu, lutador heróico, perdeu-se em 1935, depois de sua deportação a Alma-Ata.

O armênio Arvem A. Davtian – “Tarov” – que tomou parte nas duas primeiras greves de fome de Verkhneuralsk ficou no “cárcere de isolamento”. Através dele conhece-se o desenvolvimento de uma terceira greve de fome neste conhecido “cárcere de isolamento”, depois da visita da comissão da GPU que “renovou” em dezembro de 1933 as penas de todos os detidos. A greve começou em 11 de dezembro. Deixemos falar este comunista armênio:

“Em 20 de dezembro, transportaram à força os grevistas de uma cela para outra. Isto era para interrogá-los. Logo começaram a alimentá-los à força. Foi um espetáculo impossível de esquecer: houve verdadeiras batalhas entre os grevistas e os guardas. Naturalmente, os primeiros foram golpeados. Extenuados, fomos alimentados pela garganta com sondas apropriadas. Os tormentos foram inauditos. Introduziram-nos na boca grandes pedaços de borracha. Os grevistas eram arrastados, destroçados como cães, à ‘cela de alimentação’. Ninguém capitulava. No décimo-quinto dia da greve, nosso comitê de greve decidiu concluí-la ao meio-dia porque muitos grevistas tentavam se suicidar. Um dos colaboradores da GPU aproximou-se de nós no ‘cárcere de isolamento’ e começou a nos ameaçar de envio a Solovietsky. Nossos camaradas o expulsaram das celas. A decisão do comitê de greve foi aprovada por unanimidade pelo conjunto dos grevistas. O representante da GPU teve que prometer de palavra (negava-se a fazê-lo de forma escrita) liberar àqueles que haviam terminado sua condenação. Foi assim que, em 22 de janeiro de 1934, terminada minha condenação, fui trasladado à cela dos ‘liberáveis’” (91).

 
A resistência

O último texto político apresentado na própria URSS em nome do conjunto da Oposição foi a declaração de abril de 1930, redigida por Rakovsky e assinada também por V. V. Kossior, N. I. Muralov e V. S. Kasparova (92). A tarefa, no entando, foi difícil, e um primeiro rascunho se perdeu por causa de um confisco na casa de Rakovsky. A partir dessa data aconteceram vários debates, mas os deportados não tiveram já a possibilidade de elaborar documentos coletivos. Mas isto não foi, como no início de 1929, o sintoma de uma crise interna. Muito pelo contrário, o que havia aparecido como o “último reduto” da Oposição em torno de Rakovsky se nutriu de novos recrutados, jovens e velhos, na deportação e nas prisões: na Sibéria e na Ásia Central, entre os deportados e os prisioneiros, a Oposição de Esquerda se desenvolveu muito. Nos centros urbanos, pelo contrário, recebeu golpes após golpes.

Podemos acompanhar o rastro dessas ondas de repressão quase semana a semana, através da correspondência dos “cadernos do exílio”. Foi Victor Serge que, em maio de 1930, contou a série de interrogatórios e detenções que acabaram afetando especialmente aos deportados Abramsky, Voskressensky e Antokolsky, os quais logo se encontrariam em Verkhneuralsk (93). Em maio de 1931, foi uma carta de Naville que mencionou a prisão do último núcleo dos chamados “resistentes livres” e especialmente de seu chefe “Michel” – um amigo de Andres Nin – que se manteve firme ante a GPU (94). Em outubro de 1930, Trotsky escreveu com franqueza ao americano Shachtman: a Oposição, enquanto organização, já não existe (95). Nesta data, os chefes da Oposição estavam nos “cárceres de isolamento”: Verkhneuralsk, Iaroslavl, Tobolsk, Suzdal, inclusive na sinistra “prisão central da GPU”, em Moscou, como o ex-clandestino Ianuchevsky.

Mas os bolcheviques-leninistas não haviam esquecido as lições da ação clandestina que lhes foi ensinada na luta contra o regime czarista. A repressão policial não permitia construir um centro no interior. Ao não poder realizar-se ali, foi construído no exterior, em torno ao Biulleten Oppositsii, que se converteria na Rússia no eixo do reagrupamento dos oposicionistas, tanto como organizador quanto como revista teórica e boletim de debate.

O envio do Biulleten, do qual várias dezenas foram editadas em formato reduzido para facilitar sua difusão clandestina, se fazia de mil maneiras. A principal era através dos portos onde arribavam os barcos soviéticos, Amberes e Hamburgo, o que conferiu um papel particularmente importante aos militantes belgas e alemães. A venda pública do Biulleten nos quiosques e livrarias da maioria das grandes cidades da Europa permitia que os soviéticos que viajavam ao exterior pudessem ter acesso ao mesmo, pois muitos deles buscavam precisamente este tipo de publicação. Em geral, o Biulleten continuaria penetrando na URSS, inclusive em formato reduzido até 1933 e inclusive até mais tarde, como o testemunham alguns dados fornecidos por Serge em 1936.

Mas o problema mais difícil era a circulação em sentido inverso: da União Soviética em direção à Europa Ocidental, mais precisamente para Berlim, onde Sedov havia instalado o centro da redação do Biulleten. Interrompendo as comunicações neste sentido, a GPU mataria dois pássaros de um só tiro. Que seria de um Biulleten privado de informação proveniente da URSS? As rigorosas condições de clandestinidade de tal trabalho faziam, por outro lado, que não permanecesse nenhum rastro escrito, ou, pelo menos, se ficassem, que fossem difíceis de interpretar. Feitas essas reservas, indicaremos igualmente tudo o que nos parece que foram as grandes linhas de solução aportadas por Sedov a este espinhoso problema.

Em 1929, por exemplo, Sedov havia conseguido contactos em Berlim e em Paris. O de Paris era “Joseph”, na realidade, Solomon Kharin, membro da delegação comercial em Paris, do qual sabemos que não somente acompanhou Radek em sua capitulação, mas que entregou à GPU os manuscritos do primeiro número do Biulleten (96). Em Berlim, o representante da Oposição – em contacto com os oposicionistas alemães e especialmente com Sacha Muller que falava russo – é designado na correspondência sob a inicial de “L”. Pouco tempo depois, o papel de contacto e de “caixa de correio” em Berlim seria realizado por uma jovem soviética de vinte anos, Nina V. Vorovskaya, que era também uma velha militante da Oposição de Esquerda russa, camarada de combate de Leon Sedov e propagandista ardente das idéias e teses da Oposição no seio das Juventudes Comunistas. Filha de um velho bolchevique, obteve a autorização do governo para curar-se de sua grave tuberculose na Europa Ocidental. Ela era de plena confiança, porque pertencia ao velho núcleo dirigente; estava relativamente protegida no momento, porque sendo filha de um mártir da revolução, assassinado pelos Brancos, conhecia pessoalmente a todos os militantes importantes e corria, assim, menores riscos que qualquer outro de ser vítima de provocações. Mas não ficou muito tempo. Os médicos decidiram primeiro por uma operação que a colocou por algum tempo fora de contacto. Em seguida, apenas convalescente, foi chamada pelas autoridades russas e voltou a Moscou onde morreu. Trotsky lhe consagrou um emotivo artigo necrológico (97). Os documentos alemães a designavam sob as iniciais “N. K” (98).

Durante vários meses, no curso do ano de 1930, não houve mais contacto permanente com a Oposição de Esquerda em Berlim. O vazio, contudo, foi preenchido no final do ano por um homem, do qual Sedov escreveu ao pai que era de total confiança (99). Era, provavelmente, aquele a quem Jean Meichler encontrou em Paris e do qual falava em uma carta a Prinkipo: o “novo amigo”, o “Dr. H. K” pertencia à representação comercial soviética na Alemanha, sua especialização era a madeira e tinha dois amigos na representação soviética em Paris, aos quais tinha ido procurar pelas necessidades da ação e da conexão (100).

Nossas informações sobre esta questão se interrompem com a chegada de Sedov a Berlim. Daí em diante, com efeito, seria ele o centro, a cabeça da rede, o homem que mantinha e assegurava todas as conexões. Numerosos russos viviam na capital alemã, emigrados de épocas diversas, e também estudantes. Sabemos que Sedov recrutou em Berlim a um estudante russo com passaporte, Oskar Grossmann, quem, sob o nome de “Otto”, se tranformou em um dos dirigentes dos jovens da Oposição alemã. Mas sabemos também que se reunia com muitos viajantes: era, aparentemente, por meio da delegação comercial em Berlim, como transitava a maioria dos viajantes da União Soviética; e muitos abasteciam boas quantidades de informações e documentos.

Ademais, Leon Sedov, velho conspirador, tinha acesso às “viagens especiais”, das quais não sabemos praticamente nada, salvo que eram extraordinariamente difíceis de organizar, que sempre havia que argumentar e convencer de sua necessidade àqueles que aceitavam fazê-las, que nunca se tratava de missões de “ida e volta”, mas somente de uma ou outra, que as pessoas que haviam levado documentos nada traziam de volta, e vice-versa (101). As escassas informações de que dispomos parecem indicar que as “viagens especiais” não eram, naturalmente, viagens turísticas, muito suspeitosas então, visto que eram escassos na época, e sim que eram deslocamentos normais de militantes dos aparatos da Internacional Comunista ou do KPD (Partido Comunista Alemão) que simpatizavam com a Oposição de Esquerda e aceitavam converter suas missões em missões especiais. Somente dispomos de um testemunho sobre isto, o do alemão Karl Grohl, que garantiu a Sedov, em fevereiro de 1933, uma “missão especial” em Moscou, por ocasião de uma viagem realizada por conta da empresa de Münzenberg (102).

A correspondência proveniente da União Soviética, que aparece muito regularmente no Biulleten, era, então, na realidade, uma correspondência um tanto peculiar, heterogênea, formada, por sua vez, por extratos de relatos autênticos de militantes russos e de textos redigidos por Sedov à base de relatos orais, de cartas pessoais recebidas por seus contactos etc.

As primeiras provinham geralmente de Moscou, mas também de Leningrado, Kharkov e, inclusive, de Tashkent, ou de muitos lugares de deportação. Estavam evidentemente assinadas com pseudônimos, às vezes com simples iniciais, e davam em geral informações interessantes não somente sobre a vida do partido, as intrigas do aparato, o estado de ânimo das massas e as condições de vida, como também sobre a repressão, o destino e o moral dos prisioneiros e exilados. Em um primeiro período, figuram os relatos assinados por “N”, a partir de 1930, por “NN”, antes que aparecesse “TT”. Quem eram estes homens? Sem dúvida não o saberemos jamais. Por outro lado, mencionamos que um deles era aparentemente o bolchevique de Moscou Andrei Konstantinov, Kostia, membro do partido desde 1916, detido no final de 1932, posteriormente deportado a Arkhangelsk e, em seguida, a Vorkuta. Conhecemos também ao moscovita Ianuchevsky – Ian – detido, sem dúvida em 1930, transferido de Verkhneuralsk à prisão central da GPU de Moscou, onde desapareceu para sempre.

É desta primeira categoria de “informes”, mais do que das cartas, de onde provêm os documentos referidos à deportação e também à vida nos “cárceres de isolamento”, transmitidos pelos responsáveis soviéticos à custa de gigantescas dificuldades. Assim, o texto redigido em Verkhneuralsk, em junho de 1930, por Iakovin, Solntsev e Stopalov, chegou a Prinkipo em 10 de outubro. A demora não foi muito mais longa entre o início da primeira greve de Verkhneuralsk em 1931 e a informação transmitida no Biulleten Oppositsii, que, ademais, publicou a lista nominal de cento e dezessete grevistas de fome distinguindo “bolcheviques-leninistas” de “decistas”.

O segundo tipo de documentos recolhe cartas pessoais ou extratos das mesmas que continham informações concretas, ou cartas produzidas a partir de materiais recolhidos pela correspondência ou conversações; a partir de confidências dos responsáveis que viajavam ao exterior, frequentemente recolhiam-se fatos interessantes, rumores que no início dos anos 1930 circulavam dentro do aparato: em geral proporcionavam informações que seriam confirmadas décadas mais tarde depois da morte de Stalin. As mais interessantes pertencem ao período em que a Oposição russa, no final de 1932, começava a sair de seu isolamento e se preparava para entrar no “bloco das oposições”.

 
A virada de 1932-1933

Contudo, a crise que atravessava o país, a fome que arrasava regiões inteiras, a miséria e a subalimentação dos trabalhadores das cidades e o endurecimento da repressão contribuíram para isolar paulatinamente uma direção que ninguém se atrevia espontaneamente a qualificar de “genial”. O descontentamento e a desconfiança se apoderaram não somente do partido, como também do próprio aparato. Uma das primeiras conseqüências foi o início de uma reestruturação da Oposição, a perspectiva de sua reconstrução enquanto organização, beneficiando-se da corrente geral de oposição a Stalin. A partir deste ângulo, os recentes descobrimentos baseados nos cadernos do exílio de Harvard (103) permitem elucidar um capítulo muito novo da história da Oposição de Esquerda na URSS.

Com efeito, desde 1932, as organizações ou grupos de oposição e as iniciativas contra a política de Stalin não deixavam de se multiplicar no próprio seio do aparato. Em 1930, o comitê do partido da Transcaucásia, dirigido por V. V. Lominadzé (104), até o momento um dos favoritos de Stalin, votou uma resolução muito dura contra a política econômica do partido e denunciou o abismo que se ampliava entre os burocratas e as massas. No mesmo sentido, o presidente do Conselho dos Comissários do Povo da URSS, Sergey I. Sirtsov (105), elaborou um texto crítico. Estas não eram iniciativas individuais, e a GPU, alertada pelas coincidências que existiam entre elas, o descobriria rapidamente. Sirtsov e Lominadzé eram, com efeito, os organizadores de um grupo clandestino de oposição com extensas ramificações, que incluíam intelectuais bolcheviques como Jan E. Sten, o filósofo, mas também quadros das juventudes comunistas da época revolucionária, como Lazar Chatzkin e Nikolai Chaplin (106). Por outro lado, constituíram-se outros grupos, como, por exemplo, no Comissariado da Agricultura, impulsionado pelo antigo comissário A. P. Smirnov com o diretor de transportes e o de abastecimento da URSS, Nikolai Eismont e Tolmatchev (107).

Em 1932, estes homens, aos quais Trotsky com razão considerava “capituladores”, fizeram um balanço de sua tentativa de se reintegrarem ao partido e de se integrarem em suas atividades sob a direção de Stalin: foi um balanço terrivelmente negativo, visto que sua capitulação não havia servido para nada senão desacreditá-los. Os zinovievistas reuniam-se regularmente para discutir tanto os problemas do momento, como também os do passado. A catastrófica política alemã de Stalin, assim como a crise econômica que arrasava o país, os impulsionavam contra ele. Zinoviev arriscou-se a colocar a concepção de Lênin sobre a frente única, oposta à “frente única pela base” preconizada na Alemanha por Thaelmann (108), o discípulo de Stalin.

Na realidade, os dois dirigentes da “nova oposição” começaram a medir o alcance do erro que haviam cometido em 1927 ao romper com Trotsky, tudo para ficarem de joelhos nesse partido onde, de toda forma, não eram mais que reféns impotentes. De conversação privada em conversação privada, Zinoviev e Kamenev começaram a tatear o terreno ao seu redor e a procurar aliados.

Entre os velhos trotskistas, Ivan N. Smirnov parece ter sido o mais ativo no sentido de retomar uma atividade clandestina prudente, mas decidida. Ao seu redor encontravam-se os que haviam capitulado ao mesmo tempo em que ele capitulou: o armênio Ter-Vaganian, Ufimtsev (109) e até Preobrajensky, precursor da capitulação junto com Radek. Reuniam-se informações, buscavam-se contactos. No mês de junho de 1932, começaram as negociações com o grupo “esquerdista” dos ex-estalinistas separados em 1930, por intermédio de Ter-Vaganian, que já há alguns anos havia se unido a Lominadzé. A idéia de formar um “bloco” das oposições formado por ex-capituladores e ex-estalinistas pôs-se na ordem do dia.

Foi provavelmente na mesma época que nasceu clandestinamente um grupo original de oposição conhecido sob o nome de grupo Riutin (110). O ponto de partida foi o desconcerto e, em seguida, a fúria dos antigos quadros “direitistas” do partido ante a capitulação de seus dirigentes e, em particular, de Bukharin. Não foi somente o fato de que os chefes da direita haviam capitulado sem combate, vítimas de um “regime” de partido que eles próprios haviam contribuído para criar, mas também os excessos insensatos da coletivização pareciam dar-lhes razão em linha com as advertências que haviam lançado em vão. Degradados a partir de 1928-29, conservando, não obstante, postos no aparato de Moscou, os apparatchikis Riutin e Uglanov (111), rompendo com sua fração de forma tradicional, lançaram a idéia da conciliação das oposições. Para eles, Bukharin havia tido razão no plano da polêmica econômica e Trotsky na do partido. Sua plataforma de 165 páginas apresentava um programa de restauração da democracia interna do partido e desenvolvia a necessidade de “afastar Stalin”. O grosso de seus partidários estava constituído por direitistas, como os “professores vermelhos” Slepkov e Maretsky, antigos protegidos de Bukharin, mas também recrutavam setores de esquerda, como, por exemplo, o velho operário bolchevique de Leningrado, Kaiurov (112). A plataforma circulou no partido e também nas fábricas. No verão, Riutin foi detido e encarcerado.

Neste período as questões já haviam pendido muito à esquerda. O grupo de Smirnov discutiu com os zinovievistas e com os “esquerdistas” do grupo de Lominadzé, e se concordou em constituir um “bloco”, pedindo-se aos trotskistas a adesão. Quando esta discussão se desenvolvia, em setembro a repressão golpeou. Zinoviev e Kamenev foram expulsos do partido simultaneamente com os principais dirigentes do grupo Riutin, acusados uns e outros de haverem formado uma organização para restaurar “o capitalismo e o kulak”. Alguma semana mais tarde foi a vez de cair o grupo Smirnov, seguido, algumas semanas depois, pelo grupo Eismont-Tolmachev. O bloco não havia vivido mais que algumas semanas e, inclusive, não havia tido tempo de se dotar de uma direção, porque dois dos grupos que o constituíam haviam sido decapitados já no outono de 1932.

Contudo, esta não é a mesma história a recomeçar. Primeiro, porque não é de todo seguro que a existência do bloco haja sido descoberta nessa época, como o sugere o fato de que os membros do grupo Sten-Lominadzé não haviam sofrido a repressão renovada senão na forma de algumas medidas de deportação. Oficialmente, Zinoviev e Kamenev haviam sido excluídos do partido por haver tido conhecimento da plataforma de Riutin e não a terem denunciado. Na realidade, é possível que a GPU não soubesse mais que isso. O principal militante trotskista detido neste período, Andrei Konstantinov, não foi, por outro lado, detido como tal em dezembro de 1932, e sim somente por pronunciar palavras imprudentes: quatro anos mais tarde, em sua saída da URSS, Victor Serge não o colocou na categoria de detidos trotskistas (113).

Dessa forma, a maioria do Bureau Político não acompanhou Stalin, que queria uma maior repressão enquanto reclamava a cabeça de Riutin afirmando que sua “plataforma” era um apelo para assassiná-lo (114).

Por outro lado, na carta em que Sedov informa a Trotsky do nascimento do bloco (115) também menciona o que ele chamava de “naufrágio dos velhos”, alusão, sem dúvida, a Karl Grunstein a quem Trotsky, em sua resposta, qualificou de “capitulador”. Mas Sedov precisava que os vínculos operários haviam sido preservados: a Oposição de Esquerda parecia sair de seu isolamento e ser capaz de realizar novos progressos. O informe de fevereiro de 1933 revela, com efeito, um sentimento de otimismo e oferece a imagem de um grupo que dispunha de pelo menos numerosos canais de informação (116). Pois bem, tudo mudaria bruscamente com a vitória na Alemanha dos bandos hitleristas.

Com o desaparecimento do movimento operário e comunista alemão também desapareceu a rede de Sedov – obrigado, ademais, a deixar a Alemanha. As relações da Oposição russa com o exterior quebraram-se definitivamente. Seu isolamento se consumou por fim. Stalin, por seu lado, se beneficiaria da desmoralização provocada pelo desastre, pela inquietação, que despertava entre todos os que duvidavam, de combater a ameaça cada vez mais visível de um inimigo mortal. A relativa diminuição do terror durante os anos 1933-34, a melhoria da situação econômica depois de uma boa colheita e de um melhor abastecimento, contribuíram para tornar possível este tipo de união sagrada que o perigo exterior parecia demandar. Desde o mês de março de 1933, Zinoviev e Kamenev, descendo mais um degrau para o abismo, capitularam de forma mais vergonhosa ainda, a fim de ganhar o direito de voltar a Moscou e de ser reintegrados no partido. Os partidários do “bloco” pareciam ter se dispersado novamente em um período em que era possível de se acreditar que o “liberalismo” de Kirov e de seus aliados havia feito Stalin entrar em razão.

Foi no marco desta retirada relativa e de uma situação mundial marcada pelo triunfo da reação e pelo caminho em direção à guerra que Stalin colocaria em prática o mecanismo que lhe permitiria liquidar os velhos quadros do partido, começando pelos membros do bloco, destruir definitivamente a Oposição de Esquerda e aterrorizar e encher de estupor as massas soviéticas por décadas.

 
O início do fim

A Oposição de Esquerda não podia sobreviver fisicamente à derrota da classe operária mundial frente à contrarrevolução na Europa; fenômeno efêmero certamente, mas de uma duração considerável à escala da vida humana.

De início, foi o rigor do regime de detenção inflingido pela GPU aos homens e mulheres das organizações debilitadas o que golpeou mais duramente as fileiras da Oposição. Eram condições materiais realmente horrorosas e um isolamento cada vez mais férreo.

A lista de mortos não fez senão aumentar. O primeiro foi Koté Tsintsadzé. Imediatamente depois chegou o turno à outra velha militante bolchevique georgiana, Elena Tsulukidzé. Logo o de dois heróis da guerra civil: Aleksandr Rosanov e Boris Zelnitchenko. As informações que se filtravam não eram frequentemente mais que alarmantes informes de saúde. Boris E. Eltsin apenas sobrevivia; Lado Dumbadzé tinha os dois braços definitivamente paralizados; Iossif Eltsin morria de tuberculose, da mesma forma que Filip Schwalbe, que escarrava sangue dos pulmões; a companheira de Pevzner, a quem seu tio fez – demasiado tarde – que a trasladassem à Criméia. Inclusive os jovens foram alcançados por esta situação: E. B. Solntsev, depois dos anos de isolamento e de muitas greves de fome, sofria de escorbuto; Mussia Magid estava obrigada a guardar cama de forma permanente, tuberculosa, em Verkhneuralsk, assim como Vassu Donadzé e N. I. Mekler.

Nesta operação de aniquilamento, tão sistemática quanto hipócrita, dois homens foram particularmente golpeados: Sosnovsky e Rakovsky. O primeiro, depois da execução de seus camaradas da GPU, que o haviam apoiado por um momento em seu combate, foi literalmente enterrado vivo. Esse grande enfermo – diabético – viu-se impedido de seguir o regime alimentar que possibilitaria salvá-lo temporariamente. Stalin, que temia sua aguçada pluma e sua linguagem popular, não teve nenhuma crise de consciência pelos métodos empregados: tudo o que se sabia de Sosnovsky depois de 1930 era que esse notável enfermo ia morrer.

Rakovsky, depois de Astrakan e Saratov, esteve em Barnaul, sob umas condições materialmente abomináveis para sua enfermidade cardíaca, onde o rigor do inverno chegava a alcançar durante semanas inteiras os cinqüenta graus abaixo de zero. Não obstante, conseguiu trabalhar ali, fazendo chegar a Trotsky e a Sedov cartas cheias de ardor, combatividade e sabedoria. Conseguiu também fazer chegar ao estrangeiro um volumoso trabalho sobre Os problemas econômicos da URSS, centrado no fracasso do Plano Qüinqüenal e na necessidade de uma “retirada econômica”. Contudo, o silêncio rapidamente também rodeou sua figura, somente interrompido pelos rumores periódicos que anunciavam, como também para Sosnovsky, sua morte no exílio, o que alguns esperavam, mas que muitos temiam, inclusive nos círculos do poder. Acredita-se, pelos laços que Trotsky mantinha em Prinkipo com o neto de Rakovsky, médico em Paris, que o velho lutador, convencido de que não poderia resistir indefinidamente à máquina de arrebentar homens mais indestrutíveis, decidiu finalmente jogar tudo em uma tentativa de evasão que o conduziria até a Mongólia exterior. Preso novamente, gravemente ferido, teria sido trasladado a Moscou e curado, submetido ao mesmo tempo a insuportáveis pressões, às quais havia resistido. Foi condenado novamente ao exílio, desta vez em Yakutsk, na região da noite polar.

Foi finalmente em 1934 que os dois homens, tão selvagemente perseguidos durante anos, afundaram definitivamente (117). Capitularam com alguns dias de intervalo e foram levados novamente a Moscou.

Com esta capitulação – uma morte política que não era, na realidade, mais que uma etapa no meio do calvário – eles aceitavam, daí em diante, renegar de tudo o que havia sido suas vidas. Isto se explica somente pela atroz perseguição a que haviam sido submetidos estes dois homens já velhos, pelo esgotamento moral e psíquico de pessoas enfermas a quem a vida não deu descanso? O debate está aberto. Mas, irrefutavelmente, o tom e os acentos da primeira declaração de Rakovsky o sugerem, um fator importante de sua decisão foi sua avaliação – sobre a base das informações recebidas – da situação internacional: os dois homens tinham consciência, com efeito, há anos, do perigo mortal que representaria para a União Soviética uma vitória de Hitler na Alemanha e de suas inevitáveis conseqüências mundiais (118).

O operário oposicionista armênio Arven A. Davtian, antigo oficial do Exército Vermelho, contaria um pouco mais tarde que, na mesma época, ele solicitava seu reingresso no partido, comprometendo-se a silenciar definitivamente suas idéias, e que adotava este gesto em nome da necessidade da união sagrada contra os fascistas (119). Victor Serge, por seu lado, contou como o operário ucraniano Iakov Byk, um dos antigos membros do comitê de greve de Verkhneuralsk, recebendo a declaração de Rakovsky e considerando-a digna, acreditou na possibilidade de um compromisso, o reconhecido direito da Oposição de servir sem renegar seu passado. Assim o transmitiu às autoridades locais que o mandaram de avião a Moscou. Ali, quando compreendeu o que se lhe propunha, solicitou simplesmente voltar ao lugar de onde viera (120).

A reação que suscitou a capitulação dos dois veteranos somente afetou, pelo que parece, a Byk, e um erro de avaliação idêntico, rapidamente corrigido, foi o que cometeram, segundo Victor Serge, ao mesmo tempo, os dois Eltsin, pai e filho (121). As três primeiras ondas de capitulações, em 1928-1929, haviam temperado definitivamente aos homens da segunda geração bolchevique-leninista, que, com razão, conheciam bem a força do mecanismo que havia quebrado seus antecessores. Além disso, como assinalou Ciliga em Verkhneuralsk, “Rakovsky não desempenhava papel autônomo na Oposição, pois esta reconhecia como chefe somente a Trotsky. Rakovsky era escutado somente como representante de Trotsky” (122). Em resumo, Rakovsky e Sosnovsky não selaram mais do que sua sorte pessoal.

 
Os últimos anos

A vitória de Hitler na Alemanha desequilibrou em escala mundial a relação de forças entre as classes: isto permitiu a Stalin, na URSS, dar uma “solução final” – sem precedentes na época – à questão da Oposição de Esquerda.

Não é fácil reconstruir a trama desses anos, dos quais Victor Serge se perguntava se não havia chegado a “meia-noite do século”. Já não havia mais comunicações entre a URSS e Trotsky: nenhum militante ou simpatizante se atreveria a correr o risco de escrever. A GPU não deixava de aumentar sua pressão: a partir de 1935, logrou colocar próximo a Leon Sedov, em Paris, a um de seus agentes, Zborowski, que militava sob o pseudônimo de Etienne, o qual informava diretamente tudo o que averiguava (123). O pequeno grupo russo de Paris estava dilacerado pelas suspeitas que Etienne difundia, a fim de se proteger a si mesmo (124).

Os últimos elementos de informação chegaram por correio com os últimos militantes que conseguiram fugir da União Soviética: Davtian-Tarov, que chegou à Pérsia em agosto de 1935; Ante Ciliga, que desembarcou em Praga em dezembro do mesmo ano; Victor Serge, finalmente liberado, que chegou à Bruxelas em abril de 1936. No decorrer de 1937, os homens que romperam com a GPU, Ignace Reiss e Valter Krivitsky (125), aportaram também elementos desde outro ponto de vista. Estes foram já os últimos.

Através de suas informações podem-se reconstituir alguns fragmentos do que aconteceu na URSS durante esses últimos anos em que a Oposição agonizava. Aparentemente, em 1933 ou 1934, os deportados da Oposição haviam alimentado uma débil esperança de melhorar sua sorte – possivelmente no marco da política de distensão relativa inspirada, e sem dúvida imposta a Stalin, por aquela oposição do aparato que havia feito de Kirov seu candidato ao primeiro posto. Aqui e ali foi interrompida a renovação automática das condenações e houve autorização para que vivessem no exílio os antigos confinados nos “cárceres de isolamento”. Deu-se o caso, inclusive, de que um velho bolchevique membro da Oposição fosse liberado sem haver capitulado. Trata-se de N. I. Muralov, autorizado a trabalhar como agrônomo na Sibéria. Muitos dirigentes da jovem geração da Oposição, que haviam deixado nessa época o “cárcere de isolamento”, viviam de forma precária, no exílio, às vezes juntos às suas famílias. Sabe-se, por exemplo, que Victor Eltsin esteve desde 1933 até 1935 em Arkhangelsk, e V. E. Pankratov em Orenburg. Em 1934, E. R. Solntsev, depois de uma dupla ampliação de fato de sua condenação, foi autorizado a viver no exílio na Sibéria. G. Ia. Iakovin vivia em condições semelhantes em Stalinabad. Guevorkian estava igualmente “livre”. Mas esta não foi mais do que uma muita curta trégua. Em primeiro de dezembro, o jovem comunista Leonid Nikolaiev matou a tiros Kirov no Smolni. A GPU – com Stalin por trás de Iagoda – moveu os fios da “conspiração” para justificar o banho de sangue que considerava necessário renovar. Em pouco tempo a primeira onda de detenções pôs um ponto final nos sonhos audazes de semi-liberdade que do exílio alimentaram certos oposicionistas. Todos foram detidos, sem exceção, com duras condenações: muitos deles são os desaparecidos. A renovação automática das penas foi retomada como mecanismo inflexível dirigido pela direção colegiada da GPU, rebatizada como NKVD.

Houve poucas capitulações neste período. Falava-se em 1935 de Verónika S. Kasparova, de idade avançada e muito enferma. Ninguém acreditou na capitulação anunciada de Stopalov porque se viu na mesma uma “manobra”. Por outro lado, a chegada nos “campos” de dezenas de milhares de novos detidos, entre os quais havia uma maioria de jovens, parecia fortalecer aos bolcheviques-leninistas de tropas frescas, reforços de combatentes e futuros quadros. Rapidamente os bolcheviques-leninistas foram reagrupados a fim de isolá-los da massa de deportados e condenados. Os “campos” se assemelhavam cada vez mais a “campos de concentração” e os “cárceres de isolamento” renovaram sua população: o trotskista V. F. Pankratov, voltando a Verkhneuralsk em 1935, encontrou na mesma cela a Kamenev, Slepkov e Smilga.

Tentaram alguns dos homens da jovem geração no exílio reconstruir em 1934 senão uma organização na forma, pelo menos o centro de uma rede? É cabível duvidar disso junto com Victor Serge, que julgava impossível semelhante empresa. Não obstante, disso foram acusados em 1935 G. Ia. Iakovin, Kh. M. Pevzner e E. B. Solntsev. Este último morreu em janeiro de 1936, no hospital de Novosibirsk, depois de uma greve de fome vitoriosa contra o prolongamento das condenações e a negativa da GPU de deixá-lo viver no exílio em Minussinsk com sua mulher e seu filho (126). Pankratov e Pevzner receberam ambos cinco anos adicionais no “cárcere de isolamento” e foram enviados, um a Verkhneuralsk e o outro a Cheliabinsk, desaparecendo para sempre. O primeiro somente pôde fazer saber aos seus amigos de Orenburg que o processo havia “sido espantoso” (127).

Os militantes da Oposição de Esquerda foram executados sem processo e muitos deles sem dúvida pereceram durante a preparação dos processos-espetáculo, dessas farsas nas quais não é difícil imaginar o quanto teria desejado Stalin fazer comparecer, como acusado que confessa seus crimes e verte lágrimas de sangue, a algum dos “irredutíveis” que não haviam deixado de enfrentá-lo durante anos. O próprio Trotsky temia, não sem razão, ante o anúncio de cada processo, ver figurar a algum deles, quebrado pelos métodos aperfeiçoados cuja eficácia não subestimava. De todos os homens que não haviam capitulado, Stalin somente conseguiu finalmente quebrar a Muralov, a quem curiosamente havia protegido deixando-o exercer livremente sua profissão de agrônomo na região de Novosibirsk. Este golpe – muito duro para Trotsky – foi o único. Entre os acusados nos três grandes processos de Moscou figuraram alguns nomes de antigos dirigentes ou militantes da Oposição, mas, à exceção de Muralov, todos esses homens já haviam “capitulado” anos antes e haviam renegado publicamente; Zinoviev e Kamenev, Piatakov e Krestinsky desde 1928; Smirnov, Mratchkovsky, Boguslavsky, Ter-Vaganian, depois de Radek, em 1929; e finalmente Rakovsky, em 1934. Mas nenhum dos bolcheviques-leninistas encerrados nos “cárceres de isolamento” durante anos, que haviam permanecido fiéis à organização e ao seu programa, colaborou finalmente, sequer sob tortura, com os processos pré-fabricados; a maioria deles pagou esta negativa com a sua vida.

Dispomos apenas de um testemunho do que eram estes homens em 1936, o de Victor Serge. Ele escreveu a Trotsky em 27 de maio de 1936, pouco depois de sua liberação e de sua chegada à Bélgica:

“Somos muito pouco numerosos neste momento: algumas centenas, em torno de quinhentos. Mas estes quinhentos já não claudicarão. São homens temperados, que aprenderam a pensar e a sentir por si mesmos e que suportam com tranqüilidade a perspectiva de uma perseguição sem fim. Nos ‘cárceres de isolamento’ nossos camaradas no total somente chegam a algumas dezenas frente às centenas de zinovievistas, direitistas e outros vermes estalinistas. Entre nós, não há grande unidade de pontos de vista. Boris Mikh (Mikhailovitch Eltsin) dizia: ‘É a GPU que fomenta nossa unidade’. Duas grandes tendências nos dividem aproximadamente pela metade: os que acreditam que há que se revisar tudo, que erros foram cometidos desde o início da Revolução de Outubro, e os que consideram ao bolchevismo como inatacável desde o seu início. Os primeiros se inclinam a considerar que nas questões de organização você tinha razão junto com Rosa Luxemburgo e, em alguns casos, com respeito a Lênin em outra época. Neste sentido, há um trotskismo cujas raízes vêm de longe (pessoalmente sou desta opinião, pensando sempre que os princípios de organização de Lênin foram ensaiados em um período e em um país determinado, particularmente atrasado). Dividimo-nos também pela metade em relação aos problemas da democracia soviética e da ditadura (fomos os primeiros partidários da mais ampla democracia operária no marco da ditadura: minha impressão é que esta tendência é a mais forte). Nos ‘cárceres de isolamento’ e em outros lugares, podem-se encontrar agora, sobretudo, aos oposicionistas trotskistas de 1930-33. Uma só autoridade subsiste: a sua. Você possui ali uma situação moral incomparável, de devoção absoluta” (128).

Deixemos de lado a polêmica, vã, sobre a questão de se saber a percentagem de bolcheviques-leninistas que se perfilavam nas posições “revisionistas” de Serge e daqueles que permaneciam fiéis a uma “ortodoxia” da qual, desde muito tempo, não dispunham de todos os elementos, análises concretas de uma situação concreta. Nem Serge nem qualquer outro de seus camaradas de então tinham a possibilidade de possuir sobre estas questões uma visão de conjunto. Consideremos apenas que Serge recebeu a missão, da parte de dois velhos militantes, de solicitar a Trotsky a confirmação sobre pontos que consideravam capitais: Boris M. Eltsin queria saber se Trotsky pensava igual a ele se, em caso de guerra, a União Soviética devia ser defendida incondicionalmente; e Vassili M. Tchernykh, antigo Comissário Político do Exército Vermelho, antigo chefe da Checa nos Urais, pensava que não se podia mais falar na URSS de “ditadura do proletariado”, que a burocracia era “uma classe social diferente” e que havia de se construir um novo partido na URSS (129). O certo é que os trotskistas da União Soviética mantiveram sua fidelidade à pessoa de Trotsky enquanto símbolo da Revolução de Outubro e de um partido vivo, bem como ao compromisso indefectível com a democracia operária, como o testemunha sua própria diversidade, fator, precisamente, de sua unidade inquebrantável frente à contrarrevolução nos anos mais negros.

Depois das notícias de Serge pairou um longo silêncio sobre o destino dos trotskistas na URSS. Não será somente em 1961 que as memórias de um antigo prisioneiro político de Vorkuta aportem elementos de informação que completam um manuscrito (“samizdat”) e finalmente temos o livro da mais ilustre dos escassos sobreviventes, Maria Mikhailovna Joffé (130), a viúva do diplomata soviético amigo de Trotsky que se suicidara em 1927 e cujo enterro havia dado lugar à última manifestação pública da Oposição em Moscou. Poderemos, de agora em diante, encontrar, até o final de 1936, o rastro de alguns desses homens e dessas mulheres que tentamos seguir aqui desde 1928 e acompanhá-los até sua morte. Foi a última “fornada” de trotskistas soviéticos.

Estas fontes, muito diferentes por suas origens e datas de publicação, coincidem em alguns pontos essenciais. Com efeito, segundo os três autores, a quase totalidade dos bolcheviques-leninistas, que sobreviviam nesta data na União Soviética, foi reagrupada no decorrer de 1936 nos campos de Petchora, próximos à Vorkuta, nesse “presídio além do círculo polar”, como dizia um deles. Muitos homens faltavam à chamada, vítimas sem dúvida da “preparação” dos processos públicos: nem Dingelstedt, nem Pankratov, nem Pevzner, nem Man Nevelson, nem Victor Eltsin, nem Sermuks estavam ali. Muito menos Solntsev, morto no início do ano. Mas há, de todo modo, dezenas de nomes que conhecemos: Igor Poznansky, o antigo secretário de Trotsky, G. Ia. Iakovin, o armênio Sokrat Guevorkian, o veterano V. V Kossior e sua companheira Pacha Kunina, Mussia Magid, Ido Chumskaya, os dois irmãos de Koté Tsintsadzé, Khotimsky, Andrei Konstantinov, Karlo Patskachvili, Karl Mesnais, Vasso Donadzé, Sacha Milechin, já mencionados no curso deste trabalho, assim como, naturalmente, a própria Maria M. Joffé. Temos de acrescentar, entre outras personalidades, a uma mulher que foi amiga de Natalia Sedova, Faina Viktorovna Iablonskaya, professora de história no Instituto de Jornalismo em 1927, verdadeira chefa do Estado-Maior da Oposição próximo a Trotsky nos últimos dias de 1927, e a antiga dirigente das Juventudes Comunistas, Raia V. Lukinova.

O menchevique MB, que escapou de Vorkuta, descreveu estes militantes – adversários políticos seus – que calculava em vários milhares, dos quais havia mil no campo onde vivia: negavam-se a trabalhar mais que oito horas, ignoravam o regulamento sistematicamente, de forma organizada, criticavam abertamente Stalin e a linha geral de conjunto, declarando-se, ao mesmo tempo, prontos para a defesa incondicional da URSS. No outono de 1936, depois do primeiro processo de Moscou, organizaram comícios e manifestações de protesto, em seguida fizeram votar uma greve de fome em assembléia geral, depois da intervenção de seus dirigentes. Suas reivindicações eram segundo Maria M. Joffé: 1) o reagrupamento dos presos políticos e sua separação dos presos comuns; 2) a reunião das famílias dispersas em campos diferentes; 3) um trabalho de acordo com a especialização profissional; 4) o direito de receber livros e jornais; 5) a melhoria das condições de alimentação e vida (131). O relato do menchevique MB agregava à jornada de oito horas, uma alimentação suplementar à marcada pela norma, o traslado dos inválidos, mulheres e anciãos fora das regiões polares. O comitê de greve eleito estava formado por G. Ia. Iakovin, Sokrat Guervorkian, Vasso Donadzé e Sacha Milechin (132), todos bolcheviques-leninistas, sendo que os três primeiros, veteranos das greves de fome de 1931 e de 1933, em Verkhneuralsk.

A greve, iniciada em 27 de outubro de 1936, durou centro e trinta e dois dias. Todos os meios foram empregados para quebrá-la: alimentação forçada e suspensão da calefação com temperaturas de 50 graus abaixo de zero. Os grevistas resistiram. Bruscamente, no início de março de 1937, as autoridades penitenciárias cederam ante uma ordem proveniente de Moscou: todas as reivindicações foram satisfeitas e os grevistas foram alimentados progressivamente sob controle médico.

Depois de alguns meses de trégua recomeçou a repressão. A alimentação foi reduzida, a ração de pão foi rebaixada a 400 gramas ao dia e os presos comuns foram incitados à violência. Logo os trotskistas, quase em sua totalidade, e os que os haviam acompanhado na greve de fome, foram reagrupados em construções separadas em Vorkuta, em uma velha fábrica de tijolos – rodeados de arames farpados e vigiados militarmente dia e noite.

Em uma manhã de março de 1938, trinta e cinco homens e mulheres, bolcheviques-leninistas, foram levados à tundra, alinhados ao longo de fossas preparadas e metralhados. Maria M. Joffé escutou nesse dia o nome do primeiro da lista dos fusilados, Grigoria Ia. Iakovin, o “professor vermelho”, cujo nome era seguido pelos de outros membros do comitê de greve (133). Dia após dia, as execuções continuaram da mesma forma durante mais de dois meses. O homem que foi encarregado por Stalin para a “solução final” do problema da Oposição de Esquerda se chamava Kachketin. Maria M. Joffé, que foi interrogada por ele durante meses, atribuía-lhe dezenas de milhares de vítimas.

Em seu comovente testemunho, no qual revive a luta cotidiana contra a repressão de personalidades excepcionais, como o eram seus camaradas bolcheviques-leninistas Konstantinov, Patskachvili e Zina Kozlova, não fez senão um relato circunstanciado desses assassinatos.

Foi um homem, um antigo detido, quem relatou em 1938 a primeira execução coletiva que acabara de testemunhar na fábrica de tijolos de Vorkuta (134). Assim relatava a vida nessas barracas:

“Tínhamos um jornal oral, Pravda por trás dos barrotes; formávamos pequenos grupos, círculos, onde havia muita gente instruída e inteligente. De vez em quando publicávamos uma folha satírica. Vilka, o delegado de nossa barraca era jornalista, e as pessoas se dedicavam a desenhar sobre as paredes. Também ríamos. Havia muitos jovens” (135).

Por sua vez, conta Maria Joffé:

“A fábrica de tijolos havia reunido sob o seu teto desconjuntado ao melhor da elite criadora dos campos; a nata dos espíritos valentes e audazes com seus argumentos e sua formação, sua capacidade de dar respostas lógicas, às vezes proféticas, havia aportado um dinamismo vital à existência estática, intolerável nessa barraca incrivelmente gélida e cheia de enfermos (...). A acidez penetrante de seu sarcasmo revelava a verdade sobre uma realidade aparentemente incompreensível (...). Um dia foi-lhes fornecida uma ração de tabaco: ‘Preparem-se para uma viagem’. Isso foi como uma injeção de elixir vital (...). Precipitaram-se nesse dia saudando o ar puro, por um caminho branco e possivelmente para uma nova vida. Prepararam rapidamente seus pertences: eram pessoas que sabiam rir e sentir prazer (...). Menos de uma hora depois, como um tronco com as raízes cortadas, caía o primeiro corpo. Depois dele, uma fila inteira de homens e mulheres como ramos muito frágeis, como massas informes, caía em desordem no fundo da trincheira. E o peso dos cadáveres que vinham depois terminaria recobrindo-os”.

“Os que dispunham de um pensamento autêntico são sempre a minoria. São dos que se desembaraçam primeiro. Um! Dois! Fogo! Sem se moverem, próximas a sua tumba, cantavam ‘Turbilhão do Perigo’... As palavras das canções se confundiam com o estrondo das balas”.

“Kachketin, parado a um canto, dava o sinal aos verdugos. Tudo era apagado, abatido, os cânticos, os espíritos, as vidas. Pisoteavam-se páginas de histórias inconclusas. Quanto poderia dar eles ainda à revolução, ao povo, à vida? Mas já não estão. Definitivamente e sem retorno possível” (136).

 
Primeiro balanço

Este breve ensaio histórico pareceu-nos necessário para apresentar documentos de imenso interesse. Nesta documentação encontramos um complemento necessário para nossa recopilação preparada para a apresentação das Obras de Trotsky. Nosso objetivo ver-se-ia em grande parte alcançado se provocasse em futuro próximo trabalhos sistemáticos sobre a Oposição de Esquerda na URSS, especialmente através dos cadernos de exílio de Trotsky.

Mas parece-nos que aprendemos ao longo deste caminho. Sem dúvida, o cineasta que empreendesse agora a tarefa de contar esta história não poderia concluí-la sem a sequência descrita por Maria Joffé sobre a sorte de Faina V. Iablonskaya, “bela e (que) mantinha a cabeça erguida, apesar de ter suas mãos atadas às costas” (137), debaixo do vestido manchado de sangue da antiga Konsomol Raia V. Lukinova, que jazia sem vida na neve (138). Mas nossa concepção da história vai mais além da mera reconstrução de uma das mais espantosas tragédias deste século, rico, não obstante, em genocídios.

Era comum, depois de alguns anos, durante os anos 1930, particularmente no caso dos historiadores norte-americanos, apresentar Trotsky como “completamente isolado” da realidade soviética, até o ponto de haver ignorado totalmente a crise do aparato e a pré-história do assassinato de Kirov. As descobertas dos invetigadores do Instituto Leon Trotsky sobre o “bloco dos oposicionistas” de 1932 revelam o quanto incorretas eram semelhantes interpretações.

Cabe acrescentar que, até o presente, os historiadores da União Soviética e do movimento comunista – incluído Isaac Deutscher (139) – interessaram-se muito mais por Trotsky que pelos trotskistas e, de certa forma, participaram do mesmo enfoque.

Recentemente, uma escola de pensamento – que não tem nada a ver, pelo menos com certa forma de análise histórica – esforçou-se, com resultados infelizes, por demonstrar que o “trotskismo” não era na realidade mais que uma simples variação do “bolchevismo”, pouco diferenciada, em última instância, do “estalinismo” que surgiu igualmente dele, e, desta forma, condenado a desaparecer a partir do momento em que seus dirigentes se encontravam “isolados” desse poder que era, em suma, sua única razão de ser...

Ambas as interpretações, nutridas certamente por orientações políticas e preocupações de princípio muito distantes entre si, colocam, não obstante, um tema infinitamente mais velho e mais constante, alimentado pelos adversários de direita do “trotskismo” – a social-democracia e o estalinismo – que explicam o desaparecimento “final” dos trotskistas da URSS por seu “sectarismo”, ou, dito com outras palavras, por uma atitude consistente em negar a realidade – convertendo-os em uma espécie de lixo da História.

Parece-nos que os documentos, nos quais se baseia o presente estudo, fazem igualmente justiça contra estas últimas interpretações. Eles mostram, com efeito, que a corrente encarnada na URSS pela Oposição de Esquerda constituiu, no mínimo, um fenômeno importante e permanente na vida política desse país até o ano de 1940, para não dizer um fator frequentemente determinante. Será necessário recordar, sobre isto, a homenagem prestada a seus adversários trotskistas dos anos 1930 pelo chefe da “Orquestra Vermelha”, Leopold Trepper, estalinista desencantado – uma homenagem valiosa, sem dúvida, para muitas gerações?

“Os trotskistas têm o direito de acusar aos que, em outros tempos, bailavam ao som do compasso. Que não esqueçam nunca que os trotskistas possuíam, em comparação com nós, a vantagem imensa de ter um sistema político coerente suscetível de substituir o estalinismo, e de aferrar-se a uma convicção profunda sobre a Revolução traída. Eles não “confessavam”, porque sabiam que suas confissões não serviriam nem ao partido nem ao Socialismo” (140).

Ainda hoje, na URSS, não se deu nenhuma explicação coerente que respeite a realidade concreta sobre os crimes estalinistas dos anos 1930, nem sobre a história do próprio estalinismo. Ainda hoje a interpretação “trotskista” deste período da história soviética está proscrita na URSS para os investigadores e para uma geração de jovens historiadores que não conheceram Stalin. É realmente possível acreditar que isto pudesse acontecer se os trotskistas dos anos 1930 e as interpretações que eles aportavam estivessem tão distanciados da realidade da sociedade soviética de então... e de hoje?

Não retornaremos aqui ao assunto da permanência da corrente trotskista na base, nas fábricas e inclusive nos kolkozes, mesmo no período posterior à destruição de sua organização como tal, uma permanência testemunhada pelos descobrimentos de Merle Fainsod nos arquivos de Smolensk (141), e que confirmam hoje os achados feitos nos cadernos do exílio de Harvard. Queríamos apenas sublinhar, a modo de conclusão, que as cândidas almas que tratam hoje de fazer crer que o “trotskismo” era uma “variante leninista” muito próxima ao estalinismo têm muitas dificuldades para explicar fatos que pensamos ficam desde já irrefutavelmente estabelecidos. Acreditamos, com efeito, poder afirmar: 1) que os trotskistas foram, entre 1928 e 1940, os únicos adversários conseqüentes do estalinismo com apoio popular: 2) foram esses adversários que aterrorizaram – mesmo depois de seu extermínio – a Stalin e os seus; 3) contra eles foi necessário empregar os métodos mais radicais, a “solução final”, para poder liquidá-los.

Se os trotskistas fossem sectários sem esperança, doutrinários realmente desligados da vida política e da massa da população soviética, seria de fato impossível entender, por exemplo, porque Stalin lançou toda a repressão de massas, desde o final dos anos 1930 – os processos de Moscou, o grande expurgo –, sob o signo da luta contra todos os que estavam comprometidos com o bloco de 1932 entre as diversas oposições do partido e os trotskistas. Kruschev, como bom cúmplice, guardou cuidadosamente o segredo, mas não deu ele involuntariamente a chave da resposta a esta questão ao revelar a existência do famoso telegrama de setembro de 1936, no qual Stalin acusava à GPU de ter um atraso de quatro anos? Seria da mesma forma absolutamente impossível compreender porque foi para os bolcheviques-leninistas que Stalin projetou o sistema dos “campos de concentração”, encarregados de suplementar as prisões abarrotadas. E por que, quando as prisões e os campos estiveram superlotados com centenas de milhares de novos detidos, foi aos trotskistas que o regime decidiu separar dos outros, criando para eles esses campos e prisões especiais que os isolavam – a eles e somente a eles – da massa de detidos para quem eles eram evidentemente os únicos capazes de oferecer-lhes uma interpretação e motivos para combater?

Se os trotskistas fossem “sectários” impenitentes ou “sonhadores” utópicos, distanciados da realidade, seria possível acreditar que teria sido necessário, para acabar com sua existência – que era em si mesmo uma forma de resistência – massacrá-los até o último em Vorkuta? Sobre os milhões de detidos liberados dos campos de concentração depois da morte de Stalin, os testemunhos dão conta da sobrevivência de mencheviques, socialistas-revolucionários, zinovievistas, direitistas, algumas dezenas, sem dúvida, de cada categoria, enquanto que os trotskistas sobreviventes podem ser contados com os dedos de uma única mão (142). Foi isto verdadeiramente casual?

Os historiadores, inclusive os não estalinistas e até os anti-estalinistas, em seu conjunto, deram uma versão dos anos 1930 no fundo paralela à que criticamos aqui e, em última instância, próxima à que era evidentemente necessária para o regime estalinista. Negar a existência de um bloco de oposições; negar, como alguns o fizeram, a própria existência de grupos comunistas de oposição; não ver a realidade em que os trotskistas eram solicitados por todas as outras oposições comunistas para entrar em um “bloco” com eles, não seria esta uma forma particular de contribuir para o isolamento dos trotskistas, para minimizar o seu papel? Victor Serge, em seu regresso da União Soviética em 1936, critica vivamente a análise da imprensa soviética feita por Trotsky, em que este acreditava poder avaliar em uma dezena de milhares o número de seus partidários – desorganizados – golpeados pela repressão que se iniciava em grande escala.
A opinião mundial, entre 1936 e 1938, foi golpeada por um número elevado de velhos bolcheviques que “confessavam” sob o chicote do procurador Vychinsky, renegavam de si mesmos e cobriam Trotsky de injúrias rituais. Uma análise mais minuciosa permite demonstrar, não obstante, que inclusive um I. N. Smirnov, quebrado por meses de interrogatório, encontrou a maneira de escapar às falácias do procurador e de dar respostas que eram na realidade uma condenação das teses da acusação e uma defesa do próprio Trotsky (143).

Mas o que significa que não se tenha pensado em nomear junto aos que “confessaram” os que não “confessaram”? O silêncio final dos Lominadzé, dos Sten e dos Riutin, dos Preobrajensky, Smilga, Mdivani e ainda de um Sosnovsky não é tão eloqüente quanto o dos “bolcheviques-leninistas” autênticos? Quantos destes “capituladores” morreram sem dar a Stalin a “confissão” que tentou extrair-lhes por todos os meios de coerção – brindando, por sua vez, a Trotsky a suprema homenagem de rejeitar a última capitulação? Os trotskistas, a quem alguns querem a todo custo apresentar como “isolados”, não estão, para a história, ligados a essas dezenas de milhares de bolcheviques que, como eles, preferiram a morte à confissão, desonrosa para eles próprios e para a causa que serviam?

A questão parece-nos cada vez mais compreensível. Os documentos que até o momento dormiram na seção fechada dos arquivos de Trotsky tiveram pelo menos o mérito, a partir do momento em que saíram à luz, de varrer todas as interpretações da história soviética que fazem dela um compartimento fechado da história universal, regida por suas próprias leis, escapando às leis gerais da história das sociedades e da luta de classes em particular.Têm, igualmente, o mérito de recolocar a história soviética em seu contexto internacional, a história mundial do século XX, e de dar-lhe à vitória hitleriana do início de 1933 com relação à URSS o mesmo significado que se lhe reconhecia até hoje com relação à história mundial. Os documentos aqui citados e que foi necessário, não sem inconvenientes, selecionar entre tantos outros tão abundantes, são o testemunho de uma estranha qualidade humana, mas também uma reflexão por sua vez única e inestimável sobre os problemas de uma sociedade em transição ao socialismo, tudo enfim que justificaria uma publicação mais exaustiva.

Permitam-nos, para finalizar, mencionar as reflexões que nos inspiram as observações de Maria M. Joffé em relação a seu companheiro Andrei Konstantinov, chamado Kostia. Ela escreve:

“As pessoas tornam-se heróis nos momentos de tensão particular, mas Kostia era sempre assim, fizesse o que fizesse, muito simplesmente, muito naturalmente (...). Suas palavras e seus atos eram parte integrante de sua pessoa e não poderiam ser diferentes – era simplesmente ele próprio (...). A vida de Kostia se funde com seu objetivo. Ele não o abandonaria jamais” (144).

Ao término deste trabalho pareceu-nos que a mais sangrenta utopia que se possa atribuir a Stalin é a de haver acreditado que se poderia eliminar a todos os Kostia da face da terra. Enquanto que é a humanidade própria, no curso de sua luta para dirigir o seu próprio destino, a que produz os Kostia de todos os países.


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Notas:
 
Oito volumes foram publicados ao cabo de dois anos, abarcando o período que vai de março de 1933 a março de 1936.
Christian G. Rakovsky (1873-1941), socialista romeno, búlgaro, membro do CC bolchevique depois da revolução e presidente do Conselho de Comissários do Povo da Ucrânia. Foi embaixador da URSS na França de novembro de 1925 a outubro de 1927. Evguenii A. Preobrajensky (1886-1938), antigo secretário do partido, dirigente da Oposição de Esquerda, da qual foi teórico em matéria econômica; esteve destinado em Paris durante certo tempo em 1927.
Iuri L. Piatakov (1890-1937); filho de um industrial, primeiro anarquista, havia se unido ao partido em 1910; dirigente do partido na Ucrânia durante a guerra civil; foi um dos primeiros da Oposição de Esquerda em 1923. Esteve destinado em Paris durante alguns meses em 1926.
Simon I. Kanatchikov (1879-1940); velho bolchevique ligado a Zinoviev; foi, em 1927, chefe da agência de imprensa soviética na Checoslováquia. Os informes da polícia checa da época acusam-no formalmente de haver financiado à Oposição nesse país e de haver assistido à reunião de oposicionistas organizada por Neurath em 23 de dezembro de 1927.
Ruth Fischer era pseudônimo militante – convertida em verdadeira identidade – de Elfriede Eisler (1895-1961), quem havia sido a chefe da linha de “esquerda” do PC alemão de 1920 a 1924, e uma das chefas deste partido, graças a Zinoviev, e da Interncional Comunista em 1924-25. Excluída do partido em 1926, havia fundado o Leninbund que se pretendia a réplica “alemã” da Oposição Unificada da URSS, mas a deixou depois da capitulação de Zinoviev e de Kamenev ante Stalin. Refugiada nos EUA durante a II Guerra Mundial publicou ali, em 1948, seu livro Stalin e o comunismo alemão, um estudo muito polêmico que mistura recordações e testemunhos pessoais.
Fischer, op, cit., p. 594. Aleksandr Hertzsberg (1892-193?), velho bolchevique de Leningrado. Deve ter sido excluído em 1927; logo reintegrado ao mesmo tempo em que Zinoviev e Kamenev. Foi condenado a seis anos de prisão em 1935 no mesmo processo destes dois homens.
Ibidem, p. 586-588. Georgi I. Safarov (1891-1942); bolchevique em 1908; emigrado na França, em seguida na Suíça durante a guerra. Havia sido especialista da IC em questões orientais. Esteve lçigado ao grupo de Zinoviev e foi enviado a Pequim como diplomata desde 1926. Havia se mudado para Estambul em 1927.
Ibidem, p. 587. Ruth Fischer precisa que N. N. Perevertsev tinha uma autorização que lhe permitia viajar gratuitamente por todas as linhas ferroviárias européias. Dispomos de poucos dados sobre este homem que foi um dos dirigentes da Oposição na Ucrânica e cujo pseudônimo militante era “Pierre” ou “Peter” na Europa Ocidental. Ruth Fischer o qualifica de “zinovievista”, mas capitulou muito depois dos zinovievistas depois de ter sido encarcerado em Verkhneuralsk, onde Iakovin o descreve com um “jovem” e onde foi um dos alentadores do grupo de tendências esquerdistas do Voinstuuiouchtchy Bolchevique (Bolchevique Militante).
Ibidem. Não sabemos nada destes três homens.
Ibidem, p. 587, 604. Eleazar B. Solntsev (1900-1936); militante da geração de outubro, economista, membro da Oposição “trotskista” de 1923, era considerado como um dos jovens dirigentes da segunda geração da Oposição. Havia trabalhado algum tempo como economista na Amtorg nos EUA, antes de ser destinado a Berlim, de onde foi chamado, em 1928, para partir imediatamente ao “cárcere de isolamento”. Ruth Fischer se equivoca quando situa sua detenção em torno de 1935; estava preso em Verkhneuralsk já em 1930 e um informe de um de seus camaradas precisa que ele vinha do “cárcere de isolamento” de Cheliabinsk, onde foi provavelmente detido em 1929, depois de ter sido encarcerado em Petropavlovsk. [Um seu informe sobre a Oposição no estrangeiro, datado de oito de novembro de 1928, foi publicado no número 7/8 dos Cadernos Leon Trotsky – nota do Tradutor espanhol].
Ibidem, p,604. Encontramos nos papéis do exílio de Harvard numerosas alusões a esta “conferência de Berlim”, que constituiu sem nenhuma dúvida uma etapa importante na história da Oposição de Esquerda na IC, mas, na realidade até o presente, é ainda Ruth Fischer quem, em vinte linhas, dá a maior quantidade de informações a respeito.
Kharin, conhecido na Oposição de Esquerda sob o nome de guerra de “Joseph”, capitulou em 1929. [Um artigo sobre este assunto foi publicado no número 7/8 de Cadernos Leon Trotsky – N. do Tradutor espanhol].
Andrés Nin Pérez (1892-1937), professor catalão, militante dos J. S., logo secretário de CNT, chegou à URSS em 1920 e permaneceu ali como secretário da Internacional Sindical Vermelha. Havia sido expulso da URSS em 1930 e foi assassinado na Espanha pela GPU em 1937. Sobre sua ligação com Sandália Junco (1902-1942), de quem a lenda diz que golpeou publicamente a Stalin em uma recepção oficial, e que foi assassinado por um comando do PC em Cuba, ver Robert J. Alexander, El trotskismo em latinoamérica, p. 217.
De Rodolfo Coutinho, educador, membro do Comitê Central do PC do Brasil em sua fundação, delegado em Moscou de 1924 até 1927, sabemos apenas que estava ligado à Oposição de Esquerda em seu início e que morreu prematuramente. Ver também John F. W. Dulles, Anarquistas e Comunistas no Brasil, p. 421.
Liu Renjing (nascido em 1899) uniu-se em 1920 ao primeiro grupo marxista chinês de Li Dazhao, e participou no congresso de fundação do PCC. Estudando na URSS, uniu-se à Oposição de Esquerda com a maioria de seus camaradas e militou sob o nome de “Lensky”. Em sua saída da URSS, fez-se chamar de “Nolsey”, em seguida de “Niel Sih”.
Vladislav Burian (1901-193?), socialista aos 18 anos, condenado a 10 anos de prisão depois da greve geral de 1920, foi eleito para o primeiro executivo do Partido Comunista Checo. Liberado em 1922, foi separado em 1925 e trabalhou na URSS como jornalista sob os pseudônimos de Rilke, Rülke e Rielke. Uniu-se à oposição russa em 1926. Karel Fischer, chamado Michalec (nascido em 1901), socialista em 1918, foi dirigente das Juventudes Comunistas checas; era zinovievista. O sérvio Veja Vujovic (1895-1937), antigo estudante na França, havia fundado ali as Juventudes Comunistas. Dirigente da Internacional das Juventudes Comunistas era também um dos “internacionais” do PC iugoslavo. Wolfgang Salus (1909-1953), filho de conhecido escritor, militante da Juventude Comunista, depois de 1934, foi, em 1927, responsável pela organização da Juventude Comunista de Praga. Foi por ocasião de uma conferência internacional que, segundo seus conhecidos, encontrou o próprio Trotsky e se uniu as suas posições.
James Patrick Cannon (1890-1974), antigo membro dos IWW e da ala de esquerda do PS americano, era junto com W. S. Foster o dirigente de uma das três “frações” que disputavam entre si a direção do partido comunista nos EUA: Maurice Spector (1895-1968), nascido em Nikolaiev, havia emigrado muito jovem para o Canadá com seus pais. Havia começado a militar em 1917; uniu-se ao PC em 1921 e foi logo presidente de sua ala “legal”, o Workers Party do Canadá, em 1922. Havia rejeitado qualquer tipo de sanção do partido contra os militantes canadenses que simpatizavam com a Oposição russa.
Cannon escreveu o relato desta descoberta em History of American Trotskysm (p. 49 da edição de 1979).
Recordemos que estes “cadernos do exílio” que constituíram durante muito tempo a “seção fechada” dos arquivos de Trotsky, depositados na Houghton Library, biblioteca do Colégio de Harvard, foram abertos ao público em dois de janeiro de 1980.
Grigori E. Radomylski, chamado de Zinoviev (1883-1936) e Lev. B. Rosenfeld, chamado de Kamenev (1883-1936), velhos bolcheviques que, em 1923-25, haviam formado com Stalin a troika contra Trotsky, haviam arrastado detrás deles, em 1925, para a “nova oposição”, ao conjunto da organização do partido em Leningrado. Em 1926, à petição de Trotsky, haviam reconhecido os métodos fracionais que haviam utilizado através da troika contra os 41 e chegaram a um acordo de fusão com a Oposição de 1923 dirigida por Trotsky, dando nascimento à Oposição Unificada.
Sobre esta provocação organizada pela GPU contra a Oposição Unificada, ver os documentos reproduzidos nos Cadernos Leon Trotsky, número 4, p. 21-37.
Cf. documentos, PP. 71-73.
Ivan T. Smilga (1892-1938), membro do partido em 1907; filho de um camponês letão, foi o Benjamin do CC de outubro de 1917 e o homem de confiança de Lênin antes da insurreição. Presidente do sovíete da frota do Báltico trabalhou em seguida no Exército Vermelho durante a guerra civil e finalmente na administração econômica.
Cf. p. 8.
Boris M. Eltsin (1875-1937), membro do partido em 1899, bolchevique em 1903, foi presidente do sovíete de Ekaterinoslav em 1917 e membro do executivo pan-russo dos sovíetes. Foi desde 1923 um dos dirigentes da Oposição de Esquerda. Sobre o seu papel no “centro”, cf. Victor Serge, Memórias de um Revolucionário (Seuil, 1951, p. 265, 334).
“Iz Orenburgskoi sselki”, Biblioteca da Universidade de Harvard, 17399. Embora o catálogo indique que o autor deste documento não foi identificado, trata-se evidentemente de Victor Serge, o que se confirma confrontando sua correspondência.
V. Serge, op. Cit., p. 335 e “Destino de uma Revolução”, p. 120.
“Carta de Moscou”, Biulleten Oppositsii, números 1-2, p. 17-18.
Rosa Levine-Meyer, “Inside German Communism”, apêndice “Jacovin and Pankratova”, p. 209-213. Grigori Ia. Iakovin (1898-1938) era historiador e diplomado do Instituto dos Professores Vermelhos.
Ilya V. Migueladzé, chamado “Vardin” (1890-1943), membro do partido desde 1907, foi um dos dirigentes do partido e dos sovíetes de Saratov em 1917; logo se uniu à oposição de Zinoviev antes da oposição unificada.
Leonid P. Serebriakov (1890-1937), metalúrgico, bolchevique em 1905, foi várias vezes posto em prisão e deportado sob o czarismo; foi secretário do CC, membro da Oposição de Esquerda em 1923. Vladimir. A. Antonov-Ovseenko (1884-1938); primeiro foi oficial, condenado à morte por sua participação como menchevique na revolução de 1905; conseguiu se evadir e colaborou com Trotsky no exílio, unindo-se ao partido junto com ele em 1917. Foi responsável político do Exército Vermelho. Nikolai N. Krestinsky (1883-1938), antigo estudante, bolchevique em 1903, havia sido secretário do CC e membro da Oposição desde 1923.
Carta de L. S. Sosnovsky a Ilya Vardin, de 30 de maio de 1928, Biulleten Oppositsii número 3-4, setembro de 1929, p. 19. Sosnovsky fazia alusão a um constume judeu nos funerais.
Camponeses médios. Durante os anos da NEP, estes haviam enriquecido, fortalecendo as pressões pequeno-burguesas no campo. No início de 1928, negaram-se a entregar trigo às cidades. Este ultimatum levou Stalin a mudar sua orientação pró-kulak por uma política de coletivização forçada no campo.
Declaração de Trotsky de 15 de dezembro de 1928 em um texto datado do mesmo dia. T 2812.
Polikarp, chamado Budu Mdivani (1877-1937), membro do partido desde 1903, membro do Comitê Revolucionário da Geórgia em 1921, esteve com a Oposição desde 1923. Sergei I. Kavtaradzé (1895-1971), igualmente antigo bolchevique georgiano, havia sido Comissário de Justiça, logo presidente do conselho de comissários do povo da Geórgia. Pertencia igualmente à Oposição de Esquerda desde 1923. Aleksandr K. Voronsky (1834-1943), bolchevique desde 1904, jornalista e crítico literário, havia publicado depois de 1921 e até 1924 a famosa revista literária Krasnaya Nov. Yakov N. Drobnis (1890-1937), membro do partido em 1906, membro do CC ucraniano durante a guerra civil, havia sobrevivido ao pelotão de execução, havia formado inicialmente parte da oposição “decista”. D. S. Gaievsky era um veterano do Exército Vermelho. Sobre Grunstein, cf. p. 28 e sobre Pevzner, p. 31.
Biblioteca da Universidade de Harvard, t. 3721. Entre os primeiros textos do exílio merece menção A crise do bloco de centro-direita (20 de março) e a Carta aos trabalhadores da URSS (27 de março).
Biblioteca da Universidade de Harvard, t. 15264.
O relato deste encontro foi publicado no número 7/8 dos Cadernos Leon Trotsky (N. do tradutor espanhol).
Ivan N. Smirnov (1881-1936), filho de um camponês, membro do partido em 1899, ferroviário, em seguida mecânico, foi um dos organizadores do partido antes da guerra, agente da revolução de fevereiro em Tomsk, de outubro em Moscou. Membro do Conselho Militar Revolucionário, chefe do V Exército, membro do comitê revolucionário da Sibéria, foi apelidado por Lênin de “a consciência do partido”. Entrou na Oposição em 1923 enquanto era Comissário do Povo dos Correios e Telégrafos. Era conhecido por seu temperamento conciliador. Aleksandr C. Beloborodov (1891-1938), filho de operários, eletricista, membro do partido em 1907, dirigente dos bolcheviques dos Urais, havia tomado em 1918 a responsabilidade da execução sumária do czar e de sua família. Era, igualmente, membro da Oposição desde 1923. Sergei V. Mratchkovsky (1888-1936), nascido na prisão, bolchevique em 1907, chefe das guerrilhas durante a guerra civil, em seguida comandante de distrito militar, havia se unido à Oposição de Esquerda em 1923. Foi detido e excluído do partido em 1927 pelo assunto da gráfica clandestina.
Lev Kopelev, No Jail for Tought (1977), p. 108-109.
Cf. documentos, pp. 78-86. Para V. V. Kossior e M. N. Okudjava, cf. p. 29.
Cf. documentos, PP. 87-89.

[43] I. Deutscher, ”Le Prophète Hors la Loi”, p. 122.
[44] Vlatcheslav R. Menjinsky (1874-1934), estudiante de derecho, miembro del partido en 1902, luego periodista. Comisario de finanzas en octubre de 1917, vice-presidente de la Cheka en 1919, sucedió a Dzerjinsky a la cabeza de la GPU en 1926. Meyer A. Trilisser (1883-193?), miembro del partido en 1901, luego responsable de la organización militar clandestina, fue secretario del soviet de Irkutsk en 1917 y participó en la guerra civil de Siberia. Nombrado vice-presidente de la GPU en 1926, Menjinsky y Trilisser eran los superiores jerárquicos de Blumkin.
[45] ”Carta de Moscú”, Biulleten Oppositsii número 9, febrero 1930, p. 9. Una copia del mensaje confiado a Blumkin por Trotsky se encuentra en Harvard. (Se publicó en el número 7/8 de los Cahiers León Trotsky – N. de T).
[46] V. Serge, ”Destino de una Revolución”, p. 116.
[47] V. Serge, ”Memorias...”, p. 276-277.
[48] Ibidem, p. 265.
[49] Ibidem.
[50] A. Ciliga, “En el País de la Gran Mentira”, p. 182-183. Ante Ciliga (nacido en 1896), croata, devenido italiano tras los tratados, dirigente del PC yugoslavo, establecido en la URSS en 1926, fue arrestado en 1930; fue liberado en 1935 sin duda por su nacionalidad italiana. Publicó recuerdos en distintas revistas, y luego, en 1936, en su libro, ”En el País de la Gran Mentira”.
[51] Ibidem, vol. II, p. 294-295.
[52] Avelii A. Enukidzé (1977-1937), hijo de campesino georgiano, ferroviario, miembro del partido en 1898, del ejecutivo de los soviets en 1917, secretario del ejecutivo a partir de 1923, fue excluido del partido y relevado de todas sus responsabilidades por ”inmoralidad” en 1935, arrestado, condenado y ejecutado en 1937.
[53] Stanislav V. Kossior (1889-1939) era el mayor de los tres hijos bolcheviques de un obrero agrario polaco. Siderúrgico, entra en el partido en 1907, combatió en Ucrania durante la guerra civil, luego ocupó responsabilidades del partido en Siberia y en Ucrania. Fue arrestado en 1936 y ejecutado un año después.
[54] En el anexo del nº 6 de los Cahiers León Trotsky se publicaron las dos declaraciones de bolcheviques deportados, en las que es imposible dudar de que él fue el inspirador (N. de T).
[55] V. Serge, ”Memorias...”, p. 227.
[56] M.M. Joffé, ”One Long Night” (Londres 1978).
[57] Estos nombres fueron sacados de diferentes números del Biulleten Oppositsii, particularmente del número 50, de mayo de 1936, pp. 17-20.
[58] ”Gevorkian Sokrat”, Biulleten Oppositsii número 51, julio-agosto 1936, p. 16.
[59] V. Serge, ”Destino...” p. 126. Vassili F. Pankratov nació hacia 1894. Desapareció después de 1938.
[60] Biulleten Oppositsii número 50, mayo 1936, p. 18.
[61] ”El Renacimiento del Socialismo en la URSS. Memorias de un Bolchevique-leninista”, p. 131.
[62] V. Serge, “Memorias...”, p. 227.
[63] ”La Muerte de Solntsev”, Biulleten Oppositsii números 50, mayo de 1936, p. 17.
[64] The Militant, 26 de diciembre de 1931.
[65] V. Serge, ”Destino...”, p. 123-130.
[66] Patekachvili y Milechin son citados por MM Joffé, op. cit. y por ”MB” en ”Los Trotskistas en Vorkuta”, Sotsiialistjtcheskii Vestnik, noviembre-diciembre 1961.
[67] A. Ciliga, op. cit., p. 238-239.
[68] V. Serge, ”Destino...”, p. 128-130.
[69] MM Joffé, op. cit., p. 58. En lo concerniente a la participación de los obreros en la Oposición de Izquierda, Dante Corneli, un comunista italiano refugiado, miembro de la Oposición de Izquierda, que capituló en 1929, da en sus memorias, ”Le Ressuscité de Tivoli”, algunas informaciones interesantes sobre la fábrica Aviopribor de Moscú que fue uno de los bastiones de la Oposición unificada después de haberlo sido de la Oposición de 1923: encontró en prisión al mecánico Petukhov. Menciona por otra parte una resolución de su fábrica de Rostov, Krasnaia Aktsia, exigiendo en 1926 la restauración de las normas democráticas en la vida del partido. El mismo, en el campo y en prisión encontró numerosos obreros muchos de los cuales provenían de la fábrica de rodamientos Kaganovitch de Moscú, fundada con trabajadores de Aviopribor.
[70] Vladimir M. Smirnov (1887-1937), miembro del partido en 1907, dirigente en Moscú en 1917, comisario del quinto y luego del diecisiete ejército, trabajó luego vinculado a la economía. ”Decista” en 1920, se unió a la Oposición unificada en 1926, luego rompió con ella. Timotei V. Sapronov (1887-1939), pintor en construcciones, miembro del partido en 1912, impulsor del grupo ”decista”, había capitulado en 1928, luego fue arrestado nuevamente.
[71] Pueden encontrarse en los ”papeles de exilio” de Harvard dos textos, copias, muy cercanos la una de la otra que son informes sobre la vida política en la ”cárcel de aislamiento” de Verkhneuralsk. Uno (número 16927) está firmado por Iakovin y Ardachelia, fechado el 11 de noviembre de 1930, el otro (número 16832), firmado por ”A.” – evidentemente Ardachelia y no fechado. Parece que los dos hombres hubieran dejado la ”cárcel de aislamiento” y encontrado enseguida una posibilidad de hacer llegar un informe a Trotsky, salvo la referencia a Ciliga, las informaciones dadas en las páginas siguientes provienen de los textos de Ardachelia y Iakovin y hemos evitado multiplicar las notas de pie de página.
[72] A. Ciliga, op. cit., p. 170.
[73] Ibidem, p. 237, (SFIO-Sección Francesa de la Internacional Obrera – Partido francés de la Segunda Internacional. En 1936, después de largas discusiones, Trotsky convenció a la sección francesa de la IV Internacional, la LCR, de aplicar la táctica del entrismo en la SFIO, con el objetivo de arrancarle una fracción de izquierda cuando los trabajadores franceses se estaban radicalizando y entrando en masa en ese partido – N de T.) El autor precisa que los trotskistas han estado informados, pero no han ”sabido interpretar” la entrada en la SFIO. Esa no es la opinión de Víctor Serge que escribe a su llegada a Francia: ”La entrada de nuestros camaradas en los partidos socialistas, que yo sepa, no ha provocado vivas discusiones (...) Solamente se han preguntado si dentro de los partidos socialistas nuestros camaradas podrían mantener su fisonomía política. Con esta condición, hemos estimado que era justo unirnos a los grandes partidos de masas” (carta a Trotsky del 27 de mayo de 1936, Biblioteca del Colegio de Harvard, 50133, con el permiso del Colegio de Harvard).
[74] Iakovin y Ardachelia subrayan en su informe del 11 de noviembre de 1930, luego de haber mencionado que las cartas de Trotsky han llegado a la ”cárcel de aislamiento” con dos y cuatro menes de retraso: ”Estos retrasos nos han sido muy útiles; nos han permitido verificar la línea y las posiciones que habíamos elaborado y formulado por nosotros mismos. Y frecuentemente hemos constatado con placer que, frente a los mismos acontecimientos, el desarrollo del pensamiento y las formulaciones eran los mismas en las islas del Ural que en Prinkipo... Es para nosotros la alentadora prueba de los lazos que unen a nuestra corriente más allá de las distancias.” (Biblioteca del Colegio de Harvard, 16927, con el permiso del Colegio de Harvard).
[75] Se trata del texto publicado en el anexo del nº 6 de los Cahiers León Trotsky (N. de T), de largos extractos titulados “La Crisis de la Revolución” sacados de R Q. donde llevaban la firma de ”X.Y.Z.”. Este ”Texto de los Tres”, llamado también ” Tres tesis”, fue identificado a través de una serie de verificaciones basadas en la declaración de Trotsky ante la comisión Dewey.
[76] A Ciliga, op. cit, p. 176-177 y 102.
[77] Ibidem, p. 170 y 236.
[78] Ibidem, p. 237.
[79] Ibidem.
[80] A. Ciliga, op. cit., p. 235, sitúa esta unificación en el verano de 1933 e indica que Solntsev y Kamonetsky fueron, cada uno por su lado, sus promotores. Plantea también la formación de un grupo de trotskistas de ”extrema derecha” (Melnais, Barkin, Millmann) y, por otra parte, la unificación, al margen del “conjunto”, de los elementos izquierdistas (ex-”militantes” y ex-”decistas”) en una ”federación de comunistas de izquierda”.
[81] Leonid K Ramzin (1877-1948), ingeniero y profesor, condenado a muerte en 1930 por haber ”confesado” ser uno de los dirigentes de los saboteadores y conspiradores del ”partido industrial”, vio su pena conmutada a diez años de prisión en el curso de los cuales continuó sus trabajos científicos. Retomó su cargo de educador en 1944.
[82] Cf. la carta de KM Tsintsadzé a MN Okudjava, 10 de febrero de 1930, Harvard, 15526, cf. documentos, p. 115-120.
[83] A. Ciliga, op. cit.,p. 179-200.
[84] Cf. documentos, p. 90-103.
[85] La carta de Khotimsky y Cheinkman está incluida en una correspondencia de la URSS firmada L. Trigubov (Harvard, 17308 infra, documentos, p. 177). Trigubov, que Ciliga presenta como un viejo militante de Kiev, es presentado por Sedov como ”el corresponsal en Moscú de la Oposición”.
[86] Biulleten Oppositsii número 14, agosto de 1930.
[87] A. Ciliga, op. cit., p. 197.
[88] Ibidem, p. 198-200.
[89] Ibidem, p. 213. Davtian, que había pasado muchos años en Verkheuralak y había logrado evadirse de la URSS en 1935, hizo para la comisión Dewey una declaración que confirma lo señado sobre este punto por Ciliga. Bajo la falsa identidad de Manukian, este militante armenio se enroló durante la guerra en el grupo FTP-MOI dirigido por Manuchian e inmortalizado luego como el El Cartel Rojo, fue condenado a muerte y ejecutado con sus camaradas de combate.
[90] Ibidem.
[91] Llamamiento de Taray al proletariado mundial, La Verité, 11 de octubre de 1935.
[92] Cf. documentos, p. 90-104.
[93] Serge a Trotsky, 30 de mayo de 1930, Harvard 5005.
[94] Naville a Trotsky, 28 de agosto de 1931, ibidem, 9503.
[95] Trotsky a Shachtman, 31 de octubre de 1930, ibidem, 1082.
[96] Cf. n. 12.
[97] ”Nina V Voroskaia”, Biulleten Oppositsii número 19, marzo de 1931, p. 36. Nina V Vorovskaia (1908-1931) era la hija del viejo bolchevique Vaclav V Vorovsky (1871-1923), un antiguo miembro de Iskra devenido diplomático y asesinado en Lausana por un Blanco.
[98] Urbahns a Trotsky, 25 de mayo de 1929, Harvard, 5616.
[99] Sedov a Trotsky, ibidem, 5482.
[100] Meichler a Sedov, 9 de octubre de 1930, ibidem, 12769.
[101] Sedov a Trotsky, ibidem, 5482.
[102] Karl Grohl (1896-1979), militante del KPD bajo el nombre de Friedberg – responsable del aparato militar después de 1919- se adhirió clandestinamente en 1930 a la Oposición de Izquierda y militaba en ella bajo el nombre de Karl Erde. Publicó sus memorias bajo el nombre de Karl Retzlaw: Spartacus. Aufstieg und Niedergang. Erinnerungen eines Parteiarbeiters. El relato de su misión en Moscú en Febrero de 1933 se encuentra en p. 355-356. Willy Münzenberg (1889-1940), había sido el dirigente de la Internacional Socialista de los jóvenes, luego de la Internacional Comunista de los jóvenes; como responsable de la Seguridad roja internacional había organizado rápidamente lo que se daba en llamar el ”trust Münzenberg”, un conjunto de periódicos y empresas diversas tendentes a sostener la propaganda de la I.C.
[103] Cf. Cahiers León Trotsky numero 5, p. 5-37.
[104] Vissarion V Lominadze (1898-1934), antigua dirigente de las J.C. y hombre de confianza de Stalin, que lo envió a China en 1927, se volvió contra su política en 1929 y había constituido un grupo de oposición. Se suicidó en 1934.
[105] Sergei I. Syrtov (1593-1938), miembro del partido desde 1913, había hecho una carrera de apparatchik y presidía en 1930 el Consejo de los Comisarios del Pueblo de la URSS. Más tarde director de fábrica, murió en prisión.
[106] El filósofo Jan F Sten ( -1937), (que había sido miembro de la Comisión Central de Control del partido comenzó a alejarse de la fracción estalinista en 1928. Asociado a Lominadze a partir de 1929, fue arrestado y ejecutado en 1937. Lazar A. Chatzkin (1902-1937), secretario de las J.C. de 1917 a 1922, había igualmente sido dirigente de la Internacional de los Jóvenes. Ligado a Lominadze, fue sancionado primero, arrestado y ejecutado después por las mismas razones que Nikolai.
[107] Aleksandr P. Smirnov (1877-1938), obrero, miembro del partido en 1896, ligado a los ”derechistas”, había sido Comisario del Pueblo para la agricultura. Nikolai R Eismont (18911935), abogado, miembro del partido en 1907, había militado con la Organización Interdistrital y se unió al partido bolchevique en 1917. Era Comisario en Abastecimientos de la URSS. Vladimir P. Tolmatchev (1886-1932), miembro del partido desde 1905, era igualmente un antiguo Comisario del Pueblo de la URSS y responsable de transportes.
[108] Ernst Thaelmann (1886-1944), estibador de Hamburgo, se unió al KPD a través del USPD, había sido elegido por Stalin como ”jefe” del partido alemán y aplicó sin fisuras la política que le fue dictada.
[109] Vagarchak Ter-Vaganian (1893-1956), viejo bolchevique armenio, había sido jefe de redacción de la revista Pod Znamenen Marksisma (Bajo la bandera del Marxismo). Deportado, había capitulado al mismo tiempo que Smirnov. Nikolai I. Ufimtsev (1888-1938), miembro del partido en 1906, había seguido el mismo camino que Smirnov.
[110] Mikhail N Riutin (1890-1937), educador devenido oficial durante la guerra, se había unido a los bolcheviques durante la guerra civil. Aparatchik en Moscú, había inaugurado el empleo de la violencia contra la Oposición de Izquierda.
[111] Nikolaí A. Uglanov (1886-1940), hijo de campesino, miembro del partido en 1907, ”derechista”, había dirigido la lucha contra la Oposición en Moscú antes de ser él mismo eliminado por Stalin.
[112] Aleksandr Slepkov ( - ) y Dmitri Maretsky ( - ) ambos antiguos miembros del Instituto de los profesores rojos eran los discípulos preferidos de Bujarin. Vasili M. Kaiurov (1876-1930), obrero y viejo bolchevique dirigía en 1917 la célebre barriada obrera de Viborg.
[113] Víctor Serge menciona a Konstantinov (Destino ... p. 144) como solamente ”sospechoso de ser trotskista”. En el documento 17300 de Harvard, dice que fue arrestado por palabras imprudentes a fines de 1932. MM Joffe, op. cit., p. 58, lo presenta como un ”dirigente de la Oposición de Izquierda” y nada permite poner en duda su testimonio. AM Chabion era también parte del Centro en 1932.
[114] Para un buen resumen de este asunto, ver Boris I. Nikolaievsky, Los dirigentes soviéticos y la lucha por el poder, p. 88.
[115] Carta de Sedov a Trotsky, Harvard. 5482.
[116] Biulleten Oppositsii número 33, abril 1933, p. 24-25.
[117] La declaración de Rakovsky fue publicada en las Izvestia del 20 de febrero de 1984, la de Sosnovsky el 27 de febrero.
[118] La frase clave del telegrama de Rakovsky era: ”Ante el ascenso de la reacción internacional, dirigida en último análisis contra la revolución de octubre, mis antiguos desacuerdos con el partido han perdido su sentido”.
[119] Declaración de Tarov ante la subcomisión de París, La Commune, 27 de agosto de 1937.
[120] Serge, Memorias..., p. 336.
[121] Carta de Serge a Trotsky, 27 de mayo de 1936, Biblioteca del Colegio de Harvard, 5013.
[122] A. Ciliga, op. cit., p. 103.
[123] Mordka Zborovski, llamado Marc, o Etienne (nacido en 1908) había nacido en la Polonia rusa y allí había vivido parte de su infancia. Realizó sus estudios en Francia, militante durante algún tiempo en las filas mencheviques, luego, contactado por la GPU en Grenoble, había entrado en la organización francesa y se convirtió muy rápidamente en el colaborador de confianza de León Sedov. Aunque había sido objeto de denuncias de muchos militantes, había logrado evitar todo tipo de desgracia, incluso tras el robo de los archivos y la muerte de Sedov. Emigrado a los Estados Unidos en 1941, su rol de “informador” fue descubierto y reconocido en 1955. Fue condenado en 1958 a cinco años de prisión. Parece que vigilaba y controlaba antes que nada a Sedov, pero éste, al blindar su trabajo ”conspirativo” de forma estricta, no lo había puesto en contacto con ningún soviético, de forma que sólo participaba en el envío de los boletines a otros países y no a la URSS.
[124] Se puede volver sobre este tema en las cartas de 1939 en las cuales Lola Estrin rinde cuentas de las diferencias en el seno del ”grupo ruso de Pelvis” donde cada uno busca al provocador. Literator (Arietar Serge) acusa a Dama (Elsa Reiss) o a Paulsen (Lilia Estrin) indistintamente, y Etienne saca su ventaja del juego.
[125] Ignacio S. Poretsky, llamado Ludwig, o Ignacio Rojas (1899-1937), antiguo militante del PC polaco, fue pasado al servicio de información del Ejército Rojo y llegó a ser uno de los responsables de la GPU (N.K,V.D.) en Europa occidental. En 1937 había tomado la decisión de romper con Moscú y de unirse a la IV Internacional. Fue abatido en Suiza el 4 de septiembre de 1937. Samuel Ginzburg, llamado Walter o Krivitsky. (1889-1941), era igualmente de origen polaco y desarrolló las mismas actividades que Reiss. Parece haber intentado prevenirlo de ser asesinado y de haber dudado durante mucho tiempo antes de claudicar en diciembre del mismo año. Reiss no tuvo tiempo de hacer revelaciones, aunque sus Carnets contuvieran notas interesantes. Krivitsky, por su parte, ”dictó” todo un libro.
[126] ”La Muerte de Solntsev”, Biulleten Oppositsíi, número 50, mayo de 1936, p. 17. El texto es de Serge, idéntico, quizas al pie de la letra, al que había escrito a Trotsky y Sedov sobre este tema.
[127] Serge, Memorias, p. 340.
[128] Serge a Trotsky, 27 de mayo de 1936, Biblioteca del Colegie de Harvard, 5013.
[129] Carta de Victor Serge, Biblioteca del Colegio de Harvard, 17399, con el permiso del Colegio de Harvard: una parte importante del texto fue publicada en el Biulleten Oppositsii número 51 de julio-agosto de 1934. En este texto, los mensajes son presentados como surgidos de los militantes ”A” y ”B”. Es en su carta del 5 de mayo de 1930, Biblioteca del Colegio de Harvard, 5013, donde Serge da la clave e indica que ”A” es BM Eltsine y ”B” VM Tchernykh. Agreguemos que esto identifica el documento 17399 que proviene, según el catálogo, de una persona ”no identificada”.
[130] Los tres documentos en cuestión son, según el orden de publicacíón: M.B., ”Los Trotskistas en Vorkuta”, Sotsialistitcheskii Vestnik, noviembre-diciembre de 1961; el documento “samizdat.” Renacimiento del bolchevismo en la URSS. Memorias de un bolchevique-leninista (París, 1970), y finalmente el libro ya mencionado de María M. Joffé, “One Long Night.” (Londres, 1978). Aparece un testimonio idéntico, aunque menos detallado, en las memorias del comunista italiano Dante Corneli, escrito tras veinticuatro años de deportación. Los tres primeros autores dan muchos nombres y permiten realizar muchas recopilaciones. Corneli, por su parte, no conocía más que a los obreros trotskistas que había conocido en la fábrica y algunos escasos individuos. De todas las víctimas de Vorkuta, no menciona más que el nombre de un ”trotskista” conocido, un veterano oficial del Ejército rojo que había conocido en Rostov, Ivan P. Psalmopevtsev ( -1938), del cual precisa que figuraba en la primera lista de los fusilados. La verificación es fácil; IP Psalmopevtsev, viejo bolchevique-leninista, firmante en 1927 de la ”Declaración de los 53” estaba ya en 1930 preso en Verkhneuralsk y figuraba en 1932 en la lista de los huelguistas de hambre de esa prisión.
[131] MM Joffé, op. cit., p. 18-19. Alexandre Soljenitsyn hizo muchas alusiones a la huelga de hambre de los troskistas de Vorkuta, en El Primer Circulo y en El Gulag.
[132] MM Joffé, op. cit., p. 19.
[133] Ibidem, p. 35.
[134] Ibidem, p. 41.
[135] Ibidem, p. 41-42.
[136] Ibidem, p. 44.
[137] Ibídem, p. 34.
[138] Ibidem, p. 41
[139] Isaac Deutscher (1907-1967), miembro del PC en Polonia en 1926, tras haber sido excluído en 1932 del partido se unió a la Oposición de Izquierda donde rápidamente se convirtió en uno de sus más brillantes periodistas. Emigrado a Gran Bretaña en 1939, fue primero biógrafo de Stalin, y tras la muerte de éste, fue el autor de una biografía de Trotsky en tres volúmenes.
[140] Leopold Trepper, El Gran Juego, p. 64.
[141] Los archivos de Smolensk, tanto del Partido como de la GPU, cayeron en 1941 en manos de la Wehrmacht durante su ofensiva-relámpago. Debieron caer en 1945 en manos del ejército norteamericano. Un repertorio de los documentos que contienen fue publicado en la obra de Merle Fainsod, ”Smolensk Under Soviet Pule”.
[142] Entre los invencibles que han sobrevivido a Stalin, aparte de María M Joffé misma, se puede mencionar al ”profesor rojo” N. Palatnikov y al antiguo redactor de Trud, D Vorjblovsky, ambos corresponsales de Trotsky en el exilio, a quienes el alemán Claudius volvió a encontrar en Vorkuta después de 1953. Entre los capituladores que finalmente salvaron su vida pueden mencionarse a dos: Boris S Livshitz (1896-1949), antiguo profesor rojo, que capituló después de IN Smirnov y retomó junto a él una actividad clandestina que le valió un nuevo arresto en diciembre de 1932. Ignoramos la fecha en la que fue liberado; fue corresponsal de guerra durante la segunda guerra mundial. Sobre Sergei I Kavtaradzé, cf. N… 34. Fue arrestado en enero de 1930 y durante algún tiempo estuvo detenido en Verkhneuralsk. Fue liberado sin “confesión” previa en 1932, rehabilitado en 1940 y devino inmediatamente Vice-Comisario del Pueblo para relaciones exteriores. Ley Z Kopelev (nacido en 1912) cuenta en su relato autobiográfico, ”No Jail for Thought”, que había pertenecido durante algunas semanas en 1929 a la Oposición de Izquierda clandestina en Kharkov y estuvo, por esa razón, algunos días en prisión en la primavera de ese año: este episodio debió perseguirle algunos años más tarde, especialmente en el curso de su ”affaire” al finalizar la guerra. En la obra aquí abajo mencionada, Kopelev indica de paso que en 1929 la ligazón entre el ”centro” trotskista de Moscú y los bolcheviques-leninistas” de Kharkov estaba garantizada, bajo el seudónimo de “Volodia”, por Kazakievitch, en ese momento estudiante del Instituto de construcción de máquinas de Kharkov. Emmanuil G. Kazakievitch (1913-1962), conocido como escritor judío antes de consagrarse como escritor ruso, obtuvo dos veces el premio Stalin de literatura. Entré al partido en 1944. ”La Tarjeta Azul”, uno de sus últimos libros, escrito tras la muerte de Stalin, incluía alusiones favorables a la Oposición. Kopelev escribe que el episodio de la actividad oposicionista de Kazakievitch no fue probablemente conocida más que por sus amigos cercanos; en efecto no parece haber sido arrestado nunca. Otro sobreviviente, IK Dachkovsky, se pronunció en 1967 sobre Trotsky, en una carta a la Pravda reproducida en el ”samizdat”, Polititchesky Dnevnik 1964 1970, pp. 258-260.
[143] En una carta a Trotsky, la secretaria de la comisión Dewey, Suzanne La Follette, revela que IN Smirnov, en su última declaración en su proceso, destruyó la estructura misma de la acusación proclamando que Trotsky era un enemigo porque consideraba al Estado soviético como un Estado fascista – lo que evidentemente dejaba entender que Trotsky no era una aliado del fascismo, como pretendía la acusación, (S. La Follette a Trotsky, 3 de septiembre de 1937, Biblioteca del Colegio de Harvard, 2611).
[144] MM Joffé, op. cit., p. 90 y 94.